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25 abril 2014

25 de Abril, sempre!


Eu era apenas um ano e tal de gente, pequena demais para me aperceber quando o 25 de Abril aconteceu.
Não sabia que o meu pai tinha ido para Lisboa, em busca dos acontecimentos que as notícias diziam revolucionários. A minha mãe, em casa comigo, receava pelo que pudesse acontecer, temendo um volte-face na situação, mesmo alguma escaramuça...
A minha memória dos 25 de Abril subsequentes prende-se com aquele brilho no olhar dos meus pais, com as manif's, com as canções de Abril que me fazem vibrar cá dentro as cordas da emoção e me convocam ao olhar as lágrimas cúmplices dum coração que estremece.
Esta é, para mim, a data. Marca-me de tal forma que a escolhi para criar o Escrito a Quente, há sete anos.
Porque a liberdade é essencial à vida, como escrever se tornou essencial para os meus dias.

05 maio 2013

Mãe



Foi teu o ventre que me alojou
Foram tuas as dores que me pariram
Foi na tua que a minha vida começou
Foram teus os primeiros olhos que os meus viram

Foi nos teus braços o primeiro embalo
Foi teu o carinho que alimentou
Cada dia deste amor que não calo,
Cada traço daquilo que hoje sou

Foram anos de aprendizagem e ternura,
Histórias, sorrisos, tristezas, alegrias,
De um percurso de amor que tudo cura:
Dores, lágrimas, incertezas, melancolias.

10 janeiro 2013

Acidente


A chuva pingava o dia num compasso lento, nesse Outono de 1947.
As ruas do Porto apresentavam-se quase desertas, à excepção dos grupos de meninos que diariamente enchiam os bairros numa brincadeira que se estendia até à janta.
Vestiam calções puídos e camisolas desbotadas. Uns calçados, outros descalços, brincavam às apanhadas, faziam estafetas, competições de berlinde. Corriam atrás de bolas, feitas à mão com velhas meias de senhora.
Os dias escoavam-se sem história, em jogos que se repetiam, amizades infantis no bairro das Antas. Tanto lhes dava para roubar fruta nas árvores próximas - para satisfazer os défices dos estômagos revoltos - como para desatarem a correr como se as forças nunca lhes fossem faltar e o mundo estivesse para acabar.
Podia ter acabado para Rui naquela tarde.
O carro surgiu, galgando terreno desalmadamente numa velocidade excessiva para a Av. Fernão de Magalhães. Só deram por ele quando os travões produziram aquela chiadeira assustadora de quem se depara com o perigo demasiado tarde.
Bonc! Um estrondo de colisão, um miúdo que voa, projectado pelo impacto do acidente.
Os amigos afluíram num ápice para ver como Rui se encontrava. A queda fora aparatosa, o embate bastante forte. Ele, só se apercebeu do sucedido uns momentos depois. Fora tudo demasiado rápido, sobretudo inesperado. O mundo de pernas para o ar, a respiração suspensa, a compreensão toldada.
As dores só viriam mais tarde. Muito depois de se ter levantado, amparado pelos outros miúdos. Muito depois de ter recusado a oferta que o condutor lhe fizera, levá-lo ao hospital. No seu susto, a ingenuidade falou mais alto e ditou-lhe que não aceitasse. Temia pela descompostura que a mãe lhe infligiria se suspeitasse do sucedido. Que, naquele tempo, o receio da ira materna era o maior dos males para quem só esperava um dia após o outro, numa eterna brincadeira de rua despreocupada, apenas ensombrada por um ou outro momento de fome…

(este conto baseia-se numa história que o meu pai me contou, que ele próprio protagonizou em criança)

31 agosto 2012

No aniversário da Patrícia (volto a publicar)



