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06 dezembro, 2007

Os americanos, esses perigosos comunas

O líder parlamentar do PP, Diogo Feio, começou a interpelação do seu partido sobre educação acusando o governo de ceder ao "pecado marxista" por não aceitar a "liberdade de escolha" e a introdução do cheque-ensino. Curiosa definição. É que, desde 1972, já existiram 10 referendos estaduais nos EUA para introduzir o cheque-ensino. O resultado foi sempre o mesmo. Os comunas dos americanos rejeitaram a proposta. Ontem, o PP tinha prometido apresentar uma "ruptura" com o paradigma educativo. Acabou a propor uma ruptura com a realidade.

12 novembro, 2007

A "liberdade de escolha" não convence ninguém

Reparo, com algum atraso, que no Utah, um dos estados norte-americanos mais conservadores, os eleitores rejeitaram o tão falado cheque ensino. Foi a décima vez, desde 1972, que uma proposta idêntica foi referendada num estado norte-americano. Foi a décima vez que foi rejeitada pela população. Para quem passa a vida a defender o cheque-ensino com base na suposta liberdade que atribui aos cidadãos, convenhamos que a rejeição sistemática a que estes votam esta proposta devia fazer os seus proponentes pensar duas vezes. Talvez evitassem continuar a defender o cheque-ensino com base numa estapafúrdia comparação entre o sistema de ensino e as padarias.

Na sua coluna de hoje no Público, Pedro Magalhães faz uma justíssima referência a um blogue, dizendo que "é verdadeiramente espantoso como, em poucos dias após a divulgação dos rankings, um blogue de um economista não académico (Miguel Madeira, no Vento Sueste) tenha feito mais pela análise dos resultados que centenas de técnicos do Ministério da Educação e dezenas de professores universitários supostamente especialistas em políticas educativas nos últimos sete anos". Só ontem à noite, numa tardia vista de olhos pelo Technorati, reparei nos dados apresentados pelo Miguel Madeira. Ainda não os li todos com a atenção que merecem. Mas é um contributo imprescindível para uma melhor compreensão dos rankings.

08 novembro, 2007

2-2=25

A lotaria britânica estreou um novo bingo na última segunda-feira. O objectivo de "Cool cash" é que cada uma possa fazer uma linha com temperaturas inferiores às que aparecem em cada cartão. O problema é que há temperaturas positivas e negativas e, como se viu, uma parte significativa das pessoas não percebe que abaixo de zero quando mais alto for o número mais baixa é a temperatura. Três dias depois da estreia, e com a maioria das pessoas sem perceber se tinha ou não direito ao prémio, o jogo foi retirado das ruas.

Agora pensem que era em Portugal que tinha lugar um grotesco caso de inumeracia como o revelado pelos ingleses. Quantas notícias, editoriais e colunas de opinião não ocupariam a imprensa sobre o fracasso da escola pública e do ensino da matemática? Para além da definição de uma visão mítica sobre o conhecimento das gerações anteriores, a distopia sobre a escola pública também se contrói a partir da hipervalorização dos males que nos afligem e do esquecimento selectivo sobre as debilidades reveladas nos outros países. É uma pena, mas parece que desta vez o José Manuel Fernandes e a Filomena Mónica não podem recorrer ao seu tema preferido.

02 novembro, 2007

O papel social do Estado: discriminar positivamente os ricos

Para os detractores da escola pública, um dos sinais da sua falência é que os ricos e a classe média alta colocam os seus filhos em colégios privados. Uma situação que retira a liberdade de escolha das famílias que, mesmo colocando os seus filhos num colégio, continuam a pagar o sistema de educação público. A solução, dizem, é implementar o cheque ensino.

Todos os indicadores demonstram que os ricos e a classe média alta colocam os seus filhos no ensino superior público, restando aos mais pobres e remediados o recurso às faculdades privadas. A solução para os defensores do cheque ensino: ficar como está.

Quando os ricos escolhem uma escola privada, alguma direita defende que se entregue directamente o dinheiro às famílias para acabar com esta dupla tributação. Curiosamente, quando os pobres e a classe média baixa são empurrados para uma escola privada, continuando a pagar com os seus impostos a faculdade dos ricos, já ninguém os ouve a falar da liberdade de escolha. Significativo.

