sábado, 20 de março de 2010

impermanencia


imagem- doctor swam/flickr

Sou poeta.
E por ser poeta
canto
a leveza do fardo,
a beleza do cardo
do mar
do fogo-fátuo
que exala formas no ar.

E canto enquanto vivo.
Canto a beleza do instante
mutante,
inconstante,
do incessante vir a ser.
Canto o transitório
e o transe dos amantes
lapidados diamantes:
canto os laços desfeitos
e os liames que virão.

Não gozo gozos aflitos
nem sofro horrores.
Sou calmo. Sorvo pranas,
sou zen,
sou sem destino
no mundo.

Por isto tudo é que canto.
A canção sem fim.
Canto canções
da transitória permanência,
essências de vertigens
e caminho rumo ao novo,
ao velho,
ao novo
romper do ovo,
buscando transcendências
e inconfidências
contidas em corpos e almas
para confundir as mentes.

Por isso, canto.
A beleza do verso,
a fúria do verso,
a flor do cume
e o lírio do lodo,
o tudo e o todo,
o inútil e o passageiro.

Amanhã, na manhã,
Posso ser nódoa
que fica
na folha de papel.
Mas não importa.
Enquanto vivo,
canto,
e teimo
em buscar o céu.

cântico para cecilia meirelles e walt whitman

quinta-feira, 18 de março de 2010

transa


imagem: jef safi/flickr

e a palavra em transe
deixa-se possuir
pelo espírito da poesia:
doce epifania.

terça-feira, 16 de março de 2010

zen


imagem: aurelio.asiain/flickr


O silencio roça sua língua
na minha: busco o entendimento
que não atinjo na fala:
os sons se esgotaram
restaram os barulhos
que não são marulhos matinais:
por isso, o silêncio me ronda
e me rendo aos seus apelos:
seus sons me remetem ao ermo
do meu coração
que levita,zen,
em suas sendas.

sábado, 13 de março de 2010

inóspito


imagem: jjjohn~/flickr

Canto I

A palavra se cala
estupefata
diante da putrefata
crueza da morte
que assola os sentidos.

A palavra cora
envergonhada
diante da tinta
da fúria
que assola
e tinge o cenário.

Canto II


Terra devastada
em que se digladiam
irmãos de sangue
em mãos cruzadas
morrem os homens
apagam-se os sonhos
gotejando sangue
coquetéis vermelhos
gosmentos,
grudentos,
sangue novo
sangue antigo,
sangue cíclico
na terra devastada
nos desertos erráticos
longe dos oásis
e das calmarias
longe dos jacintos
e dos lilazes
de abril
só tenazes
apertando as gargantas
tantas.

Escorrem mundos
pelos dedos
pelos medos,
pelos becos,
pelas bocas correm escarros
escamas de sangue: bombas
da paz, explodem
sôfregas, trôpegas,
a morte
sorrindo, insidiosa,
sedenta, e o diabo
que se veste de cordeiro
esbanja escárnios.

E o sangue corre, escorre,
Explodem corpos e ossos
Se esfarelam:
É o sonho da paz
Que volta ao pó.
É a sanha do ser
Que não se entende
em nome de deus.
É destino ou desatino
Essa insensatez?

Canto III

A terra devastada
apenas observa
com olhos enevoados
e choram as pedras
e se empedram os cantos
e secam os cântaros
por perdas, por danos
e pela dor dos homens
que ficam
a espiar horizontes
com olhos caninos.

E o mar, ao fundo,
em seu azul de safira
sugere a paz:

Que paz?


cânticos para T.S.Eliot e seu poema "The Waste Land"

quinta-feira, 11 de março de 2010

fábula


imagem: c@rljones/flickr

,pois os cavalos,
em seu ímpeto de liberdade
dispararam pelos campos
como bólidos brancos,
negros
e amarelos
perfumados de crinas
e campinas
narinas ardendo
aos ventos.
e pararam, extasiados,
junto ao rio, de águas limpas
e de sedes extintas
e se inclinaram
diante de tanta beleza
e de tanta luz.

