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Todo final de ano meu pai elabora um texto no qual reflete sobre os 365 dias que se passaram e a influência que os acontecimentos recentes tiveram em sua forma de pensar e ver o mundo. Sou filha coruja assumidíