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fevereiro 27, 2008

A tua morte é sempre nova em mim.
Não amadurece. Não tem fim.
Se ergo os olhos dum livro, de repente
tu morreste.
Acordo, e tu morreste.
Sempre, cada dia, cada instante,
a tua morte é nova em mim,
sempre impossível.

E assim, até à noite final
Irás morrendo a cada instante
da vida que ficou fingindo vida.
Redescubro a tua morte como outros
descobrem o amor,
porque em cada lugar, cada momento,
tu estás viva.

Viverei até à hora derradeira a tu morte.
Aos goles, lentos goles. Como se fosse
cada vez um veneno novo.
Não é tanto a saudade que dói, mas o remorso.
O remorso de todo o perdido em nossa vida,
coisas de antes e depois, coisas de nunca,
palavras mudas para sempre, um gesto
que sem remédio jamais teve destino,
o olhar que procura e nunca tem resposta.

O único presente verdadeiro é teres partido.


excerto do poema A TUA MORTE EM MIM, de Adolfo Casais Monteiro

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janeiro 25, 2008

Inútil Paisagem 


Mas pra quê

Pra que tanto céu
Pra que tanto mar, pra quê

De que serve esta onda que quebra
E o vento da tarde
De que serve a tarde
Inútil paisagem

Pode ser
Que não venhas mais
Que não voltes nunca mais

De que servem as flores que nascem
Pelos caminhos
Se o meu caminho
Sozinho é nada



Recordando António Carlos Jobim e Elis Regina, também nesta preciosidade

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janeiro 21, 2008

fragmentos da (puta de) vida 



Nada me prende a nada.
Quero cinquenta coisas ao mesmo tempo.
Anseio com uma angústia de fome de carne
O que não sei que seja -
Definidamente pelo indefinido…
Durmo irrequieto, e vivo num sonhar irrequieto
De quem dorme irrequieto, metade a sonhar.

Fecharam-me todas as portas abstractas e necessárias.
Correram cortinas de todas as hipóteses que eu poderia ver da rua.
Não há na travessa achada o número da porta que me deram.

Acordei para a mesma vida para que tinha adormecido.
Até os meus exércitos sonhados sofreram derrota.
Até os meus sonhos se sentiram falsos ao serem sonhados.
Até a vida só desejada me farta - até essa vida…

Compreendo a intervalos desconexos;
Escrevo por lapsos de cansaço;
E um tédio que é até do tédio arroja-me à praia.
Não sei que destino ou futuro compete à minha angústia sem leme;
Não sei que ilhas do sul impossível aguardam-me naufrago;
ou que palmares de literatura me darão ao menos um verso.

Não, não sei isto, nem outra coisa, nem coisa nenhuma…
E, no fundo do meu espírito, onde sonho o que sonhei,
Nos campos últimos da alma, onde memoro sem causa
(E o passado é uma névoa natural de lágrimas falsas),
Nas estradas e atalhos das florestas longínquas
Onde supus o meu ser,
Fogem desmantelados, últimos restos
Da ilusão final,
Os meus exércitos sonhados, derrotados sem ter sido,
As minhas cortes por existir, esfaceladas em Deus.

Outra vez te revejo,
Cidade da minha infãncia pavorosamente perdida…
Cidade triste e alegre, outra vez sonho aqui…

Eu? Mas sou eu o mesmo que aqui vivi, e aqui voltei,
E aqui tornei a voltar, e a voltar.
E aqui de novo tornei a voltar?
Ou somos todos os Eu que estive aqui ou estiveram,
Uma série de contas-entes ligados por um fio-memória,
Uma série de sonhos de mim de alguém de fora de mim?

Outra vez te revejo,
Com o coração mais longínquo, a alma menos minha.

Outra vez te revejo - Lisboa e Tejo e tudo -,
Transeunte inútil de ti e de mim,
Estrangeiro aqui como em toda a parte,
Casual na vida como na alma,
Fantasma a errar em salas de recordações,
Ao ruído dos ratos e das tábuas que rangem
No castelo maldito de ter que viver…

Outra vez te revejo,
Sombra que passa através das sombras, e brilha
Um momento a uma luz fúnebre desconhecida,
E entra na noite como um rastro de barco se perde
Na água que deixa de se ouvir…

Outra vez te revejo,
Mas, ai, a mim não me revejo!
Partiu-se o espelho mágico em que me revia idêntico,
E em cada fragmento fatídico vejo só um bocado de mim -
Um bocado de ti e de mim!…

Álvaro de Campos

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janeiro 16, 2008

CouchSurfing 4 Homeless 

Sé de Lisboa, uma noite igual a tantas noites destes deserdados


A memória não ajuda a reter
aquele vulto, a luz que desespera
além no escuro.
Já tudo se apagou
e nada importaria se salvasse
a emoção do viver,
pois sei que existi
naquele território donde fui retirado
porque chegou aquele tempo
que era já somente, em sucessão de mármore,
o espaço defunto de um presente.

E o que se apagou não existe já nos olhos
do que na esquina está
à espera que volte o transeunte
que antes passou ali, e ali ficara.
Buscai no prato as moedas,
eu não as posso ver.
Estou aqui por elas, e não interessam.


poema "O Mendigo do Extinto", de Francisco Brines

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dezembro 26, 2007

North Sea evening sketches 

Viagem


Aparelhei o barco da ilusão
E reforcei a fé de marinheiro.
Era longe o meu sonho, e traiçoeiro
O mar…
(Só nos é concedida
Esta vida

Que temos;
E é nela que é preciso
Procurar
O velho paraíso
Que perdemos).



Prestes, larguei a vela
E disse adeus ao cais, à paz tolhida.
Desmedida,
A revolta imensidão
Transforma dia a dia a embarcação
Numa errante e alada sepultura…
Mas corto as ondas sem desanimar.
Em qualquer aventura,
O que importa é partir, não é chegar.



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dezembro 22, 2007

bom fim-de-semana 

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dezembro 10, 2007

A Dama e o Vagabundo 


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dezembro 08, 2007

Derivado da Questão* entre a Avenida e o Rossio... 

Há arraial Campo Pequeno! Pelo menos durante o fim-de-semana, o Circo de Feras promete ser grande entretenimento.








*A Câmara de Lisboa certamente deve ter uma explicação para o apagão desde a Avenida da Liberdade até ao Rossio. Qualquer especialista em contas de mercearia, arranjava uma dúzia de soluções para evitar que as verbas destinada à Iluminação de Natal servissem para pagar dívidas. Que tristeza!

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dezembro 03, 2007

Intuição de um agnóstico 



Deus sive Natura

Perguntava-me hoje a minha filha, ao ver esta imagem, se Deus me tinha aparecido. O que leva uma menina que não teve educação religiosa a colocar a questão nestes termos?
Talvez porque é nesta natureza de Deus que encontramos a nossa espiritualidade.

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novembro 30, 2007

À Sombra da Luz 



nos meus pensamentos sempre as palavras lutam duas a duas pela verdade
palavras se metem dentro de outras palavras querendo ideias
sou uma caixa de vários lados com vários cantos com duas sombras
uma escura que nasce da clara outra clara que nasce da escura
a luz cintila e a sombra dorme a sombra estatela-se e a luz ergue-se
nasce cada palavra dentro de outra palavra



Fernando Lemos

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novembro 29, 2007

Método Isopático 


[...]
Que delírios estrebuchavam os nossos corpos doidos... como eu me sentia pouca coisa quando ela se atravessava sobre mim, iriada e sombria, toda nua e litúrgica...
caminhava sempre aturdido do seu encanto - do meu triunfo.
Eu tinha-a! Eu tinha-a!... E erguia-se tão longe o meu entusiasmo, era tamanha a minha ânsia que às vezes - como os amorosos baratos escrevem nas suas cartas romanescas e patetas - eu não podia crer na minha glória, chegava a recear que tudo aquilo fosse apenas um sonho.
[...]


in A Confissão de Lúcio, de Mário de Sá-Carneiro
Madona fotografada por Helmut Newton para a VanityFair

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outubro 12, 2007

lúcida transitoriedade 

Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlaçemos as mãos).

Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para o pé do Fado,
Mais longe que os deuses.

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente.
E sem desassossegos grandes.


Ricardo Reis

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setembro 25, 2007

Lisbon by night 

vista da Baixa



Largo de Camões



Basílica da Estrela



Basílica da Estrela, pormenor

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setembro 07, 2007

impressões da World Press Photo 

Per-Anders Pettersson, Suécia - Getty Images, para a Stern

3º Prémio, "Assuntos Actuais" (fotografia singular)

Esther Yandakwa ( 9 anos de idade ) fuma um cigarro enquanto as suas amigas a ajudam a pentear-se, no centro de Kinshasa, na República Democrática do Congo.
Esther não tem casa e prostitui-se.
Dezenas de milhar de pequenos refugiados, órfãos de guerra e crianças abandonadas pelas suas famílias vivem nas ruas de Kinshasa e outras áreas urbanas do país.




Jan Grarup, Dinamarca - Politiken/Newsweek

2º Prémio, "Notícias em Geral" (fotografia singular)

Em Novembro de 2006, deslocados aguardam que lhes sejam distribuidos alimentos, perto da aldeia de Habile, no Chade. Ataques por parte da Janjaweed, uma milícia árabe supostamente apoiada pelo governo sudanês, alastraram desde Darfur, no Sudão, atravessando a fronteira até ao Chade. Cavaleiros da Janjaweed incendiaram as aldeias de agricultores negros em ambos os lados da fronteira, matando e violando os seus habitantes, segundo um modelo de violência étnica que têm seguido desde 2003.




José Cendón, Espanha - France Presse

1º Prémio, "Assuntos Actuais" (reportagem)

Na conflituosa região africana dos Grandes Lagos, onde os cuidados de saúde em geral enfrentam grandes desafios, os recursos psiquiátricos são particularmente raros. Os traumatizados pela guerra têm de partilhar uma mão-cheia de hospitais psiquiátricos com várias outras vítimas de problemas mentais.
O hospital psiquiátrico de Kamenge em Bujumbura, no Burundi, é o único do país que trata pessoas com traumas de guerra. Recebe financiamento da Igreja, mas os pacientes têm de contribuir com dinheiro para medicamentos e comida.





Akintunde Akinleye, Nigéria - Reuters

1º Prémio, "Notícias em Destaque" (fotografia singular)

Um homem lava a fuligem do rosto no local da explosão de um oleoduto em Lagos, Nigéria.
Pelo menos 260 pessoas morreram após o oleoduto perfurado se ter incendiado. A perfuração tinha sido feita por ladrões para encher tanques de petróleo para revenda, e centenas de residentes na zona tinham ido ao local para apanhar em recipientes de plástico o combustível que se derramava.
Apesar de a Nigéria ser o oitavo exportador mundial de petróleo, a maioria da população vive em pobreza extrema.

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agosto 09, 2007

O Reino que será dos que queiram merecê-lo... 

No centenário do seu nascimento (no próximo dia 12), impõe-se uma visita ao Reino que Torga testemunhou, embora muitas pessoas digam que não.
Para percorrer as terras por si enaltecidas, tentei que os meus olhos não perdessem a virgindade original diante desta realidade. Foi sem hesitação que lá deixei o coração, o que quase me ia sendo fatal. A 27, dia do nascimento de meu pai, espero voltar ao Vale Encantado.
Os textos em itálico pertencem a Um Reino Maravilhoso, os restantes textos foram retirados daqui. As imagens são minhas.



Os sabores da terra

A oferta gastronómica não se assume como simples curiosidade regional, mas como verdadeira expressão dos hábitos e costumes transmontanos, que brota da força fertilizante da terra e do viço das árvores.


