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28/04/2015

O DIA EM QUE CAIU DO TRONO




Um dia disse ao meu filho que ele era capaz de fazer tudo. Foi já há algum tempo. Era ele mais pequenino ainda. Não me lembro bem o que era, mas ele estava a fazer qualquer coisa e disse "não consigo". Achei que era a minha deixa. Disse-lhe olhos nos olhos "tu consegues tudo. Nunca te esqueças disso". Esqueci-me foi que ele tinha 2 anos. Cá metáforas ainda não pegam nesta idade. Esqueci-me que os miúdos nesta idade levam as coisas um pouco à letra. E que um gajo tem de explicar tudo bem explicadinho senão dá merda. E assim foi. Não expliquei e deu merda.

Comecei por ensinar o meu filho a andar de skate com 2 anos. Desde muito cedo ele adorou. E começou a ganhar-lhe o jeito. Fui andando com ele, ensinando o que deve ou não fazer, o que pode ou não fazer. Ele foi evoluindo. Agora com 4 anos, chegou a uma fase que eu achei que ele devia passar a ter aulas com um professor e outros miúdos. Achei que podia ajudá-lo a desenvolver outras técnicas. Aprender outras coisas. Conhecer outros miúdos. Aprender com os mais velhos. Então começou as aulas. Tem dois professores ex-skaters profissionais. Além de bons skaters, bons professores. Lógico que os colegas na aula são todos mais velhos. É o único com 4 anos. E naturalmente tem as limitações inerentes à idade. Sempre que a aula começa, está com a moral toda. Motivado. Orgulhoso. Divertido. À medida que a aula vai avançando começa a esmorecer. Até que desiste a meio. Apesar do meu filho ser muito bom no skate para idade dele, apesar de ser capaz de fazer muito mais com um skate do que maioria dos miúdos e das miúdas com 4 anos, apesar de adorar, nas últimas aulas desistiu a meio, Cabeça para baixo, skate a arrastar. Aconteceu não uma, mas duas vezes.

Como não sou parvo, naturalmente nunca mostrei má cara. Nunca me mostrei chateado, nunca me mostrei desiludido, nem triste nem nada disso. Simplesmente perguntava-lhe "queres ir embora filho? de certeza?".
Nunca o obriguei a andar e só ia às aulas quando queria. Até que um dia, sentados em cima dos skates, perguntei: "filho, porque é que não queres estar nas aulas? gostas de lá estar ou não gostas muito?" Ao que ele me responde "gosto mas pensava que era só para fazer o que eu sei".

Ahhhhhhhhh. Toda a festa que eu fazia quando ele conseguia alguma coisa, todas as vezes que lhe disse que ele consegue tudo, todas os gritos que ele era o maior, vieram bater-me à porta. Ali na aula, com os miúdos mais velhos a fazerem mais do que ele é capaz, ele sente-se um underachiever. Incapaz de chegar ao nível dos outros. Nos olhos dele, ele vê todos a andarem muito melhor que ele, a fazerem mais do que ele, incapaz do distanciamento para perceber a diferença de idades, força, anos de experiência que o separam do resto da turma. Por isso ele sente-se incapaz de chegar e estar ao nível dos outros. E por isso acha que já não consegue tudo como eu tantas vezes lhe disse. Que já não é o maior. Sente-se desiludido. E acha que me vai desiludir. Porque na aula ninguém faz a festa que um pai faz. Percebi.

Expliquei-lhe que ele está nas aulas para fazer o que sabe e também para tentar aprender a fazer o que não sabe. Que tentar é fixe. E é divertido. Que ele é o mais pequeno da turma e que por isso não consegue fazer algumas coisas iguais aos outros. Que eu também já fui pequeno. Mas que ele é especial por ser tão pequeno e conseguir estar na turma dos grandes no skate. E que quando for grande vai conseguir fazer igual aos outros. Que para conseguirmos alguma coisa, temos que tentar. Aprender. E tentar.

Parece mentira que eu tenha conversas deste calibre com um miúdo de 4 anos. Mas tenho. E aprendo todos os dias com ele. Como ele certamente aprende comigo. É tão fácil cair na asneira de os iludir demasiado quando os amamos tanto. Fazemos uma festa tremenda de qualquer coisinha. Como se fossem semideuses. Ao ponto deles acreditarem que o são. E daí à desilusão é um instante. Depois é arregaçar as mangas, encher o peito e sentar ao lado deles e explicar o que devia ter sido logo explicado desde início.

Ou não. Talvez isto faça parte. Sei lá eu. Eu também só ando nisto de ser pai há 4 anos. E é a minha primeira vez. Também ando a apanhar bonés. Não sei tudo. Faço o melhor que sei. Vou tentando. E aprendendo. Um gajo tem de elogiar, mas não muito. Um gajo tem de ralhar, mas não muito. Um gajo tem de ensinar, mas não muito. Um gajo tem de exigir, mas não muito. Porra pra isto. Uma coisa é certa. Um gajo tem é de os amar e respeitar. E é muito.

19/02/2015

HAVE FUN KID, ALWAYS HAVE FUN

A primeira vez que o pus em cima de um skate foi com 2 anos. A mesma coisa com o surf. Gosta muito das duas coisas mas prefere o skate. Eu fui ao contrário. Comecei primeiro com o skate, mas sempre fiz mais surf, apesar de adorar os dois e de os fazer há muitos muitos anos (shit I'm old). Mas ultimamente, à conta da paixão do meu filho, até tenho andado mais de skate do que surfar. E até prefiro o ambiente do skate. Mais camaradagem, mais humildade, mais amizade, mais união. Há competição, mas é sempre saudável. Todos a puxarem por todos. Quer se conheçam ou não. É puro. É raw. No surf, o ambiente é muitas vezes deprimente. Muita falta de respeito, pouca paciência, egos inflamados. Gajos que gritam muito e surfam pouco. Às vezes falta-me a paciência. No skate o ambiente é outro, tenho de reconhecer. Por isso é que o skate será sempre cool. Nunca mainstream. Continuo a gostar muito de surfar. E vou fazê-lo sempre até poder. Gostava muito que o meu filho gostasse tanto como eu e fizesse as duas coisas como o Curren Caples. Gostava, mas na verdade tanto me faz. Desde que ele se divirta. Porque é isso que conta. Letting go and having fun.