,e lá de cima, dos páramos,
observavam o vale, demolido,
cinza, desprovido
de sinais
de qualquer vida:
e viram
vagavam por lá estranhas criaturas
que deviam temer o sol
e a claridade
pois viviam
em buracos escuros.

,e os cavalos dispararam
de volta
aos seus campos
plenos de sol
e lua.

sábado, 6 de março de 2010

poeminha pornô


imagem: Mille Miu/Flickr

arranca-me o medo
estanca-me o olhar cego,
cante uma canção dos beatles
ou das beatas
das velhas igrejas mineiras:
amarre em meu tornozelo
fitas do senhor do bonfim
e me afogue em cheiros
de banhos
nesta noite
olha o diamante no céu:
é uma lua
parindo gotas de chuva
em drops de anis
azulmarinho quase escuro
e os céus despencam chocolate
e morangos- shake shake shake
shakes pearls- sonetos e romeus
julietas e as cores de verona:
ah, as cores do amor:
cante, baby, canções antigas
de ninar velhos meninos
e me deixe sugar teu peito,
engolir teu umbigo
e me enrodilhar no teu colo:
a noite é dia é noite é dia
e eu tô tão sozinho
e a dor dói tanto-
ah- em que esquinas
eu perdi meus sonhos?

vamos nos agigantar
nas mais doidas versões
de kamasutras
e descascar nossas almas
e epidermes
até o âmago
até o amargo
do início
vamos nos embriagar
de álcool e de promessas
vãs:
ando esquecendo seu nome
meu nome
mas seu corpo me lembra
a juventude.

vamos como num filme pornô
gozar ou fingir o gozo
não importa:
o que nos resta
é o desnudar
de nossas almas.

terça-feira, 2 de março de 2010

a palavra e eu - ii


imagem: Luiz Baltar/flickr

pois a palavra e eu
eu e a palavra
temos um caso de amor:
eu a acaricio no cio
ou a repudio
e ela me dá o troco
sumindo no vácuo, em fumaça
e eu fico assim: inerte, bobo,
e a palavra me tripudia
de dia e de noite
me nega o seu contato:
De bocas, caras,
coxas, bundas
e peitos
e corações
e não me embala,
nem se embola em mim:
é o fim?
não, é somente a semente
da dúvida, que me reconstrói
(dói!)
como vinho novo
de vindimas frescas:
eu e a palavra
temos um caso antigo
de amor, à primeira e última vistas:
ela me acolhe, eu a embaralho
e lambo e sugo sua língua:
e não morremos à míngua
pois a poesia singra
nossas vidas, como sangue
vivo.
na veia.

domingo, 28 de fevereiro de 2010

voz


imagem: levanta la voz- flickr/Daquella manera

pra adriana godoy

e o verbo se fez voz
e habitou entre nós.
voz:
foz de rios interiores
que nos faz
mós de moinhos
catapultas de ventos
cataventos
sonhando precipícios
aos quatro ventos.

voz.
música da palavra
escava em nós
nós cegos e desatados:
e mesmo sós
encadeamos cantos
sonoras explosões
de unos sentidos.

voz.
foz e estuário
santuário
veludo e uivo
sussurro e grito
da poesia
da palavra
tornada livre.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

o oco do mundo


imagem: tetsuo the iron bird- flickr/

há um artefato na porta principal
há artefatos na porta lateral
nas velhas portas frontais
e secundárias
onde se esconde o oco
do mundo:
os artefatos ocultam teses
e riem de nossas crenças
de crianças impúberes e imberbes
que se pensam livres e leves
em meio ao caos:

estão aí, em todos
Os lugares
e o mundo gira e os augúrios medram
medos
nos corredores mudos
midas tocam tudo: querem ouro
ou seus simulacros:
memórias préhistóricas
nos causam asco:
o que é a vida?
O que é arbítrio?
O que é sonho
Senão matérias
De pura poesia?

