... e continuar aquela conversa que não terminamos ontem e ficou pra hoje.
Pois é, as vezes as evidências parecem dizer que não, mas por algum motivo que eu ainda não sei explicar, meu coração ainda me diz que essa conversa só começou...
E, falando em começo, tudo deu tão errado pra que a gente se encontrasse! A maluquice de pegar uma ponte aérea 24 horas depois de voltar ao Brasil. Eu, que odeio voar depois da poltrona 5, apareci com reserva na poltrona 23. Troquei de poltrona 2, 3, 4 vezes e o sistema insistia em me dizer que eu deveria pagar R$30 a mais, o que eu obviamente não queria. Ai se eu tivesse lido direito que era uma proposta para um assento mais amplo, nada a ver com a poltrona que eu tinha escolhido. Cansei de brigar e resolvi ficar na 19 mesmo.
E já que era pra estar tudo ao contrário, não bastava eu estar no fundo do avião, ainda estava no corredor. Logo eu, que viajo parecendo criança, pendurada na janela. Logo pro Rio, que tem aquela paisagem que começa a encher meu coração de alegria antes mesmo de chegar.
Achei que o vôo estaria cheio e fiquei esperando pra afivelar o cinto enquanto a pessoa da poltrona do meio não chegava. E não chegou nunca. Você já estava lá, com um livro nas mãos e respirando tão profundamente, que fiquei na dúvida se estava meditando ou passando mal. Falou com seu pai, alguma coisa sobre o pagamento de uma conta. Eu ouvi, achei fofo o jeito que vc conversou com ele, mas não tinha prestado atenção em vc. Estava imersa em pensamentos, com fuso horário bagunçado e sonhando com a minha tarde para fazer absolutamente nada.
A comissária veio conferir se vc era vc e se vc estava realmente ali, deu um ok sobre a sua bagagem. Vc ficou apreensivo e eu fui gentil, afinal, eu tinha a resposta que desfranziria a sua testa.
Aí meu olhar cruzou com o seu.
E deu choque.
Respondi e te sorri.
Vc me sorriu de volta.
Derreti.
Numa fração de segundos me arrependi de ter saído de casa de cara lavada, de ter optado pelo conforto do tênis, pensei em como estava meu cabelo. E enquanto meu coração estava aos pulos, eu precisava puxar um assunto com vc, precisava ouvir sua voz de novo, precisava do seu sorriso mais uma vez.
Na minha bolsa, achei uma bala de limão que trouxera da Italia. Peguei uma pra mim e te ofereci outra. Sorri e vc sorriu de volta.
Parei de respirar por alguns segundos, enquanto tentava processar o que vc dizia.
Não queria a bala, mas logo mudou de idéia.
E sorriu de novo.
Pqp, que poder era esse que seu sorriso tinha de me dar choque?!?
Vc entendeu a deixa da bala e logo engatamos um papo. Quando respondi onde morava, vc riu. E assim, descobrimos que 3 ruas separam as nossas casas numa cidade de mais de 10 milhões de pessoas. Íamos pro Rio, ambos a trabalho. Vc com birra de carioca e eu apaixonada pela cidade maravilhosa. Quando eu respondi com o que trabalho, nova gargalhada, "não acredito"! Uma fotógrafa e um cinegrafista.
A vergonha tentava dominar, muitas e muitas vezes eu não conseguia olhar o seu rosto. Sentia minhas bochechas queimando, a vermelhidão já chegava até o colo; como fazer pra vc não perceber?!?
A gente conversou.
E riu.
E falou de coisas aleatórias.
Cada vez que vc me olhava fundo nos olhos, eu tremia.
A cada sorriso seu, meu coração parava por uma fração de segundo.
Quando senti o calor da sua mão no meu braço, arrepiei e descompassei de vez. Queria que vc segurasse minha mão, minha cintura, meu rosto. Queria o calor do seu corpo gelando o meu.
O comandante anunciou o Cristo Redentor à direita e a sua cara de surpresa foi engraçada. "Já?!?" Descemos juntos, vc ia se despedir de mim, mas lembrou que tb precisava pegar sua mala. Continuamos conversando de bobagem. Falamos de copa do mundo, de Brasil, de 7x1.
Vc fecha os olhinhos quando ri. Talvez nem imagine o quanto é fofo isso.
Por um breve segundo achei que vc ia me dar um beijo ali mesmo, no meio do desembarque do Santos Dumont. Vc apenas me envolveu nos seus braços, num abraço longo e quente, em que era possível sentir a respiração suspensa, a minha e a sua. Me deu um beijo na bochecha e disse que me chamaria no whatsapp para tomarmos uma cerveja juntos.
Fui embora sem olhar pra trás. Se visse seus olhinhos apertados sorrindo pra mim novamente era capaz de protagonizar uma cena de novela: correria pelo meio do saguão do aeroporto, me atiraria nos seus braços e nos beijaríamos enquanto a câmera nos circundaria, dando pistas ao espectador do tamanho da euforia de nós dois.
