domingo, 23 de maio de 2010
quarta-feira, 30 de dezembro de 2009
Ajudem a salvar a Vila Ana e a Vila Ventura!
Desta vez, o tempo urge, para que possam ser salvas e preservadas.
Juntem-se a esta causa, aqui, e ajudem na sua divulgação pff.
Muito obrigada!
sexta-feira, 21 de agosto de 2009
sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009
Notas Soltas - 141
Esta tarde ao subir a rua à pressa, para ir apanhar a camioneta, vejo a L. a conversar com um vizinho... e sou surpreendida pelas tonalidades bastante originais de um pequeno gato, que ali se encontrava, junto ao seu portão.
Passa mais outro vizinho e pergunta-nos se queremos apanhar o gatinho. Tenta em vão, com o fio do seu porta-chaves chamar a atenção do gatinho quase dálmata (pelas cores que possui).
L., sempre muito despachada e risonha, abre o portão do seu quintal e entra por ali a dentro, determinada a apanhar o seu gatinho, para que lhe possa tirar uma fotografia.
Kitty deixa-se, finalmente, apanhar pela sua dona, aquela que a resgatou das ruas do bairro quando tinha apenas 2 meses e por ali jazia abandonada ao frio.
L. pede-me muitas desculpas por a casa não estar arrumada, senão convidar-me-ia a entrar. Fica para uma próxima ocasião.
No pequeno e aprazível quintal de L. convivem harmoniosamente a pequena Kitty, Bambi o cão de guarda, o pato e uma trupe de pombos enclausurados.
Eu, menina da (grande) cidade, aí nascida e criada, fico fascinada, por largos minutos, a observar aquela tranquilidade campal, no final de uma semana.
Às vezes, sabe bem dizer que se trabalha assim tão perto do campo!...
A freguesia de Benfica vai passar a estar também um pouco mais presente aqui, no "Cidadania LX", um blog em que a única preocupação é a de "uma Lisboa pelos lisboetas e para os lisboetas".
Muito obrigada ao Paulo Ferrero pelo convite!
domingo, 15 de fevereiro de 2009
"Retalhos de Bem-Fica"
Passado quase um ano, chegou hoje ao fim (por vontade própria) a minha colaboração com o "Mercado de Bem-Fica" (blog que havia iniciado conjuntamente com a J., devido a uma das rubricas que mantinha aqui no "Palavras&Imagens").
A partir de agora, seguirei outros rumos a solo num novo blog intitulado "Retalhos de Bem-Fica", mantendo porém a mesma linha editorial/criativa.
Bem-vindos a todos os que por lá quiserem continuar a seguir as minhas incursões pela freguesia de Benfica!
sexta-feira, 1 de agosto de 2008
A "Rabinho de Raposa"
As parcas “aventuras-com-animais” em que, nos últimos anos, me tenho visto enleada têm sido, quase sempre, preenchidas com a descoberta de grandes "personagens"…
Pessoas cujas vidas e pequenos gestos diários trouxeram algo de único e muito precioso ao tempo que passaram neste mundo.
Pessoas que, na maioria dos casos, findaram sozinhas e esquecidas os seus próprios dias…
Mas cujas histórias de vida, certamente, dariam direito a uma bela narração no papel.
Esta é uma homenagem muito sentida a uma dessas "personagens", uma grande Senhora, que, infelizmente, não tive a oportunidade de conhecer senão através das palavras das suas vizinhas (que, nas últimas semanas, tenho escutado atentamente), dos risos quentes que noutros tempos me chegavam vindos do seu terraço… e dos olhos das duas gatas que sempre protegeu em vida.
"Quero, um dia, dizer às pessoas que nada foi em vão...
Que o amor existe,
que vale a pena se doar às amizades e às pessoas,
que a vida é bela sim
e que eu sempre dei o melhor de mim...
e que valeu a pena."
Mário Quintana
Rezam as memórias dos mais antigos que, em tempos idos, aqueles quintais haviam sido habitados por um número infindável de gatos, de todas as cores, pelagens e feitios.
Os felinos viviam em paz e tranquilidade nas suas lides quotidianas: ora espraiando-se ao sol quente da tarde, ora vagabundeando monotonamente de quintal em quintal… naquele pátio interior, fruto da confluência das traseiras dos prédios de duas das principais ruas de Benfica.
Dª. Luísa morava no 1º Esq. do prédio amarelo, num andar cuja cozinha terminava com uma imensa varanda fechada de cortinas alvas, que se abria sobre um pequeno terraço.
No seu pequeno terraço, debruado a buganvílias carmim, Dª. Luísa recebia diariamente a visita de inúmeros desses gatos dos quintais, a quem oferecia alimento e abrigo.
A “Rabinho de Raposa” (também conhecida por alguns como Misha) era bebé quando por ali começou a aparecer há muitos anos atrás (cerca de 18 no total), ainda o "Shaka" (cão da Dª. Julieta, a vizinha do lado e grande amiga de Dª. Luísa) era vivo.
Ninguém sabe ao certo de onde a Rabinho de Raposa apareceu, mas a sua pelagem de Bosques da Noruega deixava indiciar que a sua linhagem seria, eventualmente, originária daquele barracão de alumínio e vidro, à frente dos terraços, onde um vizinho do mesmo prédio amarelo fazia criação de gatos de raça para seu sustento.
Shaka, o Bichon Frisé, nascido na África do Sul, a quem haviam concedido nome de rei, não tolerava a presença dos restantes felinos no terraço da vizinha, apenas se predispondo a entendimento com a bela (e quase nobre pela pose) Rabinho de Raposa.
Dª. Luísa era viúva e, apenas de tempos a tempos, recebia a visita de algum familiar. No entanto, tinha uma perfeita adoração por uma das suas sobrinhas, a qual considerava como o seu “Ai Jesus!”.
Com a distância física e o esquecimento moral dos que lhe eram próximos pelo sangue, Dª. Luísa acabou por ter que tecer a sua própria família no prédio onde viveu durante mais de 30 anos (afinal de contas, sempre possuíra veia de artista e tecia tapetes de Arraiolos como ninguém!): Dª. Julieta, a vizinha do lado, era a amiga de todas as ocasiões, com quem compartilhava o seu amor pelos animais; Dª. Helena, a vizinha do 2º andar, a sua confidente dos últimos anos, quando se apaixonara e não sabia o que as restantes vizinhas iriam comentar nas suas costas por receber visitas diárias do seu homem.
Dª. Luísa era, sobretudo, uma mulher muito avançada e emancipada para o seu próprio tempo!...
Apaixonada sim, mas com as devidas distâncias (e cautelas), mantendo-se cada um na sua própria casa – ou não fora o facto de ser Aquariana lhe conceder essa intempestividade quotidiana de quem anseia sempre por mais liberdade interior.
No que diz respeito aos ciclos reprodutivos dos felinos dos quintais, foi, também, Dª. Luísa que, por sua livre auto-recriação, decidiu passar a dar a pílula a todas as gatas, quando descobriu que a maioria dos gatos que ali nasciam das ninhadas sucessivas da “sua” Rabinho de Raposa terminavam os seus dias envenenados num quintal não muito longe do seu pequeno e aprazível terraço.
E foi assim que no seu pequeno terraço passaram a viver (protegidas) apenas a Rabinho de Raposa e uma das suas filhas que nunca dali se afastara (gata a quem nunca apelidara, talvez, por ser arisca; e a quem alguém, meses mais tarde, viria a nomear como Luana, por ter focinho de lua cheia).
Protegidas por entre as buganvílias e outras flores matizadas, Rabinho de Raposa e Luana tinham, também, o privilégio de pernoitar na varanda fechada de Dª. Luísa e, de vez em quando, de entrarem em sua casa.
Rabinho de Raposa, apesar da atitude de princesa e de nunca arranhar nada dentro de casa (ao contrário de Luana), tinha alma de viandante e, tal como a sua protectora, não gostava de se sentir aprisionada... pelo que gostava de ir sempre dar as suas voltinhas pelos quintais, tendo descoberto um outro 1º Esq. onde abundavam as iguarias para felinos.
Com o passar dos anos e os consequentes achaques de saúde, Dª. Luísa teve, um dia, que ser internada no hospital.
Nesse preciso momento, o seu pensamento encontrava-se muito mais distante da doença que a assolara... percorrendo o seu aprazível terraço, implorando às vizinhas que tratassem das duas gatinhas na sua ausência.
Alguns meses mais tarde, Dª. Luísa foi encontrada sentada na sua cozinha, como que adormecida… para todo o sempre (apenas a alguns dias de completar o seu 78º aniversário, no mês de Fevereiro de 2008).
O seu “enorme” e precioso coração, que todos os seres amava e protegia, havia parado bruscamente.