Minha avó e as profecias

E estava escrito. E assim devia ser.
Que aquele menino iria carregar nos ombros opeso de mil gerações, o preço de mil pecados, iria carregar em suas costas o peso de vidas inteiras que se desviaram.
E eu ria gostosamente das lindas lendas, lendas da velha minha vó que me assutava às vezes nas noites de raios e trovões com suas profecias loucas e suas estórias alucinadas.
E vivia eu relativamente bem um burguês acomodado acostumado às coisas bodas da vida , geladeira televisão e amore que adorava literatura de vanguarda, cinema de arte bares da moda e vernissages.
Que dormia de dia e vivia de noite.
Um pequeno burguês pequenino, como tantos outros.
E vivia eu assim, confortavelmente feliz e acomodado, sem saber que o destino traça linhas incongruentes e inconcebíveis em nossos cérebros, sem saber que o destino tem algo de bestiologico, sem saber que não há lógica nos caminhos do mundo.
E vivia eu confortavelmente bem, sem me lembrar da velha minha vó, que tantos anos já havia passado desde suas estórias loucas e suas profecias fantásticas, que tantos anos já havia passado que a memória não conseguiu guardar.
E foi assim que naquele belo fim de noite eu senti apavorado e abestalhado( beatificado) as coisas me acontecerem..
Naquele lindo fim de noite de lua de uísque e de embalo foi que eu comecei a compreender as linhas invisíveis e incompreensíveis.
Eu caminhava de encontro ao descanso do corpo quaqndo senti a minha primeira punhalada.
A segunda punhalada. A terceira.
Senti o sangue ir escorrendo pela calçada, pela calça, o meu carro a poucos metros de mim, e eu sem poder ao menos alcançá-lo, e a sofrer a agonia das punhaladas pelas costas, as punhaladas que me penetravam até os ossos, e me faziam sofrer as piores dores imagináveis.
E meu carro a poucos metros de mim, a salvação a poucos metros de mim.
A vida, a poucos instantes de mim. E eu, me perdendo pouco a pouco.
Foram entretanto essas apenas as primeiras revelações. O sangue fez ao meu redor uma poça vermelha, e eu continuava no chão, sem compreender o porque, mas compreendendo que alguma coisa mais forte e mais verdadeira do que a minha verdade estava acontecdendo.
E foi nesse exato momento de reflexão que os pássaros desceram do céu com seus bicos de metal e suas asas de chamas vermelhas. E começarqam a bicar-me os olhos, queimar-me o corpo com o fogo suas asas.
Matavam-me, entoando hinos imcompreensiveis aos meus ouvidos.
Foi aí que eu penetrei naquela realidade suprarreal. me lembrei dos meus velhos tempos em que minha vó me contava as velhas profecias, e me contava que eu não era um menino comum.
Eu não morri. Fiquei vivo ali no chão, com o fogo, o aço, o sangue e os punhais.
Percebendo todo o horror proibido dos velhos tempos, eu vi:
Estavam se cumprindo as profecias.

belo horizonte -1978


sim, os portais estão cheios de signos
e os homens se persignam frente aos idolos
e se desmancham em lágrimas
em coitos afoitos
pelos quatro cantos:
entoam cânticos, revivem mitos
e se deixam abduzir
pela poeira de estrelas:

as canções de gesta, os romanceslíricos,
o amor idilico,
a lirica poética
tudo conspira, tudo inspira, tudo incita
e excita os homens.

que ainda patinham na lama
que ainda amargam
nas ruas
que ainda aspiram a rosas
tendo sangue nos dentes.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

no labirinto


imagem: Labirinth/ MorganTar-Flickr

Nada a fazer
a não ser
Sair prá ver o mar. a mer
da é que o mar não traz
Paz ou poesia. é sujo,
como os becos fétidos,
fedendo a mijo, ao relento. tento
os degraus do céu.

estranhas me chamam
aos leitos desarrumados
Com marcas de outros
e me rendo ou não
às cantadas das sirenas?
Gozar, gozar enquanto a seiva flui
E a carne free-me.
no labirinto. sinto a santa
chama quente
do absinto ardendo
as entranhas. estranhas chamam
e me perco
no lusco-fusco. há saída?
a saída
onde é a saída?

sábado, 6 de fevereiro de 2010


imagem: in a dream - flickr/magicattic88

I have had my head bent for truth and treason.
I'm the fox of reason.
I'm an eagle in the whirlpool.

