sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025

ninguém fala da solidão de um pai

ninguém fala
da solidão de um pai
da sua transfiguração
pelas mãos de uma mulher
em monstro
do seu crescente sentimento
de insignificância
de nada disso
é falado

não há fogo a sair da sua boca
e tanto arde o seu peito e o mar
ruge e urge à garganta
tantas vezes ancilosada pela dor
do estreito que vai do coração ao pensamento

as palavras são pedras não medem
distâncias traçam trilhos agrestes
incomensuráveis onde a pouco
e pouco o pai encontra o seu conforto

disso ninguém
fala         da solidão e do silêncio 
que se alojam         não disso
ninguém fala         de como saiu o amante
no romper das águas
de como caiu a primeira neve depois
o gelo depois veio
a chuva quando já manhã         entrou
à noite o inimigo no chão
junto aos cães         sê bem-vindo
pai
acomoda-te ao teu papel

3 comentários:

José Alexandre Ramos disse...

soco no estômago. angústia. dilacerante.

fernando machado silva disse...

Caro José, obrigado pela partilha. Um abraço

José Alexandre Ramos disse...

Não sei se o seu agradecimento sobre a partilha foi pela real partilha do poema que fiz no meu perfil de facebook. Se não foi, não o lamento, até porque não frequento assim tanto aquele sítio e, ao mesmo tempo, não sou muito lido ali. Ainda assim, tão forte realidade do poema fez com que lá o partilhasse quando me decido utilizar essa rede social. Isto porque o meu blog - como o seu - é um blog feito para os meus escritos, não um painel para mostra e/ou fazer citações, sequer considerações em jeito de diário. Não agradeça, é um privilégio ler o que escreve, e há muito tempo que o faço. Pudesse a blogosfera ressuscitar os seus teus áureos, e os facebookes eram uma mera história. Agradeço a resposta.