Rezam as memórias mais recentes que, no seu funeral, o seu apaixonado de outros tempos não conseguira evitar o pranto ao vê-la partir; tal como, no seu aprazível terraço, a Rabinho de Raposa ficara com os seus olhos felinos em lágrimas, enquanto dormitava na varanda fechada que fora de Dª. Luísa.
A família de sangue foi célere em arrecadar os bens e pertences de Dª. Luísa, despindo o outrora aprazível terraço de toda a vida vegetal e animal.
Rabinho de Raposa e Luana foram votadas ao abandono e enxotadas para longe, tendo encontrado abrigo no quintal vizinho de Dª. Julieta, que as continuou a proteger por se tratarem da única herança que a amiga de longa data lhe havia deixado.
Em pleno mês de Março, início da Primavera, os quintais estavam impregnados de um odor a flores murchas… como se a própria natureza sentisse a dor da perda deste imenso coração.
Em Abril, após a morte de Dª. Luísa e de um outro casal, a harmonia e beleza da vida nos quintais pareceram, por momentos, conseguir ser arrebatadas pela desumanidade do Homem.
Felizmente, durante o mês de Maio, a natureza e a própria vida conseguiram vingar por onde a agrura se quis instalar...
Os 6 filhotes de Luana nasceram no tanque da vizinha do R/c. Protegidos, durante meses a fio, das chuvas e do frio, pelo corpo e pêlo da Rabinho de Raposa, sua avó; que, mais tarde, ensinaria a sua filha Luana a pegar-lhes pelo cachaço e a trazê-los para o terraço que outrora pertencera a Dª. Luísa.
Rezam as vozes de quem viveu (bem) de perto toda esta história que não há mãe tão protectora e diligente como a Rabinho de Raposa… que só lhe falta saber expressar-se na nossa própria língua.
Há, ainda, quem diga que os animais adquirem as qualidades dos humanos com quem mais convivem!
domingo, 9 de março de 2008
Coisas de Outros Tempos
Rua Emília das Neves, Nº 14 A
Para a T. do "Dias que Voam" (um excelente diário de coisas de outros tempos, que nos deixa sempre com um sorriso nos lábios), como forma de agradecimento pelos miminhos que tem deixado às autoras do "Mercado de Bem-Fica"!
domingo, 2 de março de 2008
domingo, 24 de fevereiro de 2008
"Mercado de Bem-Fica"
A ideia surgiu aqui, fruto dos comentários que a J. me ia deixando nas fotografias da minha rubrica "Benfica" neste blog.
Da ideia à acção o espaço é sempre ténue, quando fazemos as coisas com entusiasmo... E daí nasceu este novo espaço em comum.
No Mercado de Bem-Fica, escrito a duas mãos, "vendemos" imagens, lembranças, textos, artigos... falamos (sobre) e damos a conhecer este bairro de Lisboa de que tanto gostamos.
E quem se quiser juntar a nós, será sempre muito bem vindo!
Basta enviar um e-mail para mercadodebemfica[arroba]gmail[ponto]com
sábado, 16 de fevereiro de 2008
quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008
Primavera antecipada?
As estações do ano andam transtornadas e alteradas...
O que fez com que, no início do mês de Fevereiro, as árvores começassem já a florir como em pleno mês de Março passado.
Pena que não seja já, também, Primavera nos nossos espíritos, que andam atafulhados em mil e um afazeres, preocupações e stresses... que nos consomem de uma forma tão exaustiva.
domingo, 27 de janeiro de 2008
Manhã de Domingo
Encontro com uma bela borboleta no parapeito da janela da cozinha...
... e uma gata preta e branca que, altaneira no cimo de um muro, enquanto se banhava ao sol quente matinal, parecia servir de guarda àquela casa ancestral.
Quando me aproximei para lhe tentar tirar uma fotografia, aproximou-se logo de mim, começando a miar e a roçar o dorso pelo muro, pedindo festas.
Não fui capaz de resistir e lá lhe dei um round de miminhos, enquanto ela ronronava e se contorcia toda tentando brincar com as minhas mãos.
Tal como todas as gatas petas e brancas, também esta parecia muito brincalhona e sociável.
O seu nome "Preta", tal como vinha inscrito a caneta na sua coleira, juntamente com dois números de telefone, provavelmente dos donos, que habitarão ali nas proximidades e a deixam vir à rua.
segunda-feira, 21 de janeiro de 2008
Jardim Comunitário
"Sim, o homem é o seu próprio fim. E é o seu único fim.
