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sexta-feira, 3 de maio de 2024

Uma ementa, um livro de curso e uma homenagem (Não precisamente por esta ordem)

  

Foi um acaso descobrir este livro de Curso dos Quintanistas de Medicina de 1938-9. Estes livros de final de curso, sobretudo de Medicina e de Direito, foram muito frequentes na primeira metade do século XX, em especial entre 1920 e 1960.

Neles surgia uma biografia humorística e um desenho de cada aluno, feitos por artistas ou colegas mais ou menos talentoso. Em poucas linhas desenhava-se uma imagem do caricaturado, com as suas características de então e o que se esperava que fossem no futuro. Na grande maioria são desinteressantes e não conhecendo os visados despertam-nos ainda menos a curiosidade.

Neste volume, em concreto, descobri o meu grande mestre e Director de Serviço, com quem aprendi Hematologia e me ensinou a ser uma médica responsável. Trata-se do Dr. Renato Valadas Preto que, juntamente com o Prof. Ducla Soares foram os fundadores da Hematologia em Portugal.

A sua figura de pequena dimensão contrastava com a sua enorme inteligência. Tive sempre um fraquinho por pessoas inteligentes, o que reconheço ser uma injustiça porque não corresponde a um esforço da pessoa. Nasce-se inteligente e depois pode desenvolver-se a mesma ou aplicá-la a fins mais ou menos elaborados. Mas a genética é fundamental. No caso do Dr. Valadas Preto que, normalmente era calado, mas atento, arguto e irónico, as palavras tinham um peso tremendo. Ouvir as suas afirmações era como acompanhar uma engrenagem mental a trabalhar de onde saía uma conclusão brilhante. Nunca conheci ninguém assim até hoje, apesar de ter o prazer de conviver e de me cruzar com pessoas com inteligência acima da média.

Recordo ainda alguma das suas frases sublimes, uma das quais me vem muitas vezes ao espírito, quando alguém faz uma observação inadequada. De forma sóbria dizia: “Não vem a propósito, nem é brilhante”. Terminava, naquele momento, a conversa de ocasião.


Dentro do livro encontra-se também o programa da récita e, imaginem, a ementa dos 25 anos de curso, em 1964. Vale a pena analisar as personagens e os pormenores.




sexta-feira, 9 de setembro de 2022

Rainha Isabel II. Recordações portuguesas

Na data da morte da Rainha Isabel II de Inglaterra vieram-me há memória recordações antigas da sua visita a Portugal. Não que eu me recorde disso. Era muito pequena e não vivia em Lisboa.

A história é outra e tem a ver com uma compra que não fiz há muitos anos. Ia frequentemente à loja do Castanheira, que ficava perto do Largo de S. Roque, e que era a única que vendia Ephemera, memorabilia, coleccionismo e também livros e revistas. Ainda hoje não há mais nenhuma que a tenha substituído. Era um exemplo de organização e paciência para os pequenos papéis.

Ementa e programa de música do Palácio da Ajuda

Deve dizer que nunca me arrependi do que comprei, mesmo das más compras, mas sempre me arrependi do que não comprei e ficou na minha memória. 

À cabeça está uma torradeira em baquelite verde que não comprei em Lugano e um caderno com todas as revistas e notícias relativas à visita da rainha Isabel II a Portugal, à venda na loja do Castanheira. 

Ementa do almoço no Mosteiro de Alcobaça
Devia ter sido compilada por uma senhora que cuidadosamente a mandou encadernar e forrar com uma chita de flores, como eu tanto gosto. Não a comprei na altura porque achei o preço muito alto, mas fiquei sempre com pena.

Lista de convidados e ementa da recepção a bordo do Iate Britannia

De tal modo eu ao longo dos anos comecei a juntar tudo o que aparecia sobre essa visita. Daí resultou um espólio interessante que inclui as ementas, os convites, as revistas e jornais, os programas e até fotografias assinadas pela própria rainha.

Programa de música e ementa do jantar oferecido no Iate Britannia
Nunca pensei em fazer nada desses elementos mas hoje pensei que seria um bom momento para divulgar algumas imagens.