4 anos. Style, flow and lots of fun:

13/02/2015

LOVER'S DAY? ENTÃO VAI SER ASSIM...


Porra, apercebi-me agora que amanhã é dia dos namorados (a propósito, o ano passado foi assim). Isto significa o seguinte:

  • Não vou ao cinema. Até porque se tenho que ouvir falar das 50 Sombras de não-sei-quem outra vez, vou me juntar ao grupo de hackers conhecido como Anonymous e vou convencer os gajos a transformar aquilo num filme do Nicholas Sparks... Ah, espera aí... ele já é isso.
  • Não vou jantar fora. Estou sozinho com o miúdo, está um frio de um raio, ainda tenho o braço ao peito, nunca fui jantar fora nesse dia e não é agora que vou começar.
  • Não vou comprar nada porque, bem porque nunca compro mesmo.
Mas vou dizer o que vou fazer, amanhã dia 14. Vou estafar o miúdo durante o dia. Vou fazê-lo dançar, andar de skate, fazer jiu-jitsu, cansá-lo ao ponto de ele adormecer com a cara dentro da sopa às 7 da tarde. A seguir vou arrastá-lo até à cama. Vou ter de arrastá-lo porque não consigo carregá-lo com um só braço. Vou lhe pôr uns daqueles ear-muffs que os gajos nos aeroportos usam quando estão na pista, de modo que ele não acorde nem com um motor de um F-16. Depois encosto a porta do quarto, vou até à sala e vou abrir uma garrafa de vinho. Tinto, que o branco faz me lembrar aquele estalo que apanhei quando tinha 16 anos. Enquanto o vinho respira vou atear umas pinhas e fazer um lumezinho bom na lareira. Deixar a sala com um mood perfeito. Só a luz do lume, não sei se estão a ver. Vou tomar um bom duche, quente e longo, daqueles que relaxam todos os músculos e que no fim dão para escrever no espelho com o vapor. Saio do duche, e como habitual, não me seco. I always air-dry. Visto as calças de jersey em algodão e vou para a sala, que entretanto está no ponto. Aquela temperatura equatorial. Ponho uma música. Uma boa música. O "Come and get your love" dos Redbone. Alto o suficiente para abafar qualquer som vindo da sala, mas não tão alto que possa passar os ear-muffs do miúdo que se Deus quiser (e tem de querer), a esta hora já está na fase REM do sono. Vou me sentar no sofá com o copo de vinho enquanto a minha mulher ainda não está. Molhar os lábios com o Pêra-Manca que já andava há anos a arranjar um pretexto para o abrir. E quando a minha mulher chegar, quando e-l-a che-gar... vai largar a mala no chão, tirar o casaco, vai até à sala, naquele jeito de quem vem em câmara lenta, não sei se estão a ver. E aí,... aí vai me encontrar num profundo e relaxante sono e se Deus quiser vou dormir das 9 da noite às 9 da manhã. 12 horas f#$a-se! 12 horinhas sem ninguém me acordar. P'ra ver se no dia seguinte estou comó aço, pronto para lhe encostar à parede, e mostrar-lhe as verdadeiras sombras de mim. Ao som do "Ball and Biscuit" dos White Stripes. No dia 15. Como em qualquer dia. Menos amanhã. Que aquelas 12 horas vão ser minhas e do sofá.

Happy Lovers day para amanhã, kids. E happy lovin'. Todos os dias.


10/02/2015

EU SOU UM ESTUPOR MAS NÃO SÓ


O Kanye West é um estupor é verdade. Mas ser pai às vezes faz de nós um bocadinho menos estupores. Fui não poucas vezes um estupor. Às vezes ainda sou. Mais do que gostaria. Como bom estupor que sou, costumo ser estupor com as pessoas que mais amo. Como boa alma que sou, sinto-me na merda quando o sou. Mas quando o meu filho nasceu alguma coisa mudou dentro de mim. Não sei se acontece sempre, mas comigo aconteceu. Continuo a ser um estupor às vezes, é verdade. Às vezes para quem amo. Mas amo hoje mais e melhor. A minha família, os meus amigos e até quem não conheço. Aos que me querem mal ou não me querem nada, no hard feelings.

Olho para o meu filho e vejo nele o reflexo de quem sou hoje. E quem sou hoje devo-o muito a ele também. É como estar à frente de um espelho com outro espelho. Tenho orgulho na pessoa que ele se está a tornar. Com 4 anos tem nele um capaz emocional de longe maior que os passos que dá. Um coração enorme no corpo de um menino. É um menino que pensa nos outros. Que partilha tudo o que tem. Que ama gratuitamente. Que quando viu a prima a chorar, foi buscar o boneco preferido dele e pôs-lhe ao colo. Sem dizer nada. Um menino que quando caí e desloquei o braço à frente dele, veio a correr para tentar me pôr o ombro no lugar. Um menino que se zanga quando vê alguém fazer mal a um animal, mesmo que seja um peluche. E hoje quando me estava a vestir com um só braço, depois de eu vestir a camisa ele veio junto de mim e sem dizer nada, começou a tentar abotoar-me os botões. Baixei-me e dei-lhe um abraço. Sim às vezes sou estupor. Às vezes para quem mais amo. Mas como diz o Kanye West na música "Only One", não sou perfeito mas sou mais do que os meus erros. E foi isso que vi hoje no meu filho quando ele lutava com o botão, na tentativa de me abotoar a camisa por eu estar com o braço imobilizado. Vi-me como mais do que os meus erros. Porque alguma coisa devo estar a fazer bem. Para ter um filho assim.



* Only One foi escrito pelo Kanye West que é um estupor, mas que conseguiu escrever isto na perspectiva da mãe que já morreu, a olhar para ele e a falar com a filha através dele. Uma ode à paz interior.

Nota. Tem a participação do Paul McCartney nas teclas e na composição. O vídeo é realizado pelo Spike Jonze.

02/02/2015

O COPO MEIO CHEIO {A OUTRA METADE ENTORNEI A TENTAR AGARRAR NO COPO COM O OMBRO DESLOCADO}


Quando uma pessoa faz 40 anos pensa "epá, 40 anos..." Mas depois os 40 anos não sentem a 40 anos. Na cabeça continuam a ser 20. E continuamos a fazer coisas como sempre fizemos, porque para nós não há idade para as fazer ou deixar de fazer. Isto tem consequências. Uma dessas consequências é a cara das pessoas quando lhes digo que desloquei o ombro a andar de skate.