PS: Não vale a pena dizer que o cheque ensino não tem razão de ser no ensino superior porque este não faz parte da escolaridade obrigatória. O ensino secundário também não e isso não inibe que defendam o cheque ensino para este nível educativo.

A (i)responsabilidade das escolas privadas

Em resposta aos posts aqui publicados sobre os rankings, o João Miranda diz que eu respondi à sua critica da incapacidade da escola pública para “anular os efeitos do meio socioeconómico” tentando demonstrar que as escolas privadas também não o conseguem. Vamos por partes. São os defensores do cheque ensino quem, de há seis anos a esta parte, chamam a atenção para a dicotomia entre os resultados do privado e do público para dizer que primeiras são melhores e mais exigentes. Uma barulheira danada por causa de uma diferença de 0,7 valores. Uma assimetria menor do que a revelada entre as escolas do interior e litoral, ou entre escolas grandes e pequenas. E isto, num sistema que escolhe os seus alunos à partida e, desses, os que leva a exame nas suas instalações.

A partir daqui o João Miranda entra em piloto automático. “As escolas privadas não são uma questão pública. As escolas públicas é que são. As escolas públicas é que têm de ser avaliadas pela capacidade de atingirem os objectivos para os quais foram criadas. As escolas públicas é que têm que justificar o dinheiro que lhes pagamos". Desculpe lá, mas as escolas privadas também são uma questão pública, mais não seja porque os estudos de cerca de cem mil estudantes dessas escolas são pagos com dinheiros públicos. São 3343 euros por ano por cada aluno, mais de 30 milhões de euros no Orçamento de Estado. O Estado paga a essas escolas privadas, ao abrigo de contratos de associação, para prestarem um serviço público de educação. O nome é explícito. Desde quando é que o dinheiro dos nossos impostos não é uma questão pública? Desde quando é que as qualificações do país não são um questão pública?

"Uma escola privada que não vence os efeitos do meio socioeconómico é um facto da vida. Uma escola pública que não vence os efeitos do meio socioeconómico é uma prova da inutilidade da escola pública", continua o João Miranda. Aqui já entramos noutro registo. A escola privada não é melhor, como passam a vida a dizer, as suas exigências é que são exíguas. Deve ser mais “um facto da vida”. Ao chamar a atenção para o meio socioeconómico, os defensores da escola pública não estão a reconhecer que esta é um falhanço e que não cumpre a sua função, como assevera o João Miranda, mas sim a dizer que - apesar de todos os defeitos, erros e problemas criados ao longo dos últimos 30 anos - a escola pública foi, e é, o mais eficaz mecanismo de mobilidade social existente no país.

PS: Sobre este tema, ler também o artigo de Pedro Lomba, no DN, e de Vital Moreira, no Público.

30 outubro, 2007

A distopia liberal sobre a escola pública I

Quando acabei o 12.º ano, estive um ano sem estudar antes de me candidatar à faculdade. Durante 3 meses trabalhei para o Circulo de Leitores. Em pouco tempo, entrei na casa de centenas de pessoas do Entroncamento e Torres Novas. Quase todas tinham a História de Portugal, de José Mattoso, nas estantes ou prateleiras. Havia outra constante. Os dois primeiros volumes estavam abertos, os restante seis repousavam dentro do saco de plástico em que vinham embalados. Um sem número de pessoas chamava enciclopédia às obras completas de Júlio Diniz, Camilo ou Eça.

São famílias inteiras que nunca tiveram hábitos de estudo, de leitura, de trabalho intelectual individual. Os seus filhos irromperam pela escola pública há pouco mais de 30 anos. Para milhares de famílias, esta é a primeira geração que tem alguma escolarização. O facilitismo do sistema público de ensino, de que fala Helena Matos, fez com que, desde cedo, tivessem mais conhecimentos a matemática ou português do que os seus pais. Em casa não há ninguém para os ajudar nos trabalhos de casa. A escola secundária do Entroncamento, onde colocavam os filhos, ficou este ano em 138.º lugar no ranking dos exames nacionais do 12.º ano. É má? Pior do que o colégio São João de Brito ou do que um selecto internato de raparigas que fez 32 exames?

A massificação do ensino teve que lidar com um país que já existia antes da democracia. Nem tudo correu bem, é certo. Partindo do mesmo atraso que também tínhamos na Saúde – sector, onde hoje temos dos melhores indicadores mundiais - ainda continuamos atrás das médias de conhecimento europeias. Mas, simplificando um pouco, a educação não é só construir hospitais e formar profissionais competentes. Tem o lastro cultural que a suporta. E que os detractores da escola pública omitem totalmente, como se o sistema educativo, a iliteracia, o analfabetismo e as dificuldades económicas tivessem aparecido há seis anos com a publicação do primeiro ranking de exames do 12.º ano. É simplista e pouco sério extrapolar uma leitura depreciativa sobre a qualidade do ensino público a partir da leitura do “top ten” dos rankings. Como veremos, nas próximos entradas sobre o assunto.

A distopia liberal sobre a escola pública II

Na sua coluna do DN, o João Miranda alega que “[os defensores da escola pública dizem que o meio socioeconómico influencia mais os resultados que a qualidade da escola. Reconhecem, em última análise, que, ao contrário do que diz a utopia, a escola pública está muito longe de anular os efeitos do meio socioeconómico”. Nem a pública, nem a privada, já agora. Há seis anos que são publicados os rankings dos exames do 12.º ano. O colégio São João de Brito aparece sempre nas cinco primeiras posições. Uma escola com o tipo de ensino que a Helena Matos diz que os ricos escolhem porque sabem que é melhor e mais exigente. Vejamos.

O colégio São João de Brito é da Companhia de Jesus, a qual tem mais duas escolas com ensino secundário. O Instituto Nun´Álvares, em Santo Tirso, e o Colégio da Imaculada Conceição, em Cernache - Coimbra. Como acontece com quase todas as escolas privadas no interior, têm um contrato de associação com o Estado. Ao contrário do São João de Brito, recebem alunos de todas as classes sociais. A Companhia de Jesus afirma que os métodos de ensino, contratação e formação de professores são idênticos. Quais são, então, os resultados? O Nun´Álvares ficou em 177.º, a Imaculada Conceição em 91.º. Há quatro anos, ficaram em 164.º e 249.º, respectivamente. O São João de Brito, com os mesmos métodos pedagógicos e de ensino, ficou este ano em 3.º no ranking e, há quatro anos, foi a"melhor" escola...

Questionado, na altura, pelo "Público" sobre essa brutal disparidade entre uma escola que recruta os seus alunos entre a elite da elite e dois colégios privados com todo o tipo de estudantes, o responsável pelo São João de Brito diz que “o Colégio de Coimbra fica num meio paupérrimo”. “é um meio rural, com fraco nível cultural. Teríamos outra posição no ranking se estivéssemos mais perto de Coimbra”. Pois é, teria a Companhia de Jesus e a escola secundária de Alpiarça ou a de Campo Maior. Mas não têm, o que não as impede de ver na comunicação social que as escolas privadas são melhores do que as públicas. Uma leitura redutora que, como se vê, tem os seus dias. Ou melhor, os seus sítios e classes sociais.

A distopia liberal sobre a escola pública III

A conversa sobre as virtudes da escola privada acaba, quase sempre, na desigualdade de condições entre uma, que tem que cobrar propinas, e outra que fica à borla. É preciso acabar com isso, dizem, no país em que o Estado mais apoia o ensino privado. Mais de um terço dos alunos nos colégios privados são financiados por dinheiros públicos, aos quais o Estado entraga 3343 euros por cada aluno. Não chega. A solução, dizem os defensores das virtudes privadas, é o cheque-ensino. Cada família recebe o dinheiro do Estado e escolhe a escola onde quer colocar os seus “piquenos”. Uma solução que destrói a rede pública e que traz gastos acrescidos para o Estado, que a tem que manter, e, ao mesmo tempo, financiar as escolas privadas.