* * *

Michael mcclure –

hum

sei. Sou a sombra de mim e dos outros
e suporto fardos que pesam as dores
do mundo mundo que não sabe
o que carrego dentro
desta mochila estradeira
dos anos sessenta.

saudades não de ddesbotados
serafins coroando anjos e deuses
no olímpico nirvana
de ioguins e iogurtes
de sonhos brancos e canções
enjoadas
de liras mormacentas. quero, sim.
muito mais de ti e de mim muito mais
do que se apresenta.

as viagens clandestinas
A lisergia do poema que não se perdeu
nos anos setenta
a loucura insana e crua de ser
homem num planeta belo
e destinado
ao pó.

quero sim,o útero de estrelas
tudo, tudo, enquanto
canto enquanto ando
enquanto grito uivo escarro
enquanto sangue e carne
persistirem em mim-

quero ser tradução
da poesia doida e desvairada
que deve nortear
todos os passos.


humms

Sei. Sei que sou a sombra
de mim e dos outros
e que carregar mundos nos ombros
é fardo fácil, é doce oficio
quando nos encantamos
com a grandeza dos pequenos
E nos espantamos
Com a apequenez dos grandes.

há ordem no caos, há uma ordem caótica
que rege os mundos pequenos
e a árdua batalha das espécies
que se enfrentaam nos subrterrâneos.
Não essas batalhas rudes e campais
das coisas grandes. Mas aquelas
de asas de boboletas, de pios de pássaros,
de húmus, de minhocas, de vermes,
de formigas e outros nossos irmãos
menores.

sei.O universo sé um mimo,
um brinquedo,
um pedaço de estrela
na ponta do alfinete, e nós somos tão tolos
e inúteis, nesse mister.

prá que pisar flores
e arrancar as asas dos insetos?
prá que querer ser mais
do que insossos mortais?

ora direis, olhar estrelas-
ora direi, olho as estrelas,
ouço as estrelas
e sei
que o mundo é brinquedo sim,
Como bola de sabão
E de repente, ploft- bum- vupt
Se desfaz...

domingo, 24 de janeiro de 2010

desanoiteceres


imagem: ombres chinoises I - flickr/doozzle

prá nina rizzi



é que andei aprendendo a desanoitecer pesadelos enquanto lia prá dormir, de noite, contos de poe de lovecraft ah aqueles monstros infames, subterrâneos, Cthulhu aterrorizando corpos e destroçando almas- eu aprendi ali, com poe , a desamanhecer pesadelos e engendrar sonhos lilazes que não apertavam gargantas nem cuspiam cacos de vidro ensanguentados- só exalavam perfuames de lirios e águas de colônia... eu de há muito tempo havia perdido a vontade de sonhar com as coisas quando as coisas começaram a sonhar comigo: eu ia soooooozinho e atarantado em meio ao caos e à neblina de rimini fellini desnorteado no sertão e eu era parte dos sonhos das coisas: que coisas? coisas do mundo,coisas que a gente ia acumulando ao longo da vida feito seixos rotulados nos rios amontoando-se ao longo das veredas e dos caminhos e tantos buracos e tantas capoeiras nas matas e os olhos verdes da figura ainda me olhavam do alto de seus metros de alturas- ai, grande sertão de diadorim e riobaldo rosa tosa rosa guimaraneando os sentimentos e garimpando vozes e sentimentos lá no fundo da alma que rosa mineiramente sabia de todas as coisas que coisas? as coisas que nos sonham, as coisas que acontecem enquanto a gente vai vevivendo soinhos moinhos moribundos- marimbondos voam em minha direção e me ferram no pescoço: a dor é lancinante, é funda, e eu acordo no meio deste caos emocional poético remissivo e caio do rocinante- eu- quixote de araque- um araquiri poéstoico me aflora à mente- e eu nem sei mais do que estava falando: de rosa, dos sertões, dos marimbondos, de lovrecraf e de poe- ah, poe, edgar allan- poeta dos grandes- teus poemas me iluminam,