- "Então, como é que fez isso?"

- "Foi a andar de skate."

Tenho recebido 3 tipos de resposta:

O silencioso: ".............silêncio............"

O paternalista: "Já não tem idade para essas coisas."

E o terceiro tipo de resposta é de quem me conhece e logicamente compreende que estas merdas acontecem independentemente da idade e me dão força e otimismo para a recuperação.

A verdade é que isto não tem a ver com a idade. E quando numa reunião de trabalho me perguntaram do braço e eu disse que tinha sido a andar de skate e ficou tudo com cara de quem acha que sou parvinho, fiquei com orgulho. De me ter magoado a fazer uma coisa que gosto juntamente com o meu filho. Antes isso do que ter um torcicolo por estar um fim-de-semana inteiro a ver TV no sofá.

Mas quando olho para trás, fico lixado com o que aconteceu. Fico com a sensação que podia ter evitado. E pior do que a dor tremenda que passei, pior do que a tortura que foi os ortopedistas meterem a merda do ombro no sítio outra vez, pior do que lavar os dentes ou limpar o rabo com a mão esquerda, pior do que isso tudo, é saber que o prognóstico de um ombro deslocado não é famoso. É imaginar que posso vir a ter dificuldades em surfar como deve ser, andar de skate sem medo de caír sobre o braço ou atirar uma bola ao meu cão. Ou pior, não poder pegar no meu filho ao colo com o braço direito sem medo. Não sei. Pode ser que esteja a ser dramático. Podia ter sido pior.

Para já, vou me concentrar na recuperação e imaginar que isto vai ficar comó aço. O sling já tirei e vou começar com a fisioterapia. Espera-me um longo caminho. Cheira-me que isto só vai estar capaz daqui a uns 6 meses no mínimo. Mas vou fazer tudo o que estiver ao meu alcance para estar a 100%.

Até lá, vou me divertindo a ver o meu filho a andar de skate e a mentalizar-me que isto é o "changing of the guard". A nova geração a substituir a velha. É que isto não tem a ver com idade, mas tem.

14/01/2015

A ESPERANÇA É A ÚLTIMA A MORRER


Adoro o meu cão. Já tinha dito isso, né. Mas vou confessar uma coisa. Acordar às 6 da manhã para ir correr com ele é coisa que não me deixa em pulgas. Até para mim que sou madrugador. Principalmente no inverno quando o termómetro marca 3º C. Apesar de fazer parte da minha rotina diária e fazer de mim um herói, um gajo saudável, um louco, uma inspiração, um poeta do asfalto e essa merda toda, a verdade é que preferia ficar na cama pelo menos mais uma ou duas horas. E por isso confesso que um dos meus 12 desejos de ano novo foi que o meu cão aprendesse a ir à rua sozinho. Mentira. Não foi um dos 12 desejos. Foram seis. Gastei metade dos meus 12 desejos só a desejar que o meu cão aprendesse a ir à rua sozinho. E não desejei só que ele fosse sozinho. Desejei que ele saísse de casa sozinho, levasse o saquinho para apanhar as poias, fosse correr, alongasse, fizesse o que tinha a fazer, apanhasse, metesse no lixo, voltasse para casa, abrisse a porta devagarinho para não me acordar e voltasse a deitar-se. Só isso. Ah e se me fosse preparando o pequeno-almoço então era ouro sobre azul. Mas entretanto li um artigo não-sei-onde a dizer que os labradores eram cães burros. Que balde de água fria.

Mas hoje li a notícia que me renovou a esperança. Um labrador que apanha o autocarro sozinho para ir para o parque brincar. Eu sabia que era possível. Finalmente. Vou poder dormir 6 ou 7 horas por dia.

O vídeo aqui em baixo.

22/12/2014

SÃO ASSIM OS AMIGOS




Ele_ "Pai, o Rodrigo não é o meu amigo."

Eu_ " Porquê? O que é que ele fez?"

Ele_ "Nada. Não me empresta o transformer".

Eu_ "Filho. Os teus maiores amigos na vida não vão ser aqueles que te emprestam o transformer. Vão ser aqueles que te ajudam a arranjar um para ti. E que vão saltar e cantar contigo quando conseguires. Vão ser aqueles que te abrem a porta sem nunca fazerem contas ou perguntar porquê. Os que te dão um abraço sem estarem bêbados. Os que não têm medo de dizer não quando não é não. Os que dizem sim quando sim é sim. Os que riem contigo até chorar e os que choram contigo até rir. Os teus amigos vão ser os maiores. Vão saber calar-se quando não precisares de ouvir mais nada. E vão gritar por ti quando ganhares. Vão estar sempre lá mesmo quando não estão. São assim os amigos. Percebes? Ainda achas que o Rodrigo não é teu amigo?

Ele {depois de uns segundos em silêncio}_ "Sei lá".

Eu_ "Vais saber filho."




09/12/2014

RELAX, SÃO SÓ COMPRAS DE NATAL


Este fim-de-semana teve de ser. Um dia no Shopping. Presentes de Natal e mais não sei quê.  Mas desta vez foi toda a gente. Eu, o miúdo e a mulher. Fomos de manhã porque está visto que as pessoas não gostam de acordar cedo. Muito menos a feriados. Mas como eu já tinha levantado os ossos da cama às 7 da manhã para levar o cão a correr e a nadar na praia, não me importei nada de ir cedo ao shopping. Melhor assim. Porque mal cheguei estacionei logo e à porta. Nada daqueles passeios de parque de estacionamento atrás da procissão no -1 à procura do lugar perfeito só porque embirram que não querem estacionar no -2 ou no -3. Estacionamento fácil e aí vamos nós.

A 10 metros da Primark comecei a sentir arrepios e suor frio. O cheiro a borboto já se me adivinhava. Parámos à frente da porta. A minha mulher olhou para mim e sem dizer nada sorriu. Disse "já volto" e desapereceu por entre a multidão. Eu com o meu filho ao colo mal tivemos tempo de nos despedirmos. "Boa sorte e vai com Deus" foram as últimas palavras que lhe dissemos antes de ir. Sinceramente, cheguei a ter dúvidas que voltássemos a vê-la. Mas eu já a vi às compras. Aquilo é o John Rambo das compras. Virámos costas e fomos à nossa vida, eu e o filho.