Program da recepção no Teatro de S. Carlos
Assim partilho imagens da sua chegada e recepção pelo general Craveiro Lopes, alguns menus de recepção, como o do Palácio da Ajuda, o que a rainha ofereceu a bordo do Iate Britannia, e o almoço que teve lugar no Mosteiro da Batalha e onde foram recordadas as palavras de Wiiliam Beckford, sobre o mesmo.

A visita incluiu também uma ida ao Teatro de S. Carlos e um encontro com Salazar que aprece sorridente na foto menos formal dessa vista.

É apenas um resumo dessa visita, uma homenagem a uma mulher extraordinária que soube assumir o seu papel com dedicação e profissionalismo, que é o que se espera de uma pessoa inteligente e honesta, em qualquer actividade. Não existem contos de fadas senão nos livros. 

sexta-feira, 9 de julho de 2021

Memórias esquecidas: o duplicador

Ao consultar um jornal antigo, um suplemento do Diário de Lisboa de 1963, deparei-me com uma notícia espantosa: a explicação do que era um duplicador. 
Hoje em dia não seria necessário um artigo para explicar como se faz uma fotocópia, de tal modo o processo se encontra divulgado.
Lembrei-me então dos anos 60 quando eu estava nos últimos anos do Liceu. Eu era uma boa aluna a História, mas a maioria da turma não conseguia ler os livros compactos de “História do Matoso”. O autor destes livros era António Gonçalves Matoso (1895-1975), pai do historiador José Matoso. Foi professor liceal e autor de manuais de História para o ensino liceal, desde 1938. 
O seu Compêndio de História de Portugal, e o Compêndio de História Universal, acompanharam gerações de estudantes. Extremamente bem-feitos, do ponto de vista histórico, não tinham em conta a população a que se destinavam e eram detestados por todos e … simplesmente não eram lidos. Em conclusão as reprovações eram imensas. 
 
O meu pai havia-me ensinado a importância de resumir os textos e foi o que eu fiz a História. Escrevi uma pequena História, baseada no compêndio de leitura obrigatória do Matoso. Os meus colegas de turma quiseram ter acesso a ele, mas então não havia ainda fotocópias.  Acontece que num dos empregos do meu pai existia uma máquina duplicadora. Lembro-me que tinha uma tina com um líquido de onde saía uma folha idêntica ao original, mais grossa e brilhante. Fiz umas cópias destinadas a venda aos meus colegas. Distribui-as pelos interessados que deviam pagar-me uma insignificância, para compensar o preço das folhas. Mas isso nunca aconteceu. 
Just in Time, or a Short History of Production (2010), instalação do artista Xavier Antin.Cadeia de impressoras de diferentes épocas: magenta (Stencil duplicator, 1880), cyan (Spirit duplicator, 1923), preto (Laser printer, 1969) e amarelo (Inkjet printer, 1976).

Foi o meu primeiro negócio e logo ali devia ter percebido que não tinha jeito para ganhar dinheiro. Ao longo da vida viria a confirmar isso. 

Mas esta história não serve para me queixar, mas para descrever uma memória perdida do tempo em que surgiram as primeiras máquinas duplicadoras. Um objecto que já quase ninguém recorda. Como a modernidade é efémera.

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

Histórias de regadores e regadores sem história

Nunca pensei vir a escrever sobre regadores. Contudo quando os meus olhos caíram sobre um exemplar puro dos anos 60, de cor laranja e grande flores amarelas, violetas e roxas, a fazer-me lembrar a insígnia da Mary Quant, não resisti. É verdade que sobre ele não posso contar qualquer história porque desconheço a quem pertenceu. Achei-o lindíssimo e extraordinariamente pouco prático e, o pouco uso que deve teve ter tido, atendendo ao seu excelente grau de conservação, confirma-o.