Por alguma razão, apesar de toda esta campanha e pressão para a privatização do sistema educativo, essa solução não existe em quase nenhum lado, à excepção da Suécia ou do estado do Milwaukee. Os resultados são os esperados. Os alunos não alteram os seus resultados escolares por estudarem em instituições privadas, segregação dos mais pobres dos pobres, votados a uma escola pública subfinanciada e de segunda, bem como o brutal aumento das despesas públicas (a fórmula de fianciamento deve mesmo ser alterada este ano para conter a despesa). A discussão não é de hoje, basta ver o que escrevia o New York Times em editorial há quase 10 anos.

“It is absurd to argue that public education can be improved by diverting huge amounts of tax revenue into parochial and private schools. A voucher plan, such as Milwaukee’s, does not reform anything. It is a funding mechanism that forces taxpayers to underwrite religious and private education. Improving education for all students, not just the few who manage to get vouchers, requires sustained community commitment and leadership. Vouchers are a convenient political diversion from that task.” It would be far better to increase public school funding to improve education for all the students”. Editorial do New York Times, 11 de Novembro de 1998.

A distopia liberal sobre a escola pública IV

Helena Matos, João Miranda ou Filomena Mónica passam a vida a falar dos perigos de uma educação estatizada. Não há liberdade de escolha, o ensino é pior. Uma balda onde ninguém é avaliado. Os indicadores internacionais não existem apenas para dizer que estamos atrás dos países nórdicos ou do leste europeu. Também nos servem para pormos os olhos nos outros e vermos que há países onde não há rankings, não há retenção de alunos com piores resultados, só é possível abrir uma escola privada com aprovação do Conselho de Ministros (e estão proibidas de cobrar propinas, recebem o dinheiro do Estado). Países onde existem menos de 40 escolas privadas, mas que são, ao mesmo tempo, classificados pelo insuspeito Fórum Económico Mundial como tendo o melhor ensino secundário do mundo. O país é a Finlândia e, segundo o estudo internacional de referencia, o PISA, os seus alunos costumam ter os melhores resultados mundiais a quase todas as disciplinas.

A distopia liberal é isto. Ideologia e preconceito contra o sistema público, baseada no aproveitamento demagógico do senso comum. Não tem nenhuma base, nacional ou internacional, que a suporte. É o preconceito de classe travestido de preocupação social. Tudo em nome da liberdade da iniciativa privada que, veja-se, só é verdadeiramente livre se for o Estado a financiá-la. E diz-se esta gente liberal.

08 outubro, 2007

O eduquês do Presidente

Cavaco Silva diz-se empenhado na construção de “um novo olhar para a educação”. Para quem fala de novidade, convinha que trouxesse algo mais do que as propostas da Lei de Bases da Educação, da antiga maioria PSD/PP, e que foram vetadas por Jorge Sampaio. O “novo olhar” é a reciclagem do eduquês da direita. Onde a esquerda falhou - abdicando, quase sempre, de um discurso político em detrimento da micro-especialização pedagógica -, a direita resume tudo à presença da comunidade e de novas formas de gestão. O papel do Estado no combate às assimetrias, e a escola pública, nunca são referidos. São 15 minutos a falar da importância da comunidade, autarquias, pais, empresários, desportistas e por aí fora. Importante, sem dúvida, mas manifestamente pouco para cumprir o esforço de inclusão social de que fala.

Mas existe uma luz de esperança. Uma associação pela inclusão social, em Paredes, sublinha o Presidente da República. Infelizmente, é a mesma que já tinha levado os seus promotores, os “empresários pela inclusão social”, ao “Prós e Contras” no início do ano lectivo. Durante o longo tempo de antena de que dispuseram, falaram do desperdício financeiro no ministério e de como estão no terreno para, através de “boas práticas de gestão”, dar o exemplo à equipa da 5 de Outubro. Sobre as suas preocupações sociais, nada. A inclusão que os preocupa é outra. A do discurso liberal num negócio apetitoso como a educação. Entre os principais proponentes da iniciativa, Diogo Vaz Guedes. É um mãos largas este homem. Quando estava na Somague desembolsava as campanhas do PSD. Agora, paga as iniciativas apadrinhadas pelo Presidente da República. Sempre é um upgrade.