Lojas de brinquedos, loja de skate, surfshop, loja de legos, volta de comboio, fizemos um bocadinho de tudo. Até que passámos um daqueles espaços de babysitting para os miúdos ficarem e não enlouquecerem junto com os pais nas lojas. Perguntei-lhe se ele queria lá ficar. Disse logo que sim. Pensei "óptimo, fica e eu despacho as minhas compras de Natal". Quando vou deixá-lo, reparo que não tinha a minha carteira. Nem identificação nem dinheiro nem cartão. Nada. E lembro-me que a minha mulher tinha ficado com ela. A minha mulher que estava na Primark.

Olhos virados para o céu, "epá a sério Deus?". Vi-me levado a quebrar a minha jura. Decidi tentar entrar na Primark para encontrar a minha mulher. Eu e o meu filho. Antes disse-lhe "filho, vamos entrar nesta loja. Não quero que largues a mão do pai nem um segundo. Temos que nos manter juntos se quisermos voltar a saír." Não foram precisos mais de 5 minutos para sentir que estávamos a brincar com fogo. Num feriado a 2 semanas do Natal aquilo era outro nível. Estávamos bem fora da nossa liga ali. Incapazes de lidar com a fúria dos borbotos, o meu filho vira-se para mim a implorar "quero saír daqui pai. cheira a pó. esta loja cheira a pó." Ahhhh, tal pai tal filho. Eu disse-lhe, "filho, vamos já saír. O pai só queria encontrar a mãe, mas já vi que isso não vai acontecer. Vamos embora".

Saímos e já cá fora tentei ligar-lhe. O telefone tocava, mas ninguém atendia. Pensei o pior. Mas felizmente devolveu a chamada logo de seguida. Digo eu: "Estive aí... Não, está tudo bem... Preciso da minha carteira e ficaste com ela... Não consigo entrar outra vez... Sai tu por favor... Ok... Eu espero..."

Ficámos ali fora à espera. Eis que vejo a minha mulher a saír. Os olhos dela pareciam os de quem tinha acabado de dar na coca. Estendeu a mão com a carteira na minha direcção e disse com os olhos muita abertos e vidrados "toma... vou voltar... nunca mais faço compras de Natal noutro sítio... acho que vou conseguir comprar tudo hoje..." e foi. Virou costas e voltou a entrar enquanto falava sozinha ainda com cotão agarrado ao cabelo.

Eu, bem, eu larguei a criança lá no espaço de babysitting com um trampolim gigante. Agarrei em mim, sentei-me num sofá, mãos atrás da cabeça. Virei-me para o senhor que estava sentado no sofá ao lado cheio de sacos de compras aos pés e com ar desgraçado e disse-lhe com um sorriso: "Não adora as compras de Natal?"

05/12/2014

NÃO DANCES NÃO


Fui uma vez à Primark. Faz hoje quase 1 ano. Nunca mais esqueci. Ou melhor, nunca mais esqueci que fui, mas não me lembro muito bem do que aconteceu lá. O meu cérebro entrou em complete shutdown. Mas lembro-me bem que quando saí de lá disse à minha mulher que nunca mais lá entrava.

Mas quis o destino que não fosse bem assim. Então há cerca de uns meses, voltei lá. Fui ao engano. A minha mulher disse-me, "ah e tal, tiveste azar com a hora e o dia da outra vez. Experimenta lá ir a uma hora em que as pessoas estão a trabalhar. Vais ver que está tranquilo". Fui. Acreditei nela. Acreditei mal. Eram 11h00. Saí de lá às 12h00. Tudo para comprar um fato do Spider Man que o meu filho embirrou que queria. Estava esgotado. Ainda assim demorei quase 1 hora lá dentro. Não sei o que se passa com aquele sítio. Mas para mim entrar lá é como ser largado em plena Amazónia sem GPS e sem nada. Jurei daquela vez que nunca mais.

Quis o destino que não fosse assim outra vez.
Quis o destino que o meu filho tivesse que dançar uma música nesta próxima festa de natal da escola. Quis o destino que para isso, tem que ter um chapéu à Gene Kelly. Quis o destino que a única loja que tem um chapéu desses na península ibérica é... Primark.

Agora... disseram-me que era preciso o chapéu faz hoje 3 semanas. E disseram-me que na Primark havia. Eu tentei de tudo para não lá ir. Fui a dezenas de outras lojas. Procurei no Porto e em Lisboa. Em Sintra e em Cascais. Tentei encomendar pela Amazon. Eu estava disposto a gastar 30€ num chapéu que a Primark vende por 4€. Mas o dia D chegou. E eu sem chapéu.

Quis o destino que eu voltasse a pôr os pés na Primark.
Tentei planear isto de forma estratégica. Pensei "vou escolher uma Primark mais afastada. Uma que não dê para ir de transportes públicos. Elimino logo a percentagem de pessoas que não usam carro." Depois pensei "agora vou escolher uma hora em que as pessoas ou estão a trabalhar ou a caminho do trabalho no meio do trânsito. Assim elimino logo a percentagem de pessoas que trabalham." A minha concorrência seriam apenas as pessoas desempregadas ou de férias com carro. Sou genial pensei eu. E fui. Determinado a trazer o chapéu.

Quis o destino que a quantidade de gente desempregada ou de férias com carro é impressionante. F#$a-se, mas porquê?! Bom, é cerrar os punhos e entrar.

Entrei. Passados 5 minutos estava perdido. Não conseguia encontrar a secção de criança. Até que vi uma senhora com um carrinho de criança e seguia-a. Como quando um gajo vai atrás da ambulância que abre caminho no meio dos engarrafamentos. Lá cheguei à secção. E lá estava o chapéu. Agarrei nele e pus-me a correr por entre roupa e cabides que nunca mais acabavam. E lá encontrei as caixas para pagar. Uma fila, mas uma senhora fila. Porra. "Deus, por favor, ajuda-me, só mais esta vez" pedi eu de olhos postos no céu. Mas Deus tinha outros planos para mim. Depois de 10 minutos na fila e quando faltavam 2 pessoas para chegar a minha vez, olho para o chapéu e reparo que não tem etiqueta. Começo a tremer e a revirar o chapéu à procura de uma merda de um código de barras. Nada. Só instruções de lavagem. Olho para cima, para o céu, "Really Deus? Really?".