Este ano, no aniversário da Patrícia, o estrondo de uma bala sobrepõe-se ao estampido do soltar da rolha de espumante. Pouco mais de um mês antes do seu aniversário, um tiro, meio a brincar, veio roubar-lhe o marido, pai do filho que espera (e não só), e trazer-lhe um desgosto, bem sério. Quem a vê, vê uma mulher bonita e nada mais.
Eu, vejo a menina que com 6 anos dormia ainda na minha cama de bebé, quando vinha passar férias à minha casa com as irmãs. Vejo a Patrícia que se apressavaa a responder, de rajada, quase zangada: "sopinha de canja", à nossa mania de a rotularmos de "sopinha de massa", devido à sua maneira de pronunicar os "s".
A menina dócil que conseguia ganhar as corridas, mesmo a quem tinha mais 5 anos que ela, foi-se tornando uma rapariga linda, empenhada em ajudar nas tarefas domésticas e na criação dos irmãos. Terceira filha dum casal que gerou oito, cedo a adolescente se tornou mulher, assumindo as responsabilidades caseiras e familiares com uma naturalidade que só ela conseguia. Os três benjamins são, em grande parte, produto dos seus cuidados e razão do abandono mais que precoce dos interesses escolares.
Ironia da vida, a Patrícia acaba por integrar a estatística das mães adolescentes, tão típica deste país, ela que apregoava não querer ter de cuidar de meninos tão depressa.
Quem a vê, não descortina a imagem da minha lembrança: a de uma menina tão linda que o olhar se detém sempre a apreciar o rosto harmonioso, moldado por um cabelo bonito, escuro e liso, invariavelmente comprido, olhos amendoados, lábios sorridentes vizinhos dum nariz suave, bem desenhado.
Quem a vê, se não a conhece, não vê aquela não Amélia, mas Patrícia "dos olhos doces, quem dera que fosses apenas mulher", como eu vejo. Como eu gostaria que fosse apenas mulher, e não a jovem cuja vida se apressou em correr mais depressa que ela própria quando pequenita. A mãe de três filhos, com um quarto bebé em desenvolvimento, numa gestação paralela à morte do pai. Uma gravidez casada com um rendimento mínimo. Desemprego é o termo mais generalizado na família: além da própria Patrícia, aplica-se à maioria dos sete irmãos, aos próprios pais.
Viúva em vésperas da terceira década de vida.
Basta repararmos na vida desta miúda para constatarmos o que, de tão evidente, não costuma ocorrer-nos: que é tão fácil ser-se feliz...
Acredito que nem tudo na vida é consequência das nossas opções.
E acredito que, um dia, as feridas da Patrícia serão cicatrizes cuja dor foi tratada pelo amor dos seus quatro filhos. Acredito ainda que, daqui por uns tempos, em vez da Amélia, do Carlos Mendes, a minha sobrinha me faça recordar a Mãe-coragem, do Brecht.


(A Patrícia, não obstante ser da minha faixa etária, é minha sobrinha. Recordo-a em todos aqueles pormenores da infância que fazem com que ela seja, como as suas irmãs, uma miúda, mesmo após décadas decorridas sobre a meninice: as preferências culinárias, os hábitos na hora de ir dormir, as brincadeiras.)

23 dezembro 2011

Feliz Natal



Neste Natal gostaria que fosse realmente Natal,
Nada a deturpar o espírito de dedicação,

Uma luz acendendo-se em cada um de nós,

E ali permanecendo, estação após estação.


Porque...

... Se o Natal fosse realmente dádiva, seria sensibilidade,

... Se o Natal fosse realmente festa, seria família;

... Se o Natal fosse realmente amor, seria partilha,

... Se o Natal fosse realmente Natal, seria poesia.


(a todos, sem exceção, desejo um Natal feliz e tudo de bom, nesta quadra e sempre)

23 julho 2011

18 julho 2011

Nélson Mandela completa hoje 93 anos de uma vida totalmente consagrada à afirmação da dignidade humana e à luta contra a opressão racial na África do Sul.
Uma vida de luta contra a desiguadade, motivada pela esperança e pelo espírito combativo que, finalmente, o conduziu ao Prémio Nobel da Paz e à presidência do seu país.
Em homenagem a este lutador incansável, deixo as suas próprias frases, extraídas da obra autobiográfica Longo Caminho para a Liberdade:

“Eu não nasci com fome de liberdade. Nasci livre- livre de todas as formas minhas conhecidas. Livre para correr pelos campos perto da cabana da minha mãe, livre para nadar no ribeiro claro que atravessava a vila, livre para assar milho sob as estrelas e montar na garupa larga de toiros vagarosos. Enquanto obedecesse ao meu pai e respeitasse os costumes da minha tribo, não me incomodava com as leis do homem ou de Deus.
Foi só quando comecei a aperceber-me que a minha liberdade de criança era uma ilusão, quando descobri, como jovem, que a minha liberdade já me fora tirada, que comecei a ansiar por ela. (…)
Mas, então, comecei lentamente a ver que não só não era livre, mas também os meus irmãos e as minhas irmãs não o eram. Vi que não era só a minha liberdade que era limitada, mas a liberdade de todos os que se pareciam comigo. Foi quando me inscrevi no Congresso Nacional Africano e foi quando a minha grande fome de liberdade para mim próprio se transformou na maior sede de liberdade para o meu povo. Foi este desejo de que o meu povo tivesse a liberdade de viver a sua vida com dignidade e auto-respeito que motivou a minha vida, que transformou um jovem assustadiço numa pessoa audaz, que levou um advogado respeitador da lei a transformar-se num criminoso, que fez de um marido amigo da família um homem sem lar, que forçou um homem que amava a vida a viver como um monge. Eu não sou nem mais virtuoso, nem mais abnegado do que qualquer outra pessoa, mas descobri que não conseguia nem sequer desfrutar das liberdades mesquinhas e limitadas que me eram permitidas, sabendo que o meu povo não era livre. A liberdade é indivisível. (…)
Foi durante esses longos anos solitários que a minha fome de liberdade para o meu povo se transformou na fome de liberdade para todos os povos, brancos e negros. (…)
A verdade é que não somos ainda livres; alcançámos apenas a liberdade de sermos livres, o direito a não sermos oprimidos. Não demos o último passo da nossa viagem, mas sim o primeiro de uma estrada ainda mais comprida e difícil. Pois ser livre não é somente arredar as correntes, mas viver de uma forma que respeite e realce a liberdade dos outros. O verdadeiro teste da nossa dedicação à liberdade está a começar.
Percorri esse longo caminho para a liberdade. Tentei não fraquejar; dei passos errados ao longo do percurso. Mas descobri o segredo: que, depois de escalar uma grande montanha, apenas se descobre que há muitas mais montanhas para subir. Parei aqui um pouco para descansar, para deitar uma olhada à vista maravilhosa que me rodeia, para olhar para a distância, de onde vim. Mas posso descansar somente por um momento, porque com a liberdade vêm as responsabilidades- e não me atrevo a demorar-me, pois a minha caminhada ainda não terminou.”

16 novembro 2009

Há dois anos a manhã acordou assim

















e eu fiquei deslumbrada ao abrir as portadas.
Um dia colorido, logo ao amanhecer, é prenúncio de boa disposição.
Agora, Novembro já não tem estes tons, eu já não tenho aquelas portadas
e o céu perdeu a poesia...

26 maio 2009

Há dois anos foi assim

Ainda bem que aqui estás. Senta-te aqui, junto a mim.
Tenta não me julgar.
Hoje, só nós.
Conversemos. Há tanto tempo que adiamos esta conversa...
Com um café estaremos melhor. Trago dois da cozinha e um pratinho com bolachas. O aroma do café traz-me uma sensação de reconforto e bem-estar quase incomparável.
Podemos ficar horas, tens todo o tempo para mim? Excelente! É que estou em cacos, e os cacos levam muito tempo a juntar. E, já se sabe, nunca ficam 100% como antes.
Estou assim, carente de tudo. Considera-me a planta mais sensível da tua estufa. Enche-me de atenções. Ouve, diz, pergunta, conta. Segura-me bem. Transporta-me cuidadosamente, leva-me para um porto de abrigo secreto. Envolve-me em atenções.
Senta-te ao piano e toca para mim. Lê-me um poema; melhor: escreve um poema para mim.
Ajeita-me a melena que teima em vir para a cara, redescobre alguma da minha beleza desvanecida. Segura-me na mão, ri-te comigo, traz à memória velhas histórias de infância.
Reassegura-me que gostas de mim mesmo nas fases obscuras, oferece-me um elogio.
Preciso de sentir-te parte do meu universo. Não basta saber, é necessário sentir. Mostra-me que és um bocadinho meu, que há coisas que ninguém nos pode tirar. E, desta vez, perdoa-me a lamechice; alimenta-a, peço-te. Faz-me a transfusão emocional, vital nesta fase.
Porque é de abraços que preciso, e de surpresas, e de uma festa-surpresa. É urgente redescobrir a vida e tu podes ajudar-me. Traz-me um desenho teu, ou um recorte de jornal. Eu dou-te, em troca, um livro, um postal.
Fica. Rebola-te a rir. Ou a chorar. A sentir esta breve passagem (hoje estou com umas saídas pirosas- dá-me um desconto...). Prepara-me um jantar à luz de velas. Vamos saborear a meias o gelado, directamente da embalagem. Deixa-me aninhar em ti e massaja-me a garganta, a ver se o aperto vai embora.
Faz tábua rasa de todas as situações em que possa ter-te desiludido. Eu assim o farei também. Faz-me companhia na insónia.
E vamos ficar estáticos na alegria do momento.
Com alguma arte, talvez consigamos esticá-lo no tempo...

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