Mas a terra é a própria generosidade ao natural. Como num paraíso, basta estender a mão. Produz batata, azeite, cortiça e linho. Batata farinhuda, que se desfaz na boca; azeite loiro, que sai em luz da almotolia; cortiça que deixa os sobreiros nus para agasalhar os enxames; e linho fresco, fino, que, tecido em lençóis, faz o bragal das noivas.
De figos, nozes, amêndoas, maçãs, pêras, cerejas e laranjas nem vale a pena falar. São mimos dum pomar variegado, que nenhuma imaginação descreve quando a primavera estala nos ramos.





O pão é o alimento apreciado na mesa transmontana, mas que, desde o lançamento da semente à terra, da sua colheita, da malhada até ao ritual da cozedura, revela o trabalho árduo do homem feito camponês:

Não se vê por que maneira este solo é capaz de dar pão e vinho. Mas dá. Pão de milho, de centeio, de cevada e de trigo. Pão integral. Por ser pão e por ser amassado com o suor do rosto. Sabe a trabalho. Mas é por isso que os naturais o beijam quando ele cai no chão...





Festas/S. Martinho

Algumas festividades implicam manjares próprios das comemorações dos respectivos oragos ou patronos. É o caso do dia de S. Martinho, cujas celebrações são festejadas com "magustos" de castanhas e vinho.


Mas o fruto dos frutos, o único que ao mesmo tempo alimenta e simboliza, cai dumas árvores altas, imensas centenárias, que, puras como vestais, parecem encarnar a virgindade da própria paisagem. [...] a castanha. Assada, no S. Martinho, serve de lastro à prova do vinho novo. Cozida, no Janeiro glacial, aquece as mãos e a boca de pobres e ricos. Crua, engorda os porcos, com a vossa licença...





O Vinho e a Vinha

O vinho de moscatel, de alvarelhão, de penaguiota, de malvasia fina, o "vinho do Porto", que seguia, em tempos idos, em barcos rabelos até à zona ribeirinha do Porto e de Gaia, tem a sua expressão máxima nas encostas xistosas do Douro.


Nas margens de um rio de oiro , crucificado entre o calor do céu que de cima o bebe e a sede do leito que de baixo o seca, erguem-se os muros do milagre. Em íngremes socalcos , varandins que nenhum palácio aveza, crescem as cepas como os manjericos às janelas. No Setembro, os homens deixam as eiras da Terra-Fria e descem, em rogas, a escadaria do lagar de xisto. Cantam, dançam e e trabalham. Depois sobem. E daí a pouco há sol engarrafado a embebedar os quatro cantos do mundo.

Matança do porco

A matança do porco e o fumeiro, como uma festividade doméstica, encontram-se entre os costumes que Miguel Torga mais vezes relata. Não apenas como espectador, mas como participante activo dessa tradição secular da sua aldeia.


É destes que se tem de partir para chegar à trindade tradicional do reino: os presuntos, as alheiras e os salpicões.
Por alturas do Natal, começa a matança. Ao romper da manhã, a paz de cada povoado é subitamente alarmada. Um grito esfaqueado irrompe do silêncio. Dias depois desmancha-se a bisarma, e um pálio de fumeiro cobre a lareira.
Quem não comeu ainda desses manjares ensacados, prove... E há-de encontrar neles o sabor das invernadas passadas ao borralho enquanto a neve cai, o perfume das graças dadas por alma daqueles que Deus tem, a magia da história de João de Calais contada aos filhos, e uma ciência infusa de temperar, que vem desde que a primeira nau chegou à Índia.





A Paisagem Humana

A realidade transmontana está associada a factores que exercem influência na singularidade das atitudes e da cultura do homem montanhês. Este, tal como Miguel Torga o canta, está habituado ao isolamento morfogeológico e crente só em si na luta pela sobrevivência, assume-se como entidade autóctone, dotada de notável robustez, de grande coragem, de sentimento granítico e de espírito aberto, franco e solidário com seus irmãos.


Homens de uma só peça , inteiriços, altos e espadaúdos, que olham de frente e têm no rosto as mesmas rugas do chão. Castiços nos usos e costumes, cobrem-se com varinos, croças e mais roupas de serrobeco ou de colmo, e nas grandes ocasiões ostentam uma capa de honras, que nenhum rei! [...] Bata-se a uma porta, rica ou pobre, e sempre a mesma voz confiada nos responde:
--Entre quem é!
Sem ninguém a perguntar mais nada, sem ninguém vir à janela espreitar, escancara-se a intimidade duma família inteira. O que é preciso agora é merecer a magnificência da dádiva.