Se quer ser qualquer coisa, tem de ser nesta vida. (...)
Os conquistadores são os que podem mais.
Mas não podem mais do que o próprio homem quando ele o quer."
Albert Camus, in "O Mito de Sísifo"
De início, era um simples terreno vazio, que sobrara entre dois quarteirões de prédios de ruas vizinhas.
Nenhuma entidade responsável se decidira a fazer o que quer que fosse pelo dito cujo terreno. Até que os moradores vizinhos se uniram e meteram mãos à obra, transformando aquele espaço-de-ninguém num aprazível jardim comunitário.
Sabia da sua existência, mas nunca por ali havia passado...
Esta manhã, para encurtar caminho até à paragem de autocarro, decidi ir por ali. E o espanto foi imenso, quando vi o tamanho e a beleza daquele lugar.
Comecei a tirar algumas fotos. Até que uma senhora, que por mim, passou indicou-me um outro local escondido naquele jardim, que "esse sim, merece a pena ser fotografado!", segundo as suas palavras.
Uma senhora de bata aos quadrados azuis e olhar terno de menina, sentada numa esplanada improvisada, dava de comida a uma gata, um dos dois felinos que habitam aquele jardim, segundo viria a descobrir mais tarde.
Pausa na minha atribulada e atrasada manhã, para uma conversa com mais uma dessas pessoas que aqui no blog vou "coleccionando".
À despedida transmito-lhe os meus sinceros parabéns (extensivos a todos os seus vizinhos) pelo excelente trabalho que ali realizaram...
E prometo (a mim própria) ali regressar, muitas e muitas vezes, quando me apetecer desanuviar e pensar que me encontro longe do rebuliço da cidade.
Surgiram nos E.U.A., durante os anos 70, quando um movimento de habitantes começou colectivamente a recuperar determinados espaços urbanos, dentro dos seus bairros, votados ao abandono, transformando-os em "jardins comunitários".
Cada um desses jardins cristalizava as aspirações do grupo de cidadãos que estivera na sua origem.
A primeira vez que vi algo semelhante a este jardim foi em Bayonne (França), num terreno junto ao rio, cedido pela Mairie, para que os habitantes mais desfavorecidos e excluídos de um determinado bairro da cidade pudessem ali ocupar os seus tempos livres.
O conceito era mais compartimentado e menos colectivo do que este jardim de Lisboa, uma vez que, em Bayonne, cada habitante tinha direito a uma pequena parcela de terreno, protegida com vedação... "rivalizando" cada um deles entre si, de modo a transformar a sua parcela em algo mais belo do que a do vizinho.
Espaços de solidariedade e troca, expressão de uma vitalidade social que ainda não está perdida nas grandes cidades...
Gostei deste conceito comunitário!
sexta-feira, 18 de janeiro de 2008
Notas Soltas - CI
- Vila Ventura -
Criado com Arc Soft Panorama Maker 3
Um enorme agradecimento ao PMBC, que, há 7 meses atrás, me deixou um post muito especial no seu blog (***) sobre uma das vilas mais bonitas de Benfica... sobre a qual já aqui tinha falado (e, também, aqui).
(***) o qual só agora vi, por ter instalado uma ferramenta mais adequada para me ir mantendo updated sobre outros blogs que criêm links com o meu.
- Dª. Tina -
De costas para a porta da loja, enquanto procurava a ração para as minhas nininhas, ouvia-a entrar, protestando contra alguma coisa. Ao longe, enquanto passa, alguém diz:
- “Boa tarde Dª. Tina!”
Chegou perto do escaparate onde me encontrava, olhou para mim e perguntou-me:
- “Oh menina, sabe onde estão as pedras para gato?”
Indiquei-lhe um corredor à direita.
Passados uns breves instantes, voltou a chamar-me:
- “E sabe quais são as melhores pedras, menina?”
Olhei para ela de alto a baixo, meio de soslaio.
Dª. Tina, nos seus 60 e muitos anos, tinha um ar humilde e um pouco desleixado, apesar do seu rosto revelar um porte extremamente fino. Nos pés trazia umas sandálias abertas, que deixavam vislumbrar umas unhas enegrecidas e malsãs.
Expliquei-lhe, então, que as pedras em granulado dos sacos de 10 lts. eram as mais baratas, apesar das pedras de areia fina aglomerante em pacote de 5 lts. serem mais higiénicas e, normalmente, durarem mais do que as primeiras.
