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sexta-feira, 2 de abril de 2021

Páscoa, coelhinhos e ovos

 

A década de 1950 foi próspera em folhetos publicitários de produtos alimentares que usavam as receitas culinárias para difundir o conhecimento dos mesmos.

Aconteceu com vários marcas estrangeiras como a Royal ou a farinha Maizena, mas também com as nacionais. É o caso destes dois folhetos, de 1954 e 1955, feitos pela Fábrica Portuguesa de Fermentos Holandeses, Lda.

Inaugurada em 1933 com pompa a Fábrica de Fermentos Holandeses, perto da praia da Cruz Quebrada, Oeiras, produzia levedura destinada ao fabrico de pão e pastelaria. Esta levedura era obtida a partir do melaço de cana-de-açúcar de Angola, onde também existia uma outra fábrica, em Luanda. Associada a esta encontrava-se a Sociedade de Produtos de Leveduras Selecionadas[1], de Matosinhos.

A fábrica representava em Portugal a empresa de Delft, Nederlandsche Gist & Spiritus Fabriek (Real Fábrica Holandesa de Fermento e Álcool), fundada em 1874.

Na realidade foram os holandeses que no final do século XVIII identificaram dois tipos de fermento e começaram a comercializá-los. Feito com as mesmas leveduras da cerveja, era inicialmente vendido em forma de creme, mas a partir de 1825 passou a ser-lhe feita a extracção da água, sendo comercializado em blocos sólidos. Utilizando o «processo holandês», isto é, usando o fermento feito pelos cervejeiros, o método espalhou-se depois pela Alemanha, França e restante Europa.

Para além destes folhetos a empresa publicava também um jornal chamado O Fermento, e embora os produtos se destinassem principalmente à indústria da panificação e pastelaria, estes folhetos divulgavam o fermento através de receitas também às donas-de-casa.

 É assim que se apresentam vários modelos de bolos, ou pães doces, associados à Páscoa, como os coelhinhos, as tranças, os folares, etc. destinados a cumprir os rituais festivos.

Uma Boa Páscoa a todos.



[1] Que a partir de 1966 teve um papel importante na produção em Portugal de Penicilina e Estreptomicina.

quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Objecto mistério Nº 57. Resposta: Caixa de pão

Quando olhei a primeira vez para ela pareceu-me logo um caixa de costura. Este formato é o mais habitual para guardar as linhas, agulhas e tudo o necessário para uma costura rápida.
Contudo a palavra «PÃO», feita numa placa de alumínio, não deixava dúvidas. À semelhança das palavras em prata aplicadas na tampa de caixas mais requintadas, muito usadas para jóias e outros fins durante a primeira metade do século XX, orientam-nos para uma utilização exclusiva.
Esta caixa tem ainda a característica insólita de ter um vidro central que nos permite ver o pão. Para o caso de nos esquecermos de que já não há pão.
Na realidade as caixas podem ser multifuncionais, mas existem formas específicas que se generalizaram para um determinado fim.
As caixas de pão apresentam múltiplas formas, sendo as mais frequentes as caixas rectangulares e as redondas, mas existem outras. Foram muito populares na primeira década do século XX as caixas semicilíndricas com tampas rotativas. São geralmente em metal esmaltado e mais tarde em plástico e em madeira. Extremamente práticas forma retomadas por designers no final do século XX utilizando novos materiais.
Também as caixas de costura apresentam múltiplas formas, mas as caixas semelhantes à apresentada costumam destinar-se a esse fim.
Já agora, para confundir um pouco, mostro uma caixa de costura semicilíndrica precisamente com o feitio de uma caixa de pão.
É precisamente para isso que servem as etiquetas: para identificar o conteúdo. Nestes casos não temos escolha. Alguém decidiu por nós.