05 setembro, 2007

Aproveitando a onda...

... o Zero de Conduta aproveita este modesto espaço para lembrar a senhora ministra da Educação de que pode convidar estas duas empresas para darem aulas nas escolas públicas sobre o cumprimento do código da estrada e o respeito pelos limites de velocidade......estas duas podiam ficar com as aulas de sensibilização ambiental e Redução do consumo de energia...

... e, claro, entregar aos seguranças da Kapital as sempre úteis aulas de Educação para a Cidadania.

04 setembro, 2007

Mais perto do que é importante

A partir de 2008, as crianças portuguesas entre os seis e os onze anos vão ter aulas de publicidade nas escolas públicas, no âmbito do programa Media Smart. De acordo com os promotores, o objectivo é ensinar temas e conceitos relacionados com a comunicação comercial e não comercial, pretendendo integrar as matérias lúdico-didácticas concebidas por este programa nos currículos do 1.º ciclo, fornecendo às crianças “ferramentas para descodificarem a publicidade e aguçarem o sentido crítico”. Daqui a três anos, dizem os organizadores, esperam estar em metade das escolas portuguesas.

Aqui chegados talvez valha a pena sabermos quem é que dá a cara pela Media Smart. Nada mais nada menos do que a Associação Portuguesa de Anunciantes. Participam no Comité de Direcção do Programa, que tem como objectivo “assegurar a correcta implementação do projecto no terreno”, todos os patrocinadores do Media Smart. À frente deste comité aparece o director-geral do Grupo Nestlé em Portugal, António Saraiva de Reffóios, e os financiadores até agora conhecidos são a Danone, Kellogg´s, Modelo/Continente e, claro, a própria Nestlé.

Nada nesta iniciativa bate certo, a começar pelo extraordinário facto do Ministério da Educação abrir as portas a empresas privadas para, nas escolas públicas, ensinarem e divulgarem conteúdos programáticos. O ME associa-se mesmo, através da Direcçção Geral da Inovação Curricular, a estas empresas para a definição dos currículos e métodos de aprendizagem. Bem sei que o Governo tem um problema com a ocupação dos tempos livres dos alunos, e fica mais barato concessionar a formação pública a generosas empresas privadas do que a entregar aos tais professores que agora ficaram de fora do concurso, mas a decência tem limites abaixo dos quais não se deve descer.

Mas a verdadeira aberração deste projecto é que estes senhores, com o apoio do Ministério da Educação, estão a tentar fazer-nos acreditar que algumas das empresas que mais milhões de euros gastam em publicidade destinada às crianças, e a encharcar os miúdos com toneladas de açúcar, vão gastar dinheiro para irem dizer ao seu público alvo para não acreditarem nos seus anúncios. Não é preciso ir a uma aula Media Smart para perceber que isso tem um nome: publicidade enganosa. Este disparate tem tanto sentido como o Ministério da Educação convidar a associação República e Laicidade para ministrar as aulas de Religião e Moral nas escolas, ou convidar a Bayer e a Roche para promover a generalização de genéricos.

Este programa já está a funcionar há muitos anos em vários países, como o Canadá e Inglaterra,  diz a Associação Portuguesa de Anunciantes. Tudo bem. Mas, lá como cá, o motivo é sempre o mesmo. Prevenir a crescente pressão que os consumidores, pais e poder legislativo tem vindo a fazer para a diminuição, ou proibição, de anúncios que estimulem o consumo de comida com elevados níveis de açucar e calorias às crianças. Juntando-se debaixo deste simpático chapéu, as empresas envolvidas lançam campanhas de charme para nos chamarem a atenção para o seu elevado sentido de responsabilidade social. Compreendo que o queiram fazer, e até acho legítimo, mas nunca nas escolas públicas, disfarçado de conteúdos programáticos e curriculares.