assim,devagar, desamanheço pesadelos
e anoi-teço sonhos
em noites cor de açafrão:
há luzes, há terracotas
há ervas finas
e finais
felizes
há corações empedernidos
e canções de meninar monstrinhos.
antes, muito antes do dom
eu não era assim:
adormecia pesado
e aos roncos e barrancos
atravessava a noite
como um destinado
à barca de caronte
mas hoje, meu sono é leve
como penas de gansos
e garranchos de criança
rabiscando folhas
de papel;
desamanheço pesadelos
e brinco
no branco do olho
no romã da boca
no seio macio
e no dedo em riste
que me aponta: quem
é o intruso
que se introduz assim
em meu reinado?
nada nada nada é o que digo:
minha intromissão
é jugo leve
fardo sem peso
é pluma no ar:
desaprendi pesadelos
e navego-
no mar de ulisses
voltando para ítaca
imune às sereias
e aos cantos mortais.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010


imaagem: bored if you dont- flickr/otherthings

porque a solidão é uma parede branca
caiada de ausências
e brinca
brusca
dançando nua
na nebulosa do quarto
um lânguido
tango argentino.
desmoronaram muralhas
de flores mortas
sobre a praça das horas
e as heras verdes
invalidam as frestas
despedaçam janelas
e luzes
e se instaura
como cacos
de caos
a dança não cansa
a música tosca a
parede é branca
é preta
é púrpura e ocre
a vida incolor reclama
de tanta palavra e adjetivo
é apenas merda
na privada
sangue nas seringas
e o que mais?

Que temos nós a ver
Contudo?

tudo é um surto. um susto.
um curto-circuito
um circo
a cicuta de Sócrates:
tudo é fogo-
fátuo
tudo é enfado.

as horas dançam
e nos tomam como pares:
os copos nas mãos
brindemo-nos
brinquemo-nos
enquanto a vida flui.

sábado, 16 de janeiro de 2010

do not


imagem: Pool(s) - ceesjw/flickr

Do not translate
this poe-m:
or swall
the words
swords
iced
fiords
let the poem
fly, like flies
and lies

say good-bye
as a shining
in a acid sky.
i... am a anonimy
try poetry
try poe
and break ties

but let the words
and the poems
rest in peace
like bread and butter
one only body
on thew tableau
any language
all the tongues:
sing the songs
of yourself:
o sangue das canções
tatua-se na pele
como ideogramas:
血液中的歌曲
休息
語言熱!
deixe o poema viver
na minha, na sua,
em nossas línguas,
mãe!,,

sábado, 19 de dezembro de 2009

: e sigo

imagem: Go ahead- flickr/stephcarter

i

:porque antes era assim- havia sonhos - que se sonhavam juntos como morangos vermelhos nos cestos amoantoados sob os pés das árvores- eram outros tempos e sonhos ainda havia quando nos juntávamos em grupos e a bagunça era geral o som comia solto e havia amor, também: falo de amor de corpos que se tocavam falo de simbiose de estar prá lá de bagdá me dá suas bocas me dá suas coxas me dá sua vida e tudo era assim: havia um quê de tudo o mais havia aquele ar flor e amor e ah- via-se tudo então com olhos de olhar prá dentro de prescrutar íntimos desejos e loucas travessias de egos e ei olha aí o ovo do início olha o gênesis e emerson lake e palmer olha aí os cantos rústicopoéticos jethro tull aqualung deus criado à maneira dos homens ei ...hey...