terça-feira, 10 de julho de 2018

O talher de D. João V (cadinet ou cadenas) - 1


Réplica do que poderá ter sido o "talher de D. João V". Foto João Oliveira Silva
“Talher” é a designação portuguesa de cadinet ou cadenas que encontrei num documento em que se descreve o banquete de casamento de D. João V em 1708.
Publiquei esta informação no meu livro «Mesa Real» e, até então, desconhecia-se o seu uso na corte portuguesa. Toda a descrição do banquete é de grande interesse mas foco-me aqui nos “talheres”, tomados como designação lata. Estes foram trazidos pelos Reposteiros da Câmara em pratos grandes dourados os Talheres Reais quadrados de S. Majestades, e os redondos ordinários de S. Altezas.
Cadinet com guardanapo em flor de nenúfar para o pão
A descrição pormenoriza: "Virão os Talheres Reais preparados com sal, açúcar e pimenta nos lugares que para isso tem: e no do pão se põe por baixo um guardanapo liso em forma quadrada de sorte que não transborde o talher, e por cima dele o pão com a faca, colher, garfo e dois palitos, coberto tudo com um guardanapo levantado, cujas dobras hão-de ser muito finas»[1].
Cadinet de Guilherme III, 1688, Royal Collection, Londres
Não existe em Portugal qualquer exemplar de cadinet que, tal como noutros países, foram derretidos. O mesmo aconteceu em França, onde, os que existem são mais tardios, do século XIX e encomendados por Napoleão, que desejava retomar o esplendor do ritual da mesa real.
Cadinet feito em Augsbur, 1718. V&A Museum
Os ingleses, mais conservadores, mantiveram vários exemplares e foi um deles, o do rei Carlos II de Inglaterra, casado com D. Catarina de Bragança que tomei como modelo.
Para a exposição sobre o pão na mesa do rei, que esteve a meu cargo, e que se pode ver em Mafra no Festival do Pão até dia 15 de Julho, concebi o que poderia ter sido o cadinet do rei D. João V, com as suas armas na base e mandei efectuar um exemplar.
Pormenor da parte horizontal do cadinet com o guardanapo levantado
Tal como na época coloquei um guardanapo dobrado na parte horizontal e sobre este um outro levantado, para o caso em flor de nenúfar, que permite uma visualização do pão que aqui se pretende realçar.
Ficou lindíssimo e penso que só por si merece uma visita à exposição. Depois não digam que não avisei.




[1] Pereira, Ana Marques, Mesa Real. Dinastia de Bragança, Lisboa, Esfera dos Livros, pp. 65-75.

segunda-feira, 2 de julho de 2018

Convite: O pão à mesa do rei.


De 6 a 15 de Julho, decorre no Jardim do Cerco, em Mafra, o Festival do Pão. Para além do extenso programa o “Fórum do Pão” integra uma exposição, apresentações temáticas e degustações.

A exposição intitula-se “O Pão de todos: da mesa do povo à mesa real” e apresenta a história desde importante alimento.

No mesmo espaço decorrem, sempre às 15h30, diversas actividades.

No dia 7 de Julho, vou falar sobre “O pão à mesa do Rei. O consumo do pão nas Cozinhas Reais”.
Fica aqui o programa e podem consultar as restantes actividades aqui. Acho a iniciativa interessante e sobre ela voltarei a falar. Estão todos convidados. Espero lá vê-los.

terça-feira, 26 de junho de 2018

As cores do pão

Foto de João Oliveira Silva da CMF

Tive o grato desafio de receber um convite da Câmara Municipal de Mafra para organizar uma exposição sobre o pão durante o Festival do Pão que irá decorrer nessa cidade entre os dias 7 e 15 de Julho.
O tema este ano tem a ver com o pão na mesa real, numa referência às estadas da corte de D. João V nessa, então, vila. Mas decidiu-se falar no «Pão de todos: da mesa do povo à mesa real», título da exposição, por ser mais abrangente.
 
Pormenor do quadro «natureza morta com pão e empada de perú» Pieter Claesz, 1627. Cortesia de Rijksmuseum Amsterdam.
Foi um desafio interessante porque me fez pensar de outra forma no pão. Um dos painéis designa-se «As cores do Pão» e remete-nos para uma realidade que presentemente se alterou.


Consumido por todas as classes sociais o pão era, contudo, o elemento base da alimentação das classes mais carenciadas. Apresentava-se com várias formas e características mas era na qualidade do pão (pão branco ou alvo para as classes poderosas, de mistura ou de cereais inferiores como a espelta e o sorgo, para o povo) que se revelava a grande diferença entre as classes sociais.
Era notória uma hierarquia nos pães tal como existia na sociedade e a cor do pão traduzia essa realidade. Até à introdução do milho na panificação as cores do pão variavam do escuro, quase preto, ao branco. A farinha de milho veio alterar a composição dos pães e a sua cor.

O padeiro (c. 1681). Job Adriaensz Berckheyde. Worcester Art Museum.
Para ilustrar esta ideia decidi utilizar um quadro «O padeiro»,  pintado por Job Adriaensz Berckheyde e existente no americano Worcester Art Museum. O preço pedido pela utilização da imagem para este fim era incomportável. Decidiu-se então fazer uma fotografia de uma natureza morta que envolvesse pão (pães de Mafra, pois claro!).
Para isso inspirei-me num quadro que Salvador Dali pintou em 1926 e adaptei a ideia com objectos da minha pertença. O resultado da foto (da autoria de João Oliveira, da CMF) superou as expectativas: ficou lindíssimo, como podem confirmar.
O cesto de pão. Salvador Dali. 1926.
Esta história tem um outro fim: o de alertar para o crescente aumento de preço que alguns museus pedem pela utilização das suas imagens. Enquanto alguns museus pensam que o facto de divulgarmos uma das suas obras já é uma forma de pagamento outros, com acontece com a maior parte dos museus portugueses dependentes da DGPC, fazem-se cobrar bem. 