As cenas que se seguiram são tão tristes que não vou falar nelas. Só quero esquecer. Como tive de sair da fila e voltar lá à secção de criança que já nem me lembrava onde era outra vez. Como aquele chapéu era o único sem etiqueta e claro que foi o que tive de agarrar. Como tive de voltar a meter-me na fila para pagar que estava maior ainda do que da última vez. Como me perdi e não dava com a saída e só via os olhos tresloucados das pessoas que vagueavam por entre cabides a bater contra tudo e todos. Só quero esquecer.

Mas saí da loja com o chapéu à Gene Kelly de 4€. Sentei-me num banquinho a descansar. E a jurar com todas as forças que nunca mais. E juro, se o meu filho não arrasar na festa de natal e dançar como o Justin Timberlake com a porcaria do chapéu, vou viver para o meio de uma selva no Camboja como o Marlon Brando no Apocalypse Now.

03/12/2014

"LET'S START WITH A GOOD DAD"

Em relação ao último post, e depois de estar todo o dia a reflectir sobre a resposta a dar ao meu filho, encontrei a solução.

Vou oferecer um piano ao meu filho e ensinar-lhe a cantar esta música a quem lhe quiser bater.



Peace.

QUESTÕES DE GÉNERO PARA TOTÓS


O outro dia o meu filho deu um soco na barriga da prima. Ambos têm 4 anos. Chamei-o. A minha irmã disse logo "deixa estar que eu já lhe chamei à atenção". Mas para mim, só "isso não se faz" não chega. Disse-lhe para pedir desculpa à prima. E depois das desculpas, puxei-o à parte. Porque evito ralhar com ele à frente de toda a gente. Cenas minhas. Segue-se a seguinte conversa:

Eu_ Filho, nunca mais bates a uma menina. Nunca mais.

Ele_ Mas ela bateu-me primeiro. E tu disseste pra bater quando batem primeiro.

{caraças que este puto tem resposta sempre para tudo}

Eu_ Sim, mas não foi bem isso que eu disse. Eu disse para tu nunca deixares ninguém te bater. Se algum menino te bater, tu podes te defender. Defender é não deixares que te batam. Se for preciso, agarras os braços, empurras, mas não bates nunca primeiro. Só bates se não pararem. E é só aos meninos. Nunca bates numa menina. Nunca.

Ele_ Mas ela bateu primeiro.

Eu_ Às meninas, nunca. Nem quando elas batem primeiro. Nunca nunca.

Ele_ Porque é que às meninas não e aos meninos posso?

Eu_ .............. {shit} ......... Vá, vai lá brincar com a tua prima e deixa-me a pensar um pouco sobre isso.

20/11/2014

O MELHOR DIA DO ANO


Apesar de estar com uma gripe filha da mãe, apesar do frio e da chuva, apesar do meu cão ter comido a cama que lhe comprei há 2 dias, apesar de ter que pagar 400 € numas análises para o meu filho, apesar de não ter mais férias para gozar este ano, apesar do vento on-shore, apesar disso tudo, hoje é o melhor dia do ano. É o dia nacional do pijama*. Significa isso que hoje os miúdos e as miúdas vão vestidos de pijama para a escola. Ou seja, significa isso que é só tirar o meu filho da cama tal qual está e enfiá-lo no carro. Tout court. Ah, se todas as manhãs pudessem ser assim. Não me entendam mal. Adoro a minha família. Mas o meu filho tem um acordar de m*#da. Não é só na beleza que sai à mãe. As manhãs são dramáticas. Se pudesse mais ou menos comparar, as manhãs seriam tipo aquele programa Wipeout. E uma das tarefas mais difíceis é vesti-lo. Vesti-lo é o equivalente a fazer um cubo Rubik pendurado pelos pés e com as mãos atadas atrás das costas enquanto alguém nos dá com um pau nas pernas. Envolve por vezes uma dura negociação, uma cadeira e algumas cordas. E normalmente acaba com ele no carro a chorar aos berros, a mãe com a cabeça encostada ao vidro e eu a revirar os olhos. E apesar de saber que tem de se vestir todos os dias, todos os dias é o mesmo fado. Todos os santos dias. Menos hoje. O melhor dia do ano. É que nem o acordo. É agarrar nele e enfiá-lo no carro.

*O dia nacional do pijama  (20 de Novembro) explicaram-me ser um dia solidário de crianças para crianças, sobre o direito das crianças a crescerem numa família.

22/09/2014

COMEÇA A GANHAR ASAS

Estes dias são os meus preferidos. Aqui faz-se história. Obrigado pelos melhores momentos da minha vida, puto.



Nota. o puto de 3 anos quase 4 a subir o quarter-pipe em alta velocidade enquanto me dá a mão é o meu filho. just saying.

17/09/2014

O QUE TU QUERES SEI EU


"pai, quero uma méspê".

Eu_ "uma quê?"

Ele_ "méspê! méspê! não sabes?"

Eu_ "não filho. não sei. é o quê?"

Ele_ "é uma coisa preta para jogar."

Eu, incrédulo, mas ainda em dúvida_ "uma PSP?"

Ele_ "sim é. uma péspê".

E começou desta forma a birra de 30 minutos até casa. Diz ele que quer uma PSP. Digo eu que nem pensar. PSP. PlayStation Portátil, não as forças de segurança. Deve estar a brincar comigo. Ao que parece, um miúdo lá da escola tem uma e levou-a. Um colega dele portanto. Um miúdo de 4 anos. Com uma PlayStation Portátil. Teria muito a dizer sobre isto. Na verdade, apeteceu-me falar no assunto na reunião de pais que tivemos na escola esta semana. Falar como à conta disso tive de levar com uma birra monumental do meu filho. Como tive de explicar a um puto de 3 anos porque é que o amigo tem uma PSP, mas que ele não pode nem vai ter uma. Como tive de ser incisivo e assertivo na minha posição intransigente de "não te vou dar nenhuma PSP". Como tive de fazer um exercício de retórica e pensamento abstracto para além do humanamente possível de forma a explicar-lhe porquê. Como por causa do amigo e da sua PSP tive um final de dia de merda e o meu filho também. Mas epá, quem sou eu para julgar os outros pais. Os pais do Zé (vamos chamar-lhe assim) também certamente não concordarão com o meu filho a andar de skate sozinho com 3 anos. Um desporto perigoso e que pode levar a que ele parta um braço ou uma perna.