 Quando o vi lembrei-me de uma história da minha vida de estudante. No meu tempo de Faculdade as noitadas eram raras, ao contrário do que hoje acontece. Talvez por isso os episódios também ficassem mais marcados na memória. Numa noite apareceu-me em casa uma amiga, acompanhada de uns amigos. São pessoas conhecidas mas ignoro aqui os nomes, embora não possa deixar de mencionar a presença do pintor Jorge Martins, que deu azo a esta história. Ficámos na sala a conversar longas horas. A sala de esquina de uma casa pombalina, com várias janelas, permitia a entrada de luz vinda de um grande largo onde se situava. A ele se juntava a luz fraca do interior. 

Num ambiente calmo falámos durante horas, mas não me recordo do tema da conversação. Usavam-se então plantas no interior e quando a luz começou a abrir, constatei que as plantas estavam a precisar de água. Fui buscar um regador e reguei as plantas. Lembro-me de o Jorge Martins ter dito que num ambiente daqueles se justificava um regador com maior beleza. Fiquei estupefacta com a sua sensibilidade estética, sobre um tema que nunca me havia ocorrido.

Passado algum tempo fui à loja do Vergílio Seco, que tinha então um antiquário no Príncipe Real e vi o jarro de louça branca com flores que aqui mostro. Lembrei-me da conversa e pensei: é este o adequado. Comprei-o e durante muito tempo usei-o com o fim de regar as plantas da sala.

Um dia promovi-o a jarro de flores e deixou de ser um objecto utilitário.

Hoje, bem mais prática, como nos ensina a idade, uso um regador de plástico, sem estilo ou história. 

sábado, 15 de junho de 2019

Monólogo gastronómico no «Restaurante Sua Excelência»


 No meio de alguns papéis com receitas que me deram vinha uma fotocópia de um artigo de um jornal não identificado intitulado «Monólogo gastronómico».
O papel mostrava a fotografia de Francisco Queiroz e reproduzia na íntegra uma das suas recitações da ementa que antecediam a refeição. O nome do restaurante não era referido no recorte (possivelmente incompleto), mas imediatamente fui transportada para o interior de «Sua Excelência». O restaurante, que já não existe, ficava em Lisboa na Rua do Conde, nº 38, onde na altura eu vivia, um pouco mais abaixo.
Rua do Conde, 38, já com o resturante fechado. Foto tirada do Google Maps.
Fui lá algumas vezes, talvez não tantas como se justificava, porque era um lugar onde nos sentíamos em casa. Morando eu tão perto ficava com a sensação de não tinha saído de casa e que aquela era a minha sala de jantar. Coisas da juventude, porque as refeições eram realmente diferentes das dos outros restaurantes. Em primeiro lugar a comida era excelente, o ambiente acolhedor e o seu proprietário, Francisco Queiroz, recitava-nos as receitas dizendo, por exemplo, «nabos à moda da minha avó». A propósito, eu que não gostava de nabos fiquei tão encantada com a descrição da receita que resolvi experimentar. Os nabos vinham numa frigideirinha de cerâmica cobertos com fiambre e molho branco e iam ao forno gratinar com queijo. A sua confecção era descrita passo a passo e a experiência era sempre positiva. 
A recitação da ementa era uma das características da casa. Francisco Queiroz descrevia todos os pratos em pormenor, referindo logo que não havia ementa escrita e a que ementa era ele.
Francisco Queiroz
A demorada descrição fazia impacientar algumas pessoas. Mas não havia volta a dar. Era um ritual que fazia parte da refeição e que para ele fazia parte do prazer do momento. Quem lá ia já sabia ao que ia e se fosse bom ouvinte tirava disso prazer.
Tendo vindo de Angola nos anos 70 começou por abrir o restaurante «Varina da Madragoa» onde já fazia esta “actuação”. Quando frequentei este restaurante já ele lá não estava e não o posso confirmar pessoalmente.
O artigo que reproduzo fala apenas das entradas, podem imaginar o resto. Mas tudo isto valia a pena. Já não há restaurantes destes!