Este problema surgiu-me com o meu futuro livro «Vestir a Mesa». Com o preço pedido, por exemplo, pela utilização de uma fotografia do Arquivo Fotográfico de Lisboa, eu comprava a foto no mercado, caso ela aparecesse. Resultado: o livro vai ter imagens estrangeiras de bons museus, imagens de peças e gravuras minhas, fotos de conjuntos da minha colecção mas apenas as imagens indispensáveis dos museus portugueses.
Vão ficar com as imagens guardadas nas suas colecções e não será feita divulgação do nosso espólio (com grande pena minha), tanto mais lamentável porque será uma edição bilingue. Não acham que não é por aí que vão encher-se de dinheiro para a Cultura? Praticar preços internacionais num país como o nosso é uma tontaria contraproducente. E que tal rever as tabelas?

segunda-feira, 14 de março de 2016

O mistério do pão de Mafra

Até aquele dia nunca tinha pensado porque existia um pão de Mafra. A origem do pão alentejano era fácil perceber com todos aqueles campos semeados de trigo e outros cereais. Era inevitável que houvesse pão alentejano.
Quando há algumas semanas fui com uns amigos para a chamada zona saloia almoçar levaram-me a uma padaria comprar o verdadeiro pão de Mafra. Era uma unidade de produção grande com a vendedora vestida de branco com touca branca. Mostrei-me interessada e o meu amigo Zé Rosa que conhece bem a região quis mostrar-me o tradicional pão de Mafra.
Na realidade este pão é o mais conhecido dos pães saloios, assim chamados por serem produzidos na região saloia que desde a Idade Média abastecia a cidade de Lisboa, onde era vendido nas ruas.
Era também daí que vinham os produtos hortícolas cultivados pelos descendentes dos árabes que haviam saído da cidade de Lisboa, depois da sua ocupação. Devem ter também cultivado cereais, o que hoje já não é visível porque só assim se explicava a produção de pão. Mas um outro factor deve ter pesado neste fabrico: o da intensa moagem feita em moinhos de vento que ainda hoje se podem ver nesta região. 

Todo este raciocínio vem a propósito da conversa com uma senhora da aldeia de Santo Estevão das Galés, de 71 anos de idade, de nome Maria do Rosário, mas a quem, como ela disse chamam Mimi. Tinha fama de fazer o melhor pão da região e valia a pena lá ir. Quando chegamos encontramos uma senhora vestida de preto e o forno estava há muito sem funcionar. Já não fazia pão. Começou-me a contar as razões desta alteração enquanto mostrava o local de fabrico do pão, a masseira e os outros utensílios. O forno fechado estava coberto com jornais e indicava que há muito não era usado. 
Com o vagar de quem está sozinha começou pelo princípio, pelo tempo em que conheceu o marido e em que começaram namoro. Depois casaram. O marido era moleiro, filho e neto de moleiros. Tinha sido concebido dentro do moinho. Tentou deixar de ser moleiro, mas não conseguiu e voltou a esta profissão e ela, depois de casada, fez-se padeira. Chegou a ser considerada a melhor padeira da região como também confirmam as fotos de alguém que a fotografou mais nova, vestida de branco a fazer pão, que encontrei depois na internet.
A conversa desenrolava-se num rosário contínuo, que ia sempre parar à doença do marido. Descreveu-me em pormenor o dia em que o marido adoeceu, a chegada da ambulância, os diálogos e a partida do marido para o hospital. Quis apressar-lhe a narrativa, saber porque afinal já não fazia pão. 
As pessoas que me acompanhavam impacientavam-se para partir e ela cada vez mais se enredava na sua história. Pedi-lhe para fotografar e rapidamente destapou o forno, pegou na pesada pá de madeira que se encontrava presa nos barrotes do tecto e fingiu que tirava o pão do forno. Por momentos voltou ao passado. Os olhos brilharam e parecia que tudo era como antigamente.
O discurso pormenorizado continuava, saboreando o momento e arrastando-o para me prender. Para encurtar a conversa, que gravei no telefone quando me apercebi que ia ser longa, perguntei se o marido tinha falecido no hospital. Não, ainda voltou para casa doente e ela teve que tratar dele. Quando faleceu ela adoeceu. Agora estava melhor. Sugeri-lhe que talvez pudesse fazer o seu pão tão apreciado novamente. Talvez, com a ajuda do filho, respondeu-me. Eu prometi voltar e ir comprar-lhe pão.
Ficamos as duas pelas promessas que sabíamos que nenhuma ia cumprir. Foi uma boa tarde para as duas. 