A mim faz-me confusão os pais queixarem-se que os putos são muito dependentes dos jogos e dos iPads e iPhones, quando são eles que os põem nas mãos dos filhos com 3 anos. A eles deve fazer confusão eu queixar-me do meu filho se espetar em ouriços quando sou eu que o deixo andar em cima das lages no mar. Ou de me queixar da frustração dele quando não consegue alguma coisa, quando sou eu que lhe digo que ele consegue tudo se quiser. É assim. Somos todos os melhores pais do mundo. E somos todos uns pais de merda. Tive muita vontade de falar no assunto na reunião. Mas depois não o fiz. Porque isto é uma lição. O meu filho nem sempre vai ter tudo o que o amigo ou colega tem. Nem os amigos ou colegas vão ter tudo o que ele tem. Ele tem de aprender a lidar com isso. E eu tenho de aprender a conseguir explicar o inexplicável. Ou pelo menos que faça algum sentido na cabeça dele. E se eu conseguir isso com um miúdo de 3 anos, raios me partam se não vou conseguir convencer o meu chefe a dar-me um aumento e a reduzir-me a carga horária.

04/09/2014

A BALA QUE PASSA AO LADO

Hoje em dia é difícil ter fé. É natural. Não é que hajam mais tragédias e dramas pessoais ou colectivos do que antes. Não é isso. Sempre existiram. Doenças, epidemias, guerras, mortes, separações, abandonos, abusos, torturas, pobreza. Houve sempre disso. Mas a globalização da informação dá-nos uma percepção de que o mundo está a desabar. Temos mais consciência dos abalos nas vidas de gente por este mundo fora do que alguma vez tivemos. Junta-se os nossos dramas pessoais a esses pelo mundo fora, e este quase parece um mundo com prazo de validade expirado. Difícil ter fé. Quase parece que Deus se cansou e bateu com a porta. Ou que o caos organizado do universo se desalinhou por cansaço dos iões e dos átomos. O que quero dizer é que dá a sensação que fodemos isto tudo e que agora "we're on our own". Desculpem a linguagem. É um abalo à fé. É mesmo. No meio disto tudo, tenho um filho. Com quase 4 anos. O mundo dele é mais simples. Heróis não morrem nunca. Os "maus" morrem mas estão vivos logo a seguir. Porque só são "maus" a fingir. E a morte é tipo uma sesta repentina que dura só até o herói e o "mau" se juntarem os dois à mesa com ele a lanchar. Bolachas de chocolate com iogurte. Doenças para ele chamam-se "dói-dóis" e resolvem-se com betadine e um penso colorido. Guerra nem sabe o que é. Nem nunca deve ter ouvido a palavra. Uma caveira para ele representa um pirata e não a morte. E o pirata para ele representa um tipo de pala, com barco, muitos amigos e um papagaio. Não um daqueles tipos da Somália que assaltam barcos e raptam pessoas. É mais simples o mundo dele. Ainda carregado de fé. Fé que vai ter aquele brinquedo com que sonha. Fé que vai passear, não interessa onde. Fé que vai comer frango com batatas fritas. Mesmo que que não tenha nada disso quando pede. Mas tem sempre fé. Todos os dias me pergunta se vai ter o transformer, se vai passear, se vamos comer frango, se vamos pintar a cara com a Tia Carla, se vamos andar de skate para a Quiksilver. Todos os dias. Tem fé. E nós, nós pais, aqui a balançar entre o ensinar-lhe a ter fé e o nem tudo vai ser como ele espera. Tarefa ingrata esta. E difícil pra caraças. É como dizer-lhe "tens que acreditar filho" e depois dizer-lhe "não vais ter sempre o que queres só porque acreditas". Então porque é que havemos de ter fé? Porque havemos de acreditar? Se muitas vezes não parece resultar? Num mundo a azedar, com prazo de validade quase expirado, como é que preparo o meu filho para a trampa que vai ver sem que azede ele também? E porque hei-de fazê-lo? Deve haver gente com respostas mais inteligentes e lógicas do que a minha para isto. Eu cá só tenho uma teoria. Porque milagres acontecem. Há sempre uma bala que passa ao lado. Acreditem.

Nota. O vídeo abaixo contém imagens gáficas que podem impressionar.

03/09/2014

O MEDO DA ÁGUA QUE AFINAL NÃO ERA


O meu filho sempre adorou água. Anda na natação desde os 4 meses de idade. Desde muito pequeno que se habituou a ir ao mar. Com ondas, sem ondas, esteve sempre como peixe na água. Confiante e à vontade. Por isso achei estranho quando um dia chegámos à praia e ele não quis ir à água. Carregado com pranchas, fatos, baldes, regadores, pistolas de água e toda uma parafernália para quem vai viver na água durante 1 ano, viro-me para ele e pergunto-lhe "então filho, o que é que vai ser? começamos com a prancha de bodyboard?". Ao que ele me responde "não quero ir à agua"........ "Não queres o quê?" pergunto eu ainda a sorrir a achar que era uma piada. "Não quero ir à água, já disse" responde ele sem me olhar na cara. Fico em estado de choque enquanto o balde me cai de uma mão e a prancha me cai da outra. Não quer ir à água?! Espera aí. Vivemos praticamente em frente ao mar, temos mais equipamento aquático do que o filme Waterworld, pus o puto na natação desde bebé e ele agora diz-me que não quer ir à água?!

Alguma coisa não está bem. Então pensei "já sei. vou eu para dentro de água fingir que me estou a divertir à brava e ele vai ficar cheio de vontade de ir também". Durante 1 hora estive a fazer figura de parvo na praia a chapinhar, a saltar e a urrar sozinho à beira-mar com baldes do Faísca McQueen, pranchas, e mais não-sei-quê. Ele, sério e sereno, sentado na toalha a olhar para mim.

Saí da água e fui ter com ele. Perguntei-lhe "filho, porque é que não queres ir à água?". "Porque não" era a resposta dele. Sempre. Só assim. Porque não.

Durante os dias que se seguiram, simplesmente não queria entrar na água do mar e evitava-me quando lhe perguntava porquê. Desisti de insistir com ele para entrar. Mas queria saber o porquê da súbita fobia. Andei às voltas na cabeça a tentar perceber o que tinha acontecido. Teria sido alguma coisa que eu fiz? Não chegava a conclusão nenhuma. Perguntava-lhe e a resposta era sempre a mesma: "porque não quero". E depois desviava a conversa. Andei dias a fio a tentar descobrir. Até que um dia pensei que talvez não estivesse a fazer a pergunta certa. Então fiz-lhe a pergunta de modo a que ele não pudesse responder "porque não quero". Foi assim a conversa:

Eu_ "filho, posso falar contigo?"