ii

na primavera\ já estivemos lá. era estação de flores, de florestas roxas rosas de cerejeiras em flor lá no japão de flores sem fim no sem fim do mundo. era estação de amores vãos-fúteis amores que se roçavam bocas que se tocavam braços que se aninhavam-mas era tudo tão rápido e tão jovem que a saudade não tinha e o tempo não passava e a gente esteve lá- abraçando, beijando, trepando feito loucos no cio mas era tudo muito romântico- e a primavera, porra, e não tinha tempo prá chorar: era tudo leve e solto e era isso aí.

iii

no verão a estória já era outra: corpos suados sarados malhados molhados agarrando-se nos amontoados das praias e das ruas e dos shoppings e era tudo tão bom tão up tão jovem- peles brancas, morenas, negras, de todas as cores e de todos os modos se entregando alí- e tome luas e luaus e tome sexo e alucinações e também ainda era tudo tão rápido que nem havia tempos de saudades ou de solidão? solidão? que solidão?

iv

depois as folhas começaram a cair e também as fichas: era outono., sabe? aquela estação estrangeira de folhas vermelhas e troncos nus que por aqui não combina, é tudo muito defasado, mas a angústia já se instalava e um frio já vinha descendo pela espinha nos momentos mais precários quando uma mão tocava meio gelada a nossa nuca e ei, que é isso porra que mão fria é essa? solidão- ah, já se sentia só-assim um pouquinho- nas noites mal dormidas- nas companhias que não ficavam, nas moças que iam embora, nos restos deixados nos copos, nos cigarros abandonados nos cinzeiros...

v

é, o inverno é foda: deixa-nos muuuuito tristes- e enrolados em cobertores de lã a gente se sente estranho no ninho: quando foi que saí de casa:

Quando saí de casa

Eu fiquei lá:

Quando me vim

De mim

Deixei crateras expostas

Portas fechadas,

Feridas,

Deixei pedaços espalhados

Espelhos quebrados, nos caminhos,

Nas fendas das grotas,

Nas curvas do tempo,

Deixei partes inconciliáveis

Quando eu me vim

A este mundo outro:

Os bichos ficaram lá:

Amoitados, amontoados

Num cantinho qualquer

De uma cidade antiga:

Latidos, miados, urros

Gritos e uivos- todos silenciados

Num pedaço de memória

Que teima,vez em quando,

Em uivar pra lua:

Meu, minha,

Teu, tua,

É a vida dando tapas,

Coices em nossas caras

Civilizadas.

Morre-se de fome,

De dores, de guerra,

De tédio

E daí?

A vida é assim. .

é, quando deixei a primavera da infância, aqueles sonhos rosados todos, quando foi que perdi aquele tesão de junventude braço bocabeijo bocejo bundas rebolando peitos ofegantes e sexo muito sexo e trepadas mil e gozos e nada de sonhos- ah..esse inverno é mesmo merda, frio como o alto do himalaia e aqui é o cu do mundo e eu nem sei mais o que estou sentindo será o peso da idade será o ar de chumbo da cidade será que será? a solidão- sólida como pedra rocha voadora que veio se abater aqui, no meio do meu coração branca como parede de cal soprando ausências:i

A solidão é uma parede branca

Caiada de ausências

Que germinam no corpo

Rememorando dores:

Tudo o que podia ter sido.

Não foi.

É uma ária de Bach

Adejando os ares

Num stradivarius

Sem ouvintes:

Antes, o corpo dançava

Ao som de estrelas

E os lençóis amassados

Eram nosso presente

De natal.