- “É para o meu gato. Ele é assim como… [breve pausa, olhando por momentos no vazio] é assim como este [aponta para um gato branco, numa embalagem na prateleira ao lado]. Só tenho um gato agora. Dantes tinha muitos… mas as pessoas viam como eles estavam bonitos e gordos e comecei a dá-los. Se calhar vou levar antes este! [apontando para o pacote de pedras mais caro]”
Digo-lhe que esse pacote custa 8€ e alguns cêntimos, ao passo que o outro é só 2€ e qualquer coisa.
- “E isto está tão mau! Está tão mau!... Saí hoje para ir cortar o cabelo [passa as duas mãos pelo seu cabelo grisalho encaracolado, alisando-o nervosamente], mas já não fui. Isto está tão mau e todos me pedem dinheiro. Outro dia emprestei 20€ a um que me pediu, porque tive pena, mas já sei que não me devolvem o dinheiro. O meu marido, que Deus o tenha em descanso [junta as duas mãos, olhando para cima, como se estivesse a rezar] não… mas o meu irmão se sabe que ando assim a tirar dinheiro do banco, vai zangar-se comigo.”
Por breves instantes, não consigo deixar de pensar que, no momento seguinte, a senhora me vai pedir para lhe pagar as pedras que quer levar. É muito triste este tipo de pensamentos passarem-nos assim pela cabeça, mas, infelizmente, é o próprio mundo em que vivemos que os propicia.
Mas Dª. Tina não me pede o que quer que seja e continua, somente, a balbuciar um infindável monólogo sobre o estado do mundo, com as lágrimas prestes a marejarem-lhe os olhos.
Sem saber muito bem o que fazer, digo-lhe para ter calma e desejo felicidades e um bom ano.
E é, então, que ela se vira para mim e diz:
- “Deixe-me dar-lhe um beijo, minha querida!”
E, num sorriso imenso mas com as lágrimas já a escorrerem-lhe timidamente pelos olhos, aproxima-se de mim, agarra-me o rosto com as suas duas mãos encarquilhadas, e dá-me um beijo na testa, como se costuma fazer às crianças.
Despeço-me e volto à minha vida… e às minhas compras.
Quando, finalmente, chego ao balcão da loja para pagar, Dª. Tina ainda está na fila à minha frente, com o seu pacote de areia para gato. Pergunta à empregada da loja qualquer coisa sobre um produto vitamínico para felinos, retira uma nota de 10€ enrolada a um cartão Multibanco de dentro do bolso das calças e, por instantes, olha para trás… e já não me reconhece.
- “O que é que eu vinha aqui comprar?” – pergunta a si própria, já depois de ter pago à empregada e de em cima do balcão, mesmo à sua frente, se encontrar o pacote de areão.
Ninguém lhe responde. Os dois jovens empregados por detrás do balcão evitam olhar para ela, como se, para além de ter perdido a razão, a senhora tivesse também ficado invisível e não estivesse ali.
Subitamente, a mente de Dª. Tina regressa ao seu corpo e ela diz…
- “Ah, era isto!” [enquanto pega no pacote em cima do balcão]
Olha outra vez para mim e parece voltar a reconhecer-me.
- “A menina também vai levar pedras?” [diz enquanto coloco os 2 sacos de ração e o pacote de pedras em cima do balcão]
Respondo-lhe que sim e sorrio para ela.
domingo, 10 de dezembro de 2006
Notas Soltas - X
- Dia Internacional dos Direitos Humanos -
Um casal de amigos meus tem em sua casa um stock de garrafas de champanhe que vai abrindo, religiosamente, de cada vez que morre um ditador no mundo.
Verdade seja dita, nos últimos anos, penso que eles não têm tido necessidade de repor o stock porque, como é bem sabido, apesar das atrocidades cometidas, esta "espécie" tem uma vida longa.
A morte de Pinochet hoje, depois de uma lenta agonia física e de longas (e infrutíferas) batalhas judiciais (levadas a cabo por todos aqueles que queriam ver reposta a justiça no caso dos desaparecimentos do Chile), precisamente, no Dia Internacional dos Direitos Humanos, não podia ser mais exemplificativa de que o destino tem estranhas formas de ser exercido.
Ou melhor, que cada um paga, nesta vida (com o sofrimento lento, apesar da justiça não ter chegado a ser executada), pelas acções que pratica e cada qual tem aquilo que merece.
Bem sei que uma humanista como eu não deveria dizer este tipo de coisas... mas há dias assim!!
- Se (eu tivesse o hábito de jogar e) me saísse o Euromilhões –
Era nesta casa que aplicaria metade do dinheiro que ganhasse!
Cada um tem os seus (estranhos) sonhos!...
Desde que nasci, sempre vivi em Benfica e não conheço outra freguesia melhor para viver do que esta (digam o que disserem os seus detractores, pois sou bairrista qb.)!
Nesta antiga região saloia, para onde vinham em tempo de férias os senhores do reino, persistiam ainda algumas casas apalaçadas que nos relembravam esses tempos ancestrais.
Quando era pequena, depois de almoço, costumava dar longos passeios com o meu avô pelas ruas e ruelas de Benfica.
E ficava sempre maravilhada e com a imaginação a funcionar a 160km/h [quem me conhece bem sabe que faço sempre grandes “filmes” na minha cabeça com o que quer que seja – tenho que deixar aqui a nota para, um destes dias, escrever sobre como tudo isso começou, em criança!], quando passávamos no meio da Rua Cláudio Nunes e via os portões daquela enorme quinta, onde sobranceira se erguia uma casa apalaçada, de onde pendiam lindíssimas flores em forma de campainhas roxas a enfeitar os muros.
No fim da Calçada do Tojal, havia também outra casa, mais pequena, que me deixava em êxtase contemplativo. Tinha um sótão que, visto assim da rua, parecia enorme e no qual me imaginava a brincar com o meu irmão.
Depois, já na Estrada de Benfica (onde hoje se situa a estação dos CTT e a loja do “Calçado Guimarães”), havia aquela magnífica casa de que todos falavam nas redondezas, mas cujas minhas lembranças já são mais ténues.
Todas elas desapareceram, qual testemunhos que teimam em ser apagados pelos enormes prédios que foram tomando os seus lugares.
Uma das últimas extinções ocorreu a meio deste ano, depois de ter tombado uma das suas torres, acabaram por deitar também abaixo o edifício do antigo Colégio Grão Vasco (ala dos rapazes), onde, em tempos mais recentes, funcionara o recinto da Praça (ou mercado) de Benfica.
Altaneira, quase no final da Estrada de Benfica (antes de chegarmos à Damaia), persiste ainda esta casa, que, em conjunto com uma outra do lado esquerdo, compõe aquilo que outrora foi a Vila Ventura (o tempo corroeu já alguma outra palavra que ficava entre estas duas e nos impede de saber o seu nome exacto).
Nesta casa ainda vive uma velha senhora que, por vezes, observo a dar comida a alguns gatos vadios que lhe aparecem no pequeno quintal fronteiriço. Ponho-me logo a pensar como será a vida daquela velha senhora, que habita uma casa de 100 divisões… onde, antigamente, deveriam existir crianças a correr de um lado para o outro, empregadas nas suas lides diárias e festas e soirées de gala… e a velha senhora, agora, ali permanece com a imensa carga de transportar sozinha todo o seu passado.
A casa do lado esquerdo (da qual, também, já aqui deixei registo fotográfico) está abandonada. Tendo, recentemente, sido apropriada a sua ala esquerda por alguns toxicodependentes da zona, para aí pernoitarem.
Na sua ala direita, pelo menos desde o Mundial de Futebol deste ano, vive um “ocupa”-anónimo de meia idade, que vislumbrei, um dia destes, a pintar cuidadosamente a janela oeil de boeuf (provavelmente da divisão onde habita) e a porta de entrada. E a casa, aparentemente devoluta, parece ganhar uma vida muito própria quando, em dias de jogo do Sport Lisboa e Benfica, vemos hasteada na pequena janela redonda a sua bandeira, ou, quando se aproxima o Natal, e as iluminações também lá aparecem, colocadas na pequena janela. E eu e a minha imaginação acelerada ficamos sempre a fantasiar mil e uma histórias a propósito daquele estranho que ocupou, apenas, aquela pequena divisão da casa da Vila Ventura.
E, como nada mais há a fazer do que imaginar (porque os seus proprietários ou o próprio Estado não estão interessados em recuperar a Vila Ventura nem todas as outras casas apalaçadas que existam por Benfica e arredores... a menos que isso lhes traga alguma contrapartida financeira)... hoje apeteceu-me deixar aqui um breve registo sobre a casa dos meus sonhos que, mais dia menos dia, desaparecerá também!...
- A Lua feita em pedaços -
Esta noite...