Ele, já a adivinhar que eu ia bater na mesma tecla_ "não quero"

Eu_ "não queres ir à praia?"

Ele_ "não"

Eu_ "é porque não queres entrar no mar?"

Ele_ "sim. não quero"

Eu_ "então se não quiseres, não faz mal. só entras no mar quando quiseres, 'tá bem?"

Ele, já menos desconfiado_ "''tá. só na areia, 'tá bem?"

Eu_ "está bem. combinado. só na areia. se quiseres ir ao mar podes ir à vontade. mas se não quiseres, também não faz mal. combinado?"

Ele_ "combinado"

Eu_ "posso perguntar só uma coisa?"

Ele_ "sim"

Eu_ "o que achas que pode acontecer no mar se entrares?"

Ele_ "tubarões"

...........................

Tubarões. Claro. Porque é que eu não pensei nisso.

Duas lições a retirar da história:
  1. Para perceber as coisas do ponto de vista de um miúdo de 3 anos, é preciso pensar como um miúdo de 3 anos e ver o mundo através dos olhos deles.
  2. A t-shirt do Jaws talvez não tivesse sido boa ideia.

01/07/2014

BATE BATE CORAÇÃO {MAS COM CALMA}


A propósito do último post...

Fui ao cardiologista. Especialista em arritmologia. Um extraordinário médico. Viu os meus exames todos. ECG's, análises, ecocardiograma e prova de esforço. Tudo óptimo. Explicou-me tudo com detalhe e pormenor. Fez questão que eu só saísse de lá sem qualquer dúvida. Não há muitos médicos assim. E é pena. Porque é assim que deviam ser todos. Não se apressou nem me apressou na consulta. Foi-me tranquilizando. Quando ficava muito tempo a analisar algum exame, percebia que eu ficava em estado de alerta e dizia-me "não se preocupe, está tudo normal. Estou só a ver o detalhe". Fazia-me perguntas. Dava-me respostas. E deixava-me que lhe perguntasse tudo.
Resultado, parece que tenho uma Taquicardia Paroxística Supraventricular. Uma espécie de curto circuito que acontece no meu coração em que o "sistema eléctrico" do coração sobrepõe um impulso adicional para ele bater. Quando isso acontece o meu coração "salta" um batimento. E às vezes, esse "saltar" do batimento desencadeia uma sequência repetitiva de batimentos em cadeia a alta velocidade. Por isso o meu coração pode a qualquer momento passar de 60 BPM a 160 BPM. A boa notícia é que apesar de assustador e aflitivo não é normalmente perigoso ou mortal em corações saudáveis e com estrutura normal. Que é o caso do meu. Entretanto o cardiologista ensinou-me alguns truques para interromper esse curto-circuito e acalmar o coração quando isso acontece. São duas. Uma é suster a respiração e fazer força como se fosse evacuar. A outra é pôr os dedos na boca e causar um "gag reflex" que é aquele reflexo de quem vai vomitar. Portanto se me virem na rua e parecer que estou a "evacuar" ou a vomitar-me em pleno passeio, é só porque estou a ter uma taquicardia. No worries.

Nota: o fantástico cardiologista chama-se Dr. Manuel Nogueira da Silva e foi na CUF Descobertas. Grande médico. A fotografia da minha frequência cardíaca é através da app Instant Heart Rate para iphone.

19/06/2014

É FUTEBOL MAS PODIA SER A VIDA



Nota: não sou um grande e fervoroso adepto de futebol. odeio clubismos*. não sigo atento a liga portuguesa. e não dou um tostão ao Sport TV. mas gosto de desporto. e adoro o Mundial. as únicas vezes que escrevo sobre futebol.

Escrevi o último post minutos antes do jogo Portugal x Alemanha. Mais valia estar calado. Mas não faz o meu estilo estar calado. Por isso venho bater na mesma tecla, porque sou teimoso assim.

Não acho que jogámos mal. Acho que jogámos uma merda. Os outros fizeram o que foram ao Brasil fazer: ganhar. Essa é a diferença. Mas não é só isso. É também isto:

  • O Pepe foi expulso. Pois foi. Foi impulsivo e estava revoltado com o outro que, tal como disse no último post, mandou-se para o chão a fingir uma falta. Mas já lá vou a esse assunto. Ainda sobre o Pepe, a única coisa que censuro é a falta de profissionalismo. Pedia-se e exige-se mais a profissionais. Também me apetece não poucas vezes encostar a testa em alguém no meu trabalho mas não o faço. Tenho que ser mais do que isso. Mas uma coisa é certa. Nunca irei criticar a entrega e coração com que o Pepe estava a viver o jogo. Tivessem o resto dos jogadores tanta entrega e garra como ele. O resultado não tinha sido o que foi. Mesmo com um jogador a menos. E não venham dizer que foi por isso que perdemos. 
  • O Müller fez exactamente o que eu criticava no futebol no último post. Sentiu a mão do Pepe de raspão e mandou-se para o chão agarrado à cara como se tivesse levado um soco em cheio no olho. Um atleta de 1.86 m. Pussy. É o que é. E não é caso único. O futebol é assim. Especialmente o futebol europeu. Um desporto de pussies de 1.80 m que passam a vida a mandarem-se para o chão a gritar e a chorar. E que mal o árbitro apita, levantam-se fresquinhos como se nada tivesse acontecido. Em qualquer outro desporto, isso seria deplorável. Uma vergonha. Mas no futebol não. No futebol chama-se "ganhar" uma falta. Até o verbo utilizado está errado. Não é "ganhar" nada. O que deviam ganhar era vergonha por serem uns pussies.
  • Portugal tem talento. Nada de excepcional, tirando o CR. Mas tem talento. O suficiente para ganhar a qualquer equipa em prova. Mas falta-lhes a coisa mais importante. Alma e paixão. Confiança. Determinação. Drive. É o que lhes falta. Só isso.
Portugal perdeu. É assim a vida. Às vezes ganha-se outras vezes perde-se. E na vida, pouco interessa andar a ruminar nas derrotas e a tentar arranjar culpas ou desculpas. Se fizermos isso na vida, ela vai correndo e nós parados a lamentar-nos e a consumir-nos com o que já está irremediavelmente perdido. É inútil. E é estúpido pensar que já não vamos conseguir mais nada porque caímos antes. O que interessa, é levantar. Sacudir o pó. Olhar em frente. E continuar. Acreditar. E fazer melhor. Farto-me de dizer isso a toda a gente que conheço na vida. Incluindo ao meu filho. Não por estas palavras exactamente. E mostro-lhe por exemplo. Quem me conhece sabe que sou assim. E tenho pena de ver miúdos a lamentarem-se e a insultarem e a culparem todos na face da derrota e da adversidade, tal como vi no café onde assistia ao jogo com o meu filho. São o reflexo dos seus pais. E muitas vezes do seu país. São assim ali. E provavelmente fora dali. Tenho pena. Porque sou português. E não vejo a vida assim. Mas enfim. Cada um é como é. Eu cá vou continuar a acreditar. Como faço na vida. Com ou sem Cristiano Ronaldo, Portugal pode ganhar o mundial. Mas tem que querer. Querer muito. Querer mais que os outros todos. Só assim.