Hoje, não má marcas

Nos panos ou no pscoço

Beijos, flores mortas,

Murtas secas, no jardim:

A solidão é uma parede caiada

Branca de ausências

Onde a luz reflete

Promessas vãs:

A solidão.

vi

Porra, acho que deliro

em lírios mortos:

foda-se: estou vivo

e sigo.


quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

drums

imagem: into abstraction- flickr/robert in toronto

,do começo

ao fim

tropeço

nas esquinas

de mim,

domingo, 29 de novembro de 2009

cru


imagem: the beggar- flickr/clownbastard

meu verso é cru,
é avesso
meu poema é escroto
é abjeto meu objeto
lírico:
dorme nos bueiros, nas cânulas
transita pelos becos
fede,
fode,
escondido nos cantos
dos viadutos.
mas fala de vida- disfarçada em morte
ou de morte em vida-tanto faz:
meu poema é incapaz
de se sentar em cadeiras estáticas:
é fugaz
e se esconde do neon.
...ao redor da mesa
dormem as cadeiras.
estáticas e sem êxtases
as palavras furtivas
não se furtam ao tato. mas
não há quem as recolha
E perecem.como frutas
podres, em odores
fétidos.
Não há quem as colha
em sua plenitude:
dormem os homens
ao redor das cadeiras.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

anarquipoesia

imagem: Poesia.jpg by bidari/flickr


ave, pablo!

Hoje amanheci poeta e estou entardecendo perdido na prosa. Prosear sobre poesia, sua natureza e exigências, sua dependência do poeta assim como o poeta depende dela, assim como o poeta depende do ar para respirar e da palavra para se expressar em meio às multidões apressadas, ensimesmadas e sem palavras para com aquilo que a rodeia.A Poesia é uma musa exigente e premente e nuca se sabe quando chega ou quando vai. Coloca-nos em eterna vigília, a buscar a senda das maravilhas e das palavras inauditas, encantadas, novíssimas em sua formulação e em seu entendimento, como diamantes recém- convertidos de um carbono abrupto. A poesia é assim, ataca-nos de repente, ata-nos as mãos do fazer diário e se instala, sorrateira e brejeira, em nossa mente e coração, que fica lírico a buscar revelações e encantamentos. E nos atracamos com ela, enrolados em seu leito de lírios e rosas, de cheiros e luzes, plenos de imagens que querem se traduzir aos olhos outros pela construção e encontro da palavra perfeita, da palavra que traga a luz, ao mesmo tempo tragando a luz que brilha em nossa mente.A poesia é isso: uma busca pela tradução, mais que perfeita, dos sentimentos imperfeitos, das nossas contradições, das antíteses que somos e nunca queremos deixar transparecer. A poesia, para isso, depende do poeta e o poeta depende da poesia,e muito mais, da plena liberdade, aquela gritada a plenos pulmões, daquele ar que escapa do escafandro deixando o mergulhador à mercê da água que lhe rouba os sentidos...A poesia necessita liberdade, incondicional e irrestrita, para que seja gestada e resgatada do limbo a que muitas vezes a condenamos. Por isso, rima não com burocracia, mas com anarquia e com apostasia. A poesia é avessa aos controles, às planilhas, às escotilhas, às camarilhas, às escolas, às escolhas, é avessa aos sistemas e regimes; o que a poesia busca é a pura tradução da beleza, este ser abstrato que se oculta nos mais inusitados lugares... Por isso, o poeta não deve e nem pode, enquanto poeta, preocupar-se com números frios, mapas de controle, perfis produtivos, gráficos e estatísticas. Vamos sim, nos preocupar com o pranto não chorado, a palavra não dita, os matizes ao invés de matrizes algébricas, com o homem e a mulher, enquanto seres iluminados e antenados com o universo no qual vivem.Por isso, enquanto poeta, não busco o raciocínio dos números e a frieza das estatísticas. E registre-se que, paralelamente, trabalho com números, que no contexto adequado, também possuem sua beleza... aliás, esta já é outra praia pois, para os matemáticos, os números são plenos de luz, beleza, incertezas e inesperado e isso, diga-se de passagem, também é pura poesia.No entanto, quero aqui celebrar a liberdade e o dever do poeta de trabalhar sempre a palavra, como o fruto de uma lavoura não árida, de uma lavoura fértil, de onde brotem os sentimentos e as sensações apreendidas enquanto homens, dominados e dominadores, senhores e irmãos da natureza. E para isso, sejamos anárquicos e deixemos que as palavras nos transportem aos mundos exteriores e interiores, e façamos dela nossa arma e nossa alma, faça-se a luz ordenou Deus, faça-se a sua tradução por meio da poesia, conclamou o poeta. E sejamos assim, teses( como nos poemas-conceito, matrizes para outros e outros e outros poemas), antíteses ( como nos poemas barrocos, contrastes perfeitos para a natureza humana, sua luz e escuridão), sínteses( como nos poemas concretos e haicais, equações líricas e pequenas flores de cor e forma intensas). Sejamos menestréis medievais, cantando barcarolas, sejamos clássicos, em sonetos formais, sejamos parnasianos, buscando a jóia perfeita da rima e do conceito, sejamos simbolistas, dando voz aos nossos elementos interiores, sejamos naturalistas, dadaístas sem um sentido aparente, sejamos surrealistas transmutando as palavras em imagens sinestésicas e sensuais, sensações pictóricas, sejamos sintéticos e prolixos, sejamos modernos, reeditando 22, sejamos enfim, eternos, e assim estaremos sendo contemporâneos, expressando os medos, vozes e vórtices do nosso tempo, esse tempo que não é só cronológico, mas também sentimental emocio-lógico, baseado em nossas idiossincrasias e relacionamentos com o mundo e as gentes.Vamos pois, poetas, construir nossos opus de luz, mesmo em meio ao pus, ao pó, mesmo em meio às descrenças e desavenças, lançar nossas sementes de beleza que um dia, quem sabe, contaminarão a todos, tal qual uma pandemia, um pandemônio , uma ode à alegria de viver!