terça-feira, 11 de abril de 2017

Os panos de limpar copos da minha mãe

Há alguns anos atrás, em casa de uma amiga minha, perguntei-lhe onde estavam os panos dos copos. Disse-me que não tinha e não sabia o que era. Percebi pela primeira vez que, o que para mim era evidente, ter panos independentes para limpar a louça e para os copos, não era assim tão comum.
Lembro-me de a minha mãe, de forma displicente, desenhar com um lápis no pano copos ou outros objectos de cozinha que depois bordava com ponto pé de flor. São esses panos, feitos de algodão fino, sem pêlo evidentemente, que eram usados para limpar os copos e outros objectos em vidro e não passava pela cabeça de ninguém usar os outros de algodão mais grosso para o efeito.
São alguns desses panos, com modelos de copos variados, que aqui mostro. Estranhamente outros apresentam panelas, tachos e chávenas, mas esses desenhos eram apenas decorativos, provavelmente para variar os motivos do bordado porque continuavam a servir exclusivamente para os vidros.
Para além destes tipos de panos de cozinha específicos, nalgumas casas existiam outros. A minha amiga Cilinha falou-me de um tio em cuja casa existia mesmo um pano que servia apenas para limpar os cinzeiros.
Neste cabide de panos em madeira, do final do século XIX/ princípio do século XX, podemos observar os símbolos que se encontram sobre os ganchos, que indicam o local de cada um destes tipos de panos e que exemplificam bem o que ficou dito.

domingo, 30 de setembro de 2012

Confraternização do Curso Médico de 1923

 Quando olhei para estes três documentos que resumem o Programa da Reunião do Curso de Medicina de Lisboa de 1918-1923, não pude deixar de constatar como tudo mudou.
 O encontro, que comemorava o 22º aniversário do curso, durou o dia inteiro. Começou com um missa às 10 horas da manhã, a que se seguiu a visita ao Laboratório Victória e aos novas pavilhões do IPO e foram almoçar no restaurante Faroleiro no Guincho.

À tarde visitaram o novo Hospital da CUF, o Hospital Júlio de Matos e a Maternidade Alfredo da Costa.
 O encontro terminou com um banquete no Café-Restaurante Tavares. Da ementa deste último, que se apresenta, fazia parte o «Lombo de Vaca à Testut» que explico, para quem não é médico, era o autor do livro de Anatomia da época. No meu tempo já não se usava e estudávamos pelo Rouvière.
 Recordo a propósito o único jantar de curso a que fui. Comemorava-se o 25º aniversário do final do curso e por grande insistência de uma colega lá fui. Quando chegamos ao hotel onde ia decorrer o jantar estavam todos os colegas numa sala que ficava ao fundo de uma escadaria. Quando chegamos ao cima da escada olhamos para baixo e ela diz-me: «Vamos embora». Nessa altura eu não concordei e avançamos estoicamente.
 Eu não via a grande maioria das pessoas há 25 anos. A parte feminina, de cabelos arranjados e pintados, ainda conseguia disfarçar o quarto de século que havia já passado, mas os homens, então sem esses disfarces, mostravam o cabelo branco e as suas barrigas.

Falávamos uns com os outros, sem recordar já os nomes e a frase mais repetida era uma mentira galante: «Estás na mesma».
Não foi fácil e no final pensei: «Talvez fosse melhor vir todos os anos. Assim habituava-me progressivamente». Nunca mais voltei. Estou à espera do 50º aniversário de curso.

domingo, 20 de maio de 2012

Regresso à Infância


Ao folhear uns catálogos antigos de linhas e passamanarias deparei-me com um que apresentava vários padrões de fitas.

Imediatamente identifiquei um dos modelos de fitas que eu usei no cabelo quando andava na escola primária.
Infelizmente, e ao contrário de outros que o acompanhavam, este não estava identificado. Era no entanto possível concluir que, apesar de provirem de várias fábricas, estas eram todas portuguesas.
Um dos exemplos era este catálogo de linhas de cor da marca «Sedanny» cuja marca da fábrica era «JR».
Todos os outros catálogos datam da primeira metade do século XX e espero mostrar-lhes os mais interessantes.

Por sorte há algum tempo, numa visita à casa dos meus pais encontrei as minhas fitas de cabelo e resolvi guardá-las.
Hoje o meu conhecimento aumentou. Apesar de desconhecer o nome da empresa que as produziu fiquei a saber que as fitas de cabelo que usei nos anos 50 correspondiam ao padrão 555 e eram de fabrico nacional.