Pensei em vc o resto da tarde. Passei e repassei a nossa conversa, pensei no seu sorriso, nos seus olhinhos espremidos, no calor da sua mão, no seu cabelo bagunçado. Queria tirar vc da cabeça, saber se vc ia ou não me procurar era muito incerto pra que eu ficasse brincando com esses pensamentos sem me queimar.
Toquei a minha vida no Rio tentando apagar da memória aquele encontro tão fora do eixo e, principalmente, tentando ignorar o fato de que cada vez que vc me vinha à mente, meu coração saía do compasso.
Na noite de quinta, enquanto falava da vida com a Gi antes de dormir, comentei com ela que eu queria mto que vc me procurasse! Em mais uma madrugada de fuso horário bagunçado, acordei no meio da madrugada. Ao pegar o celular, vi que eram 4 da manhã.
E gelei.
Achei que era sono misturado com vontade que já estavam me fazendo ver coisas.
Mas não, era mesmo vc me chamando, a 1:30, pra combinarmos uma cerveja na sexta...
Queria pular.
Queria acordar a Gi só pra dividir a euforia.
Queria te responder imediatamente.
Queria te ver naquele mesmo minuto.
Inspira.
Expira.
Não pira.
Finja ser norma, Lais.
Vire de lado e durma mais um pouco.
Lá pelas 10 te respondi que uma cervejinha seria uma ótima ideia, a prosa começou. Vc comentou brevemente de como estava seu trabalho até ali e perguntou do meu. Até que vc perguntou se eu não topava dar uma volta na praia, afinal, seu expediente começaria só as 16h.
Numa sexta feira cinza e fria no Rijaneiro, 2 paulistas se encontraram. O plano de caminhar na praia furou, tendo em vista que estava garoando. Vc me deu um abraço longo e quente, eu só conseguia pensar em como seria seu beijo, sua mão passeando pelo meu corpo.
Vc me deu o braço, me chamou pra tomar um café e eu fui. Teria ido até se vc me chamasse apenas pra tomar chuva.
Paulistas perdidos em Copacabana, sem conhecer nada por ali, com claros indícios de que queríamos um ao outro muito mais do que café ou coisa parecida; nos sentamos, felizes, num boteco de esquina. Logo vc demonstrou ser um sarrista, me fazendo rir e rindo cmg, de olhinhos espremidos.
Sorriso largo e alvo, contrastando com a sua pele morena; covinhas na bochecha.
Só eu sei quanta concentração eu precisei pra não me perder nos devaneios sobre a sua geografia, enquanto vc falava alguma bobagem qualquer. Falamos de viagens, de trabalho, de ex trabalhos, de família, contamos causos.
A prosa fluía gostosa e suave, enquanto no fundo da minha mente, ouvia o Nando Reis cantando "estranho mais já me sinto como um velho amigo seu, seu all star azul combina com o meu preto de cano alto. Se o homem já pisou na lua como ainda não tenho seu endereço? O tom que eu canto as minhas músicas, pra sua voz, parece exato".
Estava ansiosa com o que poderia acontecer, mas me sentia à vontade com vc, como se realmente já te conhecesse há tempos. A sua companhia era tão gostosa que eu poderia ficar horas só ouvindo vc falar, rindo das suas peripécias, descobrindo da sua vida, da sua família, dos seus planos.
O tempo parecia correr contra nós e o relógio era impiedoso. A virada do tempo na noite anterior te deu um trote, seu outfit de bermuda e camiseta demonstrava estar pouco adequado àquela tarde fria e isso nos roubava mais alguns minutos. Resolvemos mudar de bar para almoçarmos.
De novo vc me deu o braço e saímos pela rua distribuindo sorrisos. Enquanto aguardávamos o farol verde para os pedestres, vc disse que teria que ficar bem pertinho de mim para que eu te esquentasse. Aproximou mais o seu corpo do meu. Colou sua testa na minha. Olhou fundo no meu olho e sorriu. O mundo parou, meu coração parou, quase acho que o seu tb. A tarde estava fria e cinza, mas éramos calor e sorrisos, colorindo aquele cenário. Não fui eu que te beijei; não foi vc que me beijou. Os dois queriam, os dois buscaram, os dois beijaram.
Não pensei em nada, perdi o fôlego, perdi o compasso do coração, perdi o rumo. Ao mesmo tempo, pensei no avião e no quanto a realidade da sua boca na minha, da sua mão percorrendo meu corpo eram melhores do que a minha imaginação. Pensei no quanto era gostoso sentir aqueles mesmos choques de quando vc me olhava e sorria, dessa vez em ondas. E não pensei em mais nada.
Dane-se o dia cinza. Dane-se a chuva fina e fria. Gente em volta?!? Juro que não percebi. Tempo?!? Como ele é relativo quando se trata de ser feliz!
Sentamos num outro bar, bem mais pé sujo do que o outro. Tava na cara que a comida seria uma merda. Mas e daí?!? Tinha eu. Tinha vc. Tinha calor e tinha beijo. Tinha mãos dadas e sussuros ao pé do ouvido.
Vc precisava ir embora, precisava passar no hotel e precisava trabalhar. Se despediu de mim com beijo, com abraço e dizendo que nos veríamos ainda naquela noite.