A obesidade infantil é o maior problema de saúde pública das sociedades modernas e ninguém quer ficar mal na fotografia. A McDonald´s começou a vender saladas e sopas. A Danone e a Nestlé pagam a formadores para tentarem incluir os seus conteúdos programáticos nas escolas do 1º ciclo. Que o Ministério da Educação suporte, e apoie, esta campanha de branqueamento da imagem é que ultrapassa todos os limites do concebível e razoável.

30 agosto, 2007

Obviamente, sou contra

Vital Moreira respondeu, no Causa Nossa, às objecções que eu e o João Rodrigues levantámos ao seu artigo no Público defendendo os empréstimos bancários aos estudantes universitários. Rejeitando que se trate de um desinvestimento do Estado, Vital Moreira deixa uma “questão simples: para os destinatários, trata-se ou não de uma medida vantajosa e bem-vinda?"

De uma forma simples, então, convém dizer que é normal, e até é "uma medida vantajosa e bem-vinda", que o Estado estabeleça protocolos com instituições bancárias para oferecer taxas de juro e garantias mais favoráveis aos jovens estudantes. Coisa bem diferente é criar a ilusão que esta medida democratizará o acesso ao ensino superior, como o defende Vital Moreira e é garantido pelo primeiro-ministro: "A medida deve entrar em vigor já este ano lectivo e o objectivo é garantir que ninguém deixa de frequentar um curso superior por falta de condições económicas". Para isso existe a Acção Social Escolar, ou deveria existir, dado que a bolsa média anda nos 49 euros. Um dinheirão que mal dá para pagar metade das propinas (para quem não sabe, os bolseiros não estão isentos), quanto mais para custear as inúmeras despesas da frequência universitária.

Não é sério analisar esta medida desligada do contexto vivido no ensino superior, nomeadamente do seu financiamento. Não deveria ser preciso lembrar que, apesar de sermos o país mais pobre da UE15, temos as quintas propinas mais caras e o Estado investe menos de metade da média europeia em acção social. Os tais 49 euros por mês. É por aqui que passa a discussão da democratização, e não por esquemas de empréstimos que - conjugados com o aumento de propinas, como defende Vital Moreira - tão maus resultados estão a dar nos países que os adoptaram. Bem sei que o primeiro-ministro já garantiu que não aumentará as propinas nem desinvestirá na acção social. Mas, e quem vier a seguir? António Guterres, há 10 anos, indexou as propinas ao salário mínimo e garantiu que as mesmas seriam sempre para aumentar a qualidade das instituições, nunca para pagar despesas de funcionamento. Pois. Hoje, enquanto o salário mínimo se fica pelos 400 euros, as propinas já vão nos 900 e há muito que os reitores dizem que o seu dinheiro vai todo para pagar salários.

Nestas coisas das taxas e propinas, sabe-se como se começa mas nunca se sabe onde é que vai acabar. Ou sabe, termina sempre na desresponsabilização progressiva do Estado e na diluição das suas responsabilidades na democratização da frequência universitária, trocando-a por uma lógica cada vez mais mercantil em que passaremos a ter clientes financiados por um contrato celebrado com um operador bancário. Mesmo que, com esta medida, não gaste menos um cêntimo, o que é verdade, o Governo está a passar a mensagem de que o suporte financeiro para os alunos completarem os estudos é a banca. Por isso a minha resposta é também simples. Sou contra este regime de empréstimos.

PS:Vale a pena ler a resposta do João Rodrigues sobre o mesmo tema.

29 agosto, 2007

Democratização liberal

O João Rodrigues, no Ladrões de Bicicletas, diz quase tudo o que há a dizer sobre o mais recente artigo de Vital Moreira no Público, nomeadamente quando afirma não compreender como é que “o novo regime de crédito para estudantes do ensino superior é parte do processo de democratização do acesso à universidade”.

De facto, a experiência nos países que já seguiram esse caminho – conjugado com o aumento de propinas, também proposto por Vital Moreira - demonstra precisamente o contrário. Em Inglaterra, quando essa questão se colocou, surgiram várias notícias indicando que 63% dos jovens que não pretendiam frequentar o ensino superior faziam-no com receio do endividamento. Os elevados custos da frequência universitária são, também, uma das razões apontadas para o maior abandono escolar e percursos académicos mais curtos dos estudantes mais pobres (normalmente em escolas técnicas).

