Angelique observava tudo, em pleno vôo, como fazia sempre, já há uma semana. O ar daquele lugar era seco, bem mais do que ela estava acostumada, mas o calor ajudava-a a pairar sobre as próprias asas, e se divertia em fazê-lo, vez ou outra. Flutuava do lado de fora daquela varanda, observando o movimento dentro do apartamento. Jamais fôra convidada, não entraria naquele local, sabia respeitar isso. Era uma mera vigia, mas não se incomodava. Ali estava, só por que seu Criador queria ter certeza de que as pessoas que ali viviam estariam bem.
A manhã tinha passado tranqüila e ela agora divertia-se se aproximando da gaiola do canário, provocando-o a cantar um pouco mais. Observava o menino brincando na sala e deixava-se demorar nele. Havia se afeiçoado à criança, nesse pouco tempo, e admirava o jeito como ela e a mãe se davam. Pelas noites daquela semana, o maior contato que tivera do Criador foi ouvindo sua voz, bem baixa, bem ao longe, quando ele ligava para conversar e trocar sorrisos e toques imaginários, com aquela mulher que tanto o enfeitiçava. Angelique em pouco tempo pôde entender pq ele voltara a acreditar nela e em...
- Oi, Angelique...
Assustava-se com a voz que surgia sorrateira, flutuando bem atrás dela.
- Espírito. Nossa, moleque, você sempre chega assim, né? Ainda mais aqui, como diabos eu adivinharia que você viria... peraê... - ela olhava-o com algum espanto e sua mente demorava a perceber o que o guia espiritual pensava... e então o espanto se tornava confusão - Você está brincando, não? Ele não poderia... não tem como...
O menino sorria daquele jeito sempre esquisito, um sorriso torto, onde os olhos grandes demais davam-lhe um ar quase insano. A mão direita apontando para um carro que se aproximava ao longe. Angelique nada mais perguntava ou questionava. Sabia, tão bem quanto o menino à sua frente, quem vinha se aproximando, naquele banco de carona. - Ele deu um jeito... - Os dois falavam ao mesmo tempo, ele em um tom afirmativo, ela ainda naquele espanto. A guardiã agora sorria, imaginando tudo o que ocorrera até ali. Concentrava-se no Criador e sentia toda a euforia de uma decisão apressada mas resoluta, no dia anterior. "Lembrava" agora de todos os cúmplices que foram chamados a ajudar, entendia quem era a pessoa ao volante daquele carro que agora manobrava, estacionando. Olhava pela varanda e via a Mãe colocando um casaco para descer, apressada.
- Eu ainda não creio que ele... ela com certeza não imagina o que vai encontrar. Hahahahahahahahahahahaha! - Angelique mergulhava no ar, voando em piruetas de uma empolgação que espelhava a Dele, sentindo aquelas borboletas à barriga, vendo tudo de longe, enquanto ele saía do carro e tramava uma "armadilha", com sua cúmplice, indo se esconder atrás de um carro próximo - Uma rosa! Claro! Tem que haver uma rosa vermelha! - Era tomada por todo aquele sentimento, aquela ansiedade, até mesmo o medo da não-aceitação. Aproximava-se Dele e o abraçava por trás, dando-lhe forças para o sorriso não tremer, na emoção tão forte que viria a seguir... as asas o cobriam, mas ele ainda podia ver tudo, através delas...
Espírito observava de longe, do alto, todo o desenrolar daquele plano que fora inspiração sua. Por vezes trocando olhares com o Filho, que parecia saber q ele estava lá. Sorria um sorriso ambíguo, os olhos mais amenos, o jeito menos ameaçador. Sem Angelique, afinal, aquele impulso todo dependera dele... e tinha conseguido fazê-lo funcionar.
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domingo, 28 de outubro de 2007
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