O meu filho vai continuar a vestir a camisola. E eu a convencê-lo a ter orgulho nela. Até ao fim. Que pode ser já no domingo. E se for esse o caso, passa a vestir a da Argentina. Talvez o país da família da parte da avó lhe mostre o que é querer muito. Senão, estou cá eu e a mãe sempre a mostrar-lhe.


*Clubismo: O clubismo é a expressão da negação da razão por intermédio da alienação face a uma entidade que visa alcançar objectivos na área do desporto.
É ver só uma equipa e ver nela o expoente máximo do que é jogar futebol, é arranjar desculpas para a equipa quando joga mal, é ser fanático de uma causa doentia.
O clubismo é não aceitar o valor de um adversário ou que outra equipa possa jogar melhor.

16/06/2014

YES WE CAN


Durante anos vivi nos EUA. Lá aprendi algumas coisas. Uma delas foi no desporto, mas que podemos transportar para a vida. Aprendi a lutar até ao fim. Nunca desistir. Jogar para ganhar. Ser mais forte, mais rápido, mais resiliente. Acreditar. Superar-me. Essa é a filosofia do desporto nos EUA. De uma forma geral.

Não sei se está bem ou mal, mas foi assim que cresci e é assim que sou. E é isso que quase inconscientemente passo ao meu filho. Ainda no fim-de-semana passado tive essa conversa com o meu cunhado. A propósito dos X Games* que aconteceram na semana passada, comentei de forma séria que o meu filho iria ser o primeiro português a ganhar uma medalha de ouro nos X Games na categoria de skate. Não sei se me levaram a sério. Acho que não. Mas o que eu disse foi sério. Porque foi assim que aprendi a pensar. O meu filho faz 4 anos este ano. Mostra ter um jeito natural para skate. E a maneira como penso começa a ver-se nele. Na última ida ao skatepark, quis ir para uma rampa. Não era uma rampa qualquer. Uma rampa que até eu não conseguiria fazer. Uma rampa 5 vezes o tamanho dele. Foi difícil conseguir convencê-lo que ele ainda não está preparado para isso. Que é preciso ele treinar mais. E crescer mais. E que precisa de ajuda para isso. Na cabeça dele, ele consegue. Ponto final. Consegui demovê-lo. Por agora. Mas isto para mostrar o que a determinação e confiança fazem. E os americanos são exímios nisso.

Recentemente li um artigo interessante a propósito do Mundial de futebol 2014. Era sobre a selecção americana. Mais especificamente sobre uma das grandes falhas e handicaps da selecção de futebol dos USA: a dificuldade e imperfeição da simulação das faltas. O artigo explica como culturalmente o americano aprende que simular uma falta é sinal de fraqueza. Aliás, sofrer uma falta e ficar no chão a rebolar é sinal de fraqueza. Simulá-la é sinal de fraqueza e cobardia. Aprende-se que aguentar uma falta e não caír é sinal de valentia, bravura e força. E por isso, a selecção dos Estados Unidos estará sempre em desvantagem num desporto em que a simulação da falta faz parte do jogo e faz não poucas vezes a diferença entre ganhar e perder. Já vimos isso acontecer umas quantas vezes neste mundial, a começar logo pela penalidade do Brasil contra a Croácia. Eu cá gosto de futebol. Não sou de entrar em picardias da bola como muita gente que não percebe um boi de futebol. Gosto de futebol, como gosto de muitos desportos, mas gosto de ver um bom jogo. Jogado. Até ao fim. Sem faltas e faltinhas, e sem homens de 1.80m a rebolarem no chão como bebés agarrados às pernas quando mal lhes tocam. Gritam como crianças e arrastam-se pelo relvado de cara no chão como se lhes tivessem amputado uma perna a sangue frio. É triste. Mas é futebol. Não vejo isso noutros desportos. E muito menos vejo isso em atletas americanos. Que aprendem desde pequenos a jogar e nunca caír mesmo quando levam porrada a sério.
E ainda em relação ao Mundial, quando passaram um questionário em vários países a perguntar aos respectivos cidadãos quem é que achavam que ia ganhar a taça do mundo, a grande maioria das pessoas de vários países dividiam-se entre Alemanha, Brasil, Argentina, Espanha. Sabem o que responderam a grande maioria dos americanos? USA.

Eu cá, por exemplo, sou o unico do meu círculo de amigos e colegas que acha que Portugal vai ganhar. Não é ganhar à Alemanha. É ganhar o campeonato do mundo. Trazer a taça. E sem querer estou a passar essa forma de pensar e "jogar" ao meu filho. No skate, na bola, na vida. Acreditar que vai ganhar. Não que pode ganhar. Mas que vai ganhar. Lutar até ao fim. Acreditar. Nunca desistir nem jogar para empatar ou para o 2º lugar. A ser mais forte, mais rápido, mais resiliente. Não se fazer de coitadinho. Não enganar. E é assim que quero ver a minha selecção hoje. E é isso que eu quero que o meu filho veja hoje naqueles 11 portugueses em campo. Ou à americana, "Bring that fucking cup home already".

*Para quem não sabe, os X Games são uma espécie de jogos olímpicos de desportos de acção, e que incluem entre muitas modalidades o skate.