Num país como o nosso, em que todos os dias surgem notícias sobre a precariadade laboral da "geração 500 euros" e os 56 mil desempregados licenciados, não é difícil perceber as consequências sociais da generalização de um sistema de empréstimos associado ao aumento das propinas. É a fórmula mais certa para afastar os mais pobres do ensino superior e nunca para o democratizar, como parece acreditar Vital Moreira.

Os defensores do sistema de empréstimos não se cansam de dizer que esta medida chega atrasada ao nosso país, dando o exemplo dos EUA ou da Inglaterra. Deviam olhar com mais atenção, ler um bocado, e constatar que nem sempre é mau estar atrasado. Dá tempo para evitar os erros que outros já cometeram. Pena é que a lógica liberal se sobreponha, quase sempre, às evidências nas decisões mais estratégicas para o futuro do país.

26 agosto, 2007

Escravo da banca

Na Europa dos 15 não existem propinas na Dinamarca, Grécia, Luxemburgo, França, Finlândia e Suécia. Na Alemanha, o Tribunal Federal colocou um ponto final na gratuitidade, remetendo a questão para os governos locais. A esmagadora maioria das faculdades continua sem propinas.

Portugal é o quinto país da União Europeia onde as propinas são mais elevadas, 900 euros, e o segundo em que o Estado investe menos dinheiro por aluno, 6000 euros. Pior só a Grécia, com 4285 euros anuais. Aqui ao lado, a Espanha despende 8399€, a Itália 10161 e a França 10332. Em nenhum país escandinavo a despesa fica abaixo dos 13 mil euros, valor também atingido pela Alemanha, Irlanda e Dinamarca.

Na acção social escolar o panorama não é mais animador. O nosso país fica em penúltimo lugar na percentagem de dinheiro destinada ao apoio dos estudantes mais desfavorecidos, com 6,7% do investimento total. Mais uma vez, pior só a Grécia, com 5,8%. A França investe 8,1% em bolsas, a Espanha 8,5%, Alemanha e Reino Unido à volta de 10%. A Holanda ultrapassa os 20% e a Dinamarca gasta 33% do total.

A bolsa média em Portugal é de 49 euros mensais - refere o Público de sexta-feira, citando o Eurostudents 2005 - enquanto as despesas se ficam pelos 575. Perante este cenário o que faz o Governo? Investe na acção social? Não, corta no investimento no ensino superior público (só na Universidade de Lisboa, os cortes anunciados para 2008 ascendem a 10%) e introduz um regime de empréstimos, com um spread baixo, mas taxas de juro superiores ao que já existe no mercado e que os jovens terão que começar a pagar mesmo que não tenham emprego. O ministro Mariano Gago resume este novo convite ao endividamento das famílias, dizendo que quem não tem a certeza que poderá pagar não deve contrair o empréstimo. Num país com 56 mil licenciados no desemprego, pressupõe-se que só sabe que pode pagar o empréstimo quem já não precisa dele porque tem os pais como avalistas.

José Sócrates, primeiro-ministro socialista, defende o sistema de empréstimos dizendo que a Acção Social Escolar não vai acabar. Há dez anos, António Guterres, outro primeiro-ministro socialista, dizia que o dinheiro das propinas seria destinado para aumentar a qualidade do ensino e nunca para gastar em salários e despesas de funcionamento, um facto há muito negado por todos os reitores. A história repete-se; primeiro como tragédia, depois como farsa.

PS: Os números são referentes a 2005. Quem quiser consultar os números da OCDE referentes a 2003, ponderados por Paridades de Poder de Compra, pode encontrar aqui o documento Education at a Glance 2006.

08 agosto, 2007

Dantes é quera bom


Knife throwing mother of the 1950s

Ansiando por esses Golden Days dos anos 50, antes dessa cambada de hippies preguiçosos, drogados e comunas se lembrarem de violentar a sacrossanta educação parental.