Trás-os-Montes

O território torguiano, como o poeta tão bem trasladou em forma de letra para a sua obra, é todo o Portugal, e é ainda a Ibéria. Neste roteiro é, no entanto, obrigatório delimitar, nesta vastidão espacial, as principais fronteiras. Eis Trás-os-Montes.


A autoridade emana da força interior que cada qual traz do berço. Dum berço que oficialmente vai de Vila Real a Montalegre, de Vinhais a Bragança, de Bragança a Miranda, de Miranda a Freixo, de Freixo à Barca de Alva, da Barca à Régua e da Régua novamente a Vila Real, mas a que pertencem Foz Côa, Meda, Moimenta e Lamego - toda a vertente esquerda do Doiro até aos contrafortes do Montemuro, carne administrativamente enxertada num corpo alheio, que através do Côa, do Távora, do Torto, do Varosa e do Balsemão desagua na grande veia cava materna as lágrimas do exílio.
Um mundo! Um nunca acabar de terra grossa, fragosa, bravia, que tanto se levanta a pino num ímpeto de subir ao céu, como se afunda nuns abismos de angústia, não se sabe por que telúrica contrição.

Terra-Quente e Terra-Fria. Léguas e léguas de chão raivoso, contorcido, queimado por um sol de fogo ou por um frio de neve. Serras sobrepostas a serras. Montanhas paralelas a montanhas. Nos intervalos, apertados entre os lapedos, rios de água cristalina, cantantes, a matar a sede de tanta aridez. E de quando em quando, oásis da inquietação que fez tais rugas geológicas, um vale imenso, dum húmus puro, onde a vista descansa da agressão das penedias.

Veigas que alegram Chaves, Vila Pouca, Vilariça, Mirandela, Bragança e Vinhais.
Mas novamente o granito protesta. Novamente nos acorda para a força medular de tudo. E são outra vez serras, até perder de vista.

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agosto 07, 2007

Para que não esqueçamos 

Isto de estar (mal) habituado a ter tudo à mão só porque se vive na capital do império...
Este ano, quem quiser ver a World Press Photo, tem até domingo para ir a Portimão. Hélàs!




A foto vencedora deste ano é do repórter fotográfico norte-americano Spencer Platt que, num artigo publicado na Visão da semana passada, nos deixa alguns tópicos para reflexão.

Qualquer boa foto deve contar uma história e ser universalmente compreendida pelas várias culturas. Platt chama a atenção para a dificuldade de - nos dias de hoje - as imagens fazerem as pessoas pensar; Não só pela facilidade com que hoje se faz um boneco, como também para a introdução do vídeo nos trabalhos de foto-reportagem.
E que devemos manter e alimentar a curiosidade pelo mundo.
Eu acrescentaria, a esperança na humanidade...

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junho 20, 2007

Postais de Portugal - Algarve 

Ferragudo, Portimão


alguns ditades algarvies

Cô brutes na lutes

Amigue nempata amigue

Ades crer e na`des ter



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junho 06, 2007

finalmente, a descoberta do silêncio 




O silêncio

Dos corpos esgotados que silêncio
tão apaziguador se levantava!

(Tinha uma rosa triste nos cabelos,
uma sombra na túnica de luz...)

Para o fundo das almas caminhava,
devagar, o sonâmbulo silêncio.

(Que apertados anéis nos braços nus!)

Mas o silêncio vinha desprendê-los.


David Mourão-Ferreira

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maio 25, 2007

sem fuga possível, deixa-te ir na corrente... 

Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto tão perto tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura

Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco



Mário Cesariny

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abril 23, 2007

Postais de Lisboa - Rossio 

Ai! Meu rico menino!

Menino António cumpre o ritual de dar milho aos pombos.
Em criança, a gente presta-se a cada coisa...!

Autor desconhecido, 1962

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