domingo, 7 de dezembro de 2014

O pão-de-quartos da Covilhã

Quando eu era pequena o pão que se comia em minha casa era o pão-de- quartos. Claro que não era só em minha casa e, ainda há pouco tempo, a minha amiga Alda, natural da Covilhã, publicou no facebook uma mesa de refeição em que estava presente um pão desse tipo. Apesar de estarem presentes vários alimentos foi o pão que suscitou maior entusiasmo entre aqueles que dele se recordavam.
Claro que eu fui uma delas. Até porque foi um pão que desapareceu substituído pelas novas formas, idênticas em todo o país. É pois natural que tenha ficado entusiasmada quando na minha última ida à Covilhã encontrei o dito tipo de pão.
A forma deste pão é-lhe dada cortando com a mão ou cutelo o pão em cruz semelhando a junção de quatro bolas. A sua forma permite ir cortando à mão cada uma delas que corresponde a um quarto do pão e daí a designação.
Mas nem só de forma vive o pão e o mais importante é a massa. Era um pão alvo, feito de farinha de trigo, mas compacto. Muito agradável no sabor.
Este que comprei apresenta a mesma forma e é portanto um verdadeiro pão-de-quartos. Mas quando o experimentei tive uma enorme decepção. Era um pão de padaria industrial igual a outros de diferentes feitios, sem história, e que não conseguiu fazer-me regressar aos meus tempos de menina e moça. Uma pena.

De qualquer modo fica aqui o registo até porque daqui a algum tempo já não há ninguém que se lembre dele e um dos netos do antigo padeiro é capaz de pensar: «Mas que perda de tempo juntar 4 bolas. Porque não se hão de vender separadas que é mais prático e fica mais barato?».

sexta-feira, 13 de junho de 2014

O Pão no Adagiário Popular

A minha preferida





Imagens extraídas do livro «O Pão, as Padeiras e os Padeiros» escrito por Gentil Martins, Lisboa, Ministério das Corporações e Previdência Social, 1964. 

sábado, 3 de maio de 2014

Os Biscoitos de Água de Karlsbad

  

Chamou-me à atenção um anúncio aos «Biscoitos de Água de Karslbad», publicado no Diário de Notícias de 12 de Dezembro de 1935. 

Publicitados como «o único pão digerível» para doentes do estômago, fígado e intestino, eram recomendados também aos diabéticos. Eram vendidos nas farmácias, pastelarias e boas mercearias e tinham um representante em Lisboa e um depósito no Porto na Farmácia Central.
Que tipo de pão era este? Trata-se das ainda existentes «Wafers de Karslbad», ou mais concretamente de obreias, também designadas oblatas. Karlsbad (Karlovy Vary) faz parte de um famoso triângulo de termas da Boemia (Karlsbad-Marienbad-Franzensbad). 
Situa-se na República Checa e tem uma longa história no que respeita a estes dois produtos: águas minerais e obreias, conhecidos desde há séculos. A associação de ambos, isto é, as obreias confeccionadas com água das termas tornou-se parte da terapêutica dos seus visitantes e constituíam um bom presente para trazer no regresso.
Conhecidas desde 1640 as obreias eram feitas com duas placas de ferro quente, mas industrializaram-se em 1856. Tornaram-se afamadas e chegaram à mesa de reis e presidentes, numa época em que a estância termal entrou também em moda. Foi visitada por Pedro o Grande, pelo Imperador Francisco José e por músicos famosos como Beethoven, Liszt e Chopin e escritores como Goethe e Tolstoi. Tal como outras termas passaram a ser um local de vista obrigatória da sociedade abastada nos séculos XIX e início do século XX, que intervalava as curas de águas com passeios, bailes e jantares.
Os banhos por imersão e a ingestão das suas águas eram recomendadas para um grande número de patologias. Daí a extensão à sua utilização no fabrico das obreias que lhes conferia um gosto específico mas tinha também um efeito terapêutico.

E foi assim que, sob a designação de biscoitos ou pão, chegaram a Portugal, o que mostra a importância do termalismo nesta época e a influência que os spas internacionais exerceram no nosso país.