terça-feira, 24 de novembro de 2009

adagio

imagem: water drop - adagio art/flickr

não há lucidez na dor.
nem calma no romper de laços.
há braços que despencam
corpo abaixo
buscando abraços
que já não há mais.
há bocas que mordem o vento
imaginando clausuras.
o leite derramado
não se bebeu:
tragou-o a dureza da terra.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

corpacorpo

imagem: sex bomb/flickr-ilovepie

não te querer assim: sonhadora, romântica, buscando alhures o que aqui não se encontra: o sonho martelava idéias sobre a cabeça e o coração enquanto o corpo apenas se jogava inteiro naquele jaogo de sedução avacalhado: mão na mão olho no olho pele na pele calor e tesão: um avanço, um recuo, outras idas e vindas, lindas as palavras ditas e os sussurros gemidos ao pé do ouvido gargantas secas bocas sedentas mordidas lambidas salivas lânguidas escorrendo pelos cantos sumos o corpo em explosão busca o saciar-se o engendrar-se o fundir-se:

Colado
Calado
Selado
Suado
Su (surrado)
O corpo encontra outro corpo:
Porto inseguro
Augúrio do velho
Do mesmo tema:
Janela vedada
velada
A alma se guarda
Em qualquer redoma:
O corpo não: faz-se
e se refaz
Entre Dioniso e Eros
Erra quem busca
alguma coisa mais?

longe daqui, desta cama macia com lençóis brancos e travesseiros cheirando a erva-cidreita pairam os sonhos: sonhos românticos dos poetas cor-de-rosa que queriam e não queriam estar aqui assim num tempo assim nesta empreitada doce e imaginada: amar a amada,assim, sem mais conversas, jogar-se sobrre o leito e desfrutar a carne, o desejo explodiindo, os corpos em êxtase, tudo tudo e as palavras soltas ditas assim sem mais rodeios muitomais que o te amo muito mais do que te adoro muito mais do que as pérolas de chuva e do que as rosas vermelhas sobre a mesa muiito mais: os sentidos e sua jornada noite adentro gozo gozo gozo corpos embolados enroscados: amor?
Não te querer assim, lírica, leve, mística, rósea: te querer assim: crítica, cítrica, inteira no seu torpor e no seu gozo múltiplo: amor?

Sob o cisne afoita,
leda cisma
enquanto frui
o instante:
será amor
a alquimia dos corpos
ou pura anarquia
do desejo?