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segunda-feira, 16 de novembro de 2020
domingo, 6 de setembro de 2020
A vida, tão boa que é.
Rita,
então tu julgavas que eu não ia ver o filme que me deste? Pois vi, e vi ontem, parva. O êxtase
é muito, e aqui o partilho. Muchos hijos,un mono y un castillo foi das coisas mais divertidas e comoventes que me
entraram pelo espírito nos últimos e confinados meses. O filme, um documentário rodado por
Gustavo Salmerón durante 14 anos (será possível?), tem uma protagonista
hegemónica, retumbante e esmagadora: a sua mãe. Julita Salmerón, assim se chama
o portento (numa das entrevistas a propósito do filme, o realizador diz que o
pai é também co-protagonista, mas coitado dele). Bigger than life, telúrica, torrencial o que quiserem, Julita Salmerón é
Espanha por uma pena (o filme, aliás, começa com ela a beber chocolate quente e a comer bolachas, melhor era impossível). Depois, subimos por ali acima – muitos filhos,
um macaco, um castelo – e descemos em voo picado até à crise de 2008 e à hipoteca
devastadora. Uma montanha-russa emocional trazida com imensa mestria por Gustavo
Salmerón, sobre a qual choveram prémios atrás de prémios, todos mais que
merecidos. Está ali Espanha inteira, em casas atafulhadas de objectos (morte a ti, Marie Kondo!), cada
qual trazendo uma recordação da vida de uma mulher poderosa – ou, como lá
dizem, tremenda. Sobre o filme
choveram prémios. É bom que sobre ele também chova a sua atenção. Quando um
documentário nos faz rir e chorar, em doses variáveis, talvez a culpa seja
nossa – porque o documentário, esse, é perfeito e sem mácula. Quanto a ti,
Rita: obrigado, dos abismos do meu coração.
sábado, 8 de fevereiro de 2020
sexta-feira, 2 de agosto de 2019
quarta-feira, 17 de julho de 2019
sábado, 11 de maio de 2019
segunda-feira, 3 de dezembro de 2018
A Dama de Elche e as restituições selectivas.
Sempre
que estou em Madrid e posso, vou ver a Dama de Elche (e a sua formiga!). Por se conservar bonita e
fresca, pese ser já muito idosa, do século IV antes de Cristo. Sobretudo, por
dela irradiar uma estranha e fascinante serenidade. Vê-la, acalma, arqueológico
ansiolítico. Até Himmler a admirou:
A
Dama foi levada para França nos finais do XIX e só foi devolvida a Espanha pelo
governo de Vichy, já nos anos 1940 (mais precisamente, em 1941). Desde então,
foi ícone do franquismo (no Museu de Valência, havia uma cópia encimada pelo
símbolo da Falange…), mas é muito mais do que isso, graças a Deus. Um livro
recente traça-lhe a trajectória completa. Chama-se o livro: La Dama de Elche. Dónde, cuándo y por qué.
A sua autora, Carmen Aranegui Gascó, é catedrática emérita da Universidade de
Valência. Defende a sua Dama com unhas e dentes, contra-atacando com galhardia
os que – canalhas! – ousaram pôr em dúvida
a autenticidade do vetusto busto, como um tal John F. Moffitt. O livro é uma
delícia, leiam-no. A dado passo, Carmen Gascó recorda e lamenta que em 1997,
por ocasião do centenário do descobrimento da Dama, o Museu Arqueológico
Nacional (MAN) se recusou emprestar a peça ao município de Elche, onde a
senhora residiu durante séculos e séculos antes de ir para Madrid. Aí jaz e repousa,
imobilizada em cristal bem grosso. Foi para lá levada em 1972, transportada de
táxi (!) do Museu do Prado para o MAN e, para exaltação da hispanidad, o camponês que, em criança, presenciara o descobrimento
da Dama foi também levado a Madrid, para a admirar – e ser fotografado em
testemunho da sua autenticidade nacional.
Vem
isto a propósito das notícias sobre a restituição das peças de arte das antigas
colónias francesas. A instâncias do Presidente Macron, foi elaborado um extenso
relatório, da autoria de Bénedicte Savoy, historiadora de arte, e de Felwine
Sarr, escritor e economista senegalês. O relatório foi publicado em livro há uns dias, pelas Éditions du Seuil, e convém ler as suas 232 páginas antes de
opinar em profundidade. Mas, das notícias que vão chegando, por exemplo no Le Monde (e editorial, aqui), pode estar a abrir-se uma
caixa de Pandora, com resultados imprevisíveis. O princípio de justiça e
reparação moral que lhe subjaz – e que, podendo ser louvável, merece uma
discussão ponderada e serena – aplica-se a todos, Egipto, Espanha, Portugal,
etc., não se percebendo como se pode ser selectivo nesse domínio, restringindo
as restituições à África subsaariana, numa espécie de moralidade à la carte. O Egipto, claro, já veio reclamar
o seu quinhão, e há uma campanha em curso, liderada pelo arqueólogo Zahi Hawass.
Num país que teve um imperador-pilhador como Napoleão – e, note-se, uma atenção
precoce à conservação das antiguidades e das obras de arte de outros países – tudo
isto pode ter efeitos desastrosos. Como ficará a diplomacia e a política
externa francesas se devolverem coisas a uns e as recusarem a outros? E não poderão
os museus da província reclamar também peças que, devido a uma política
centralizadora de muitas décadas, foram levadas para Paris? Muitas
interrogações, muitas. Mas uma certeza, algo egoísta: se a Dama de Elche saísse
de Madrid, eu deixaria de a ver, como sempre sucede quando vou a Espanha. Se as
70 mil peças de arte africana que estão no Museu do Quai Branly saírem de lá,
deixaremos de as ver – e muitas delas correrão maiores riscos de desaparecerem e
se esfumarem para sempre. Aquilo que as conservou foi justamente o facto de
terem sido pilhadas e roubadas, o que não deixa de ser paradoxal ou irónico.
Como irónico é o facto de, sob um aparente «universalismo», se esquecer o valor
universal destas peças, património da Humanidade, fazendo-as ceder à mesma
lógica nacionalista que agora, neste preciso instante, divide a França e a Itália a propósito de Leonardo da Vinci. E também irónico e paradoxal é o facto de as
vanguardas, outrora vocacionadas – e bem – para o futuro, se concentrarem cada
vez mais no passado e na memória, numa espécie de progressismo retroactivo que talvez seja sinal da sua falência enquanto
projecto de transformação do mundo.
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quinta-feira, 22 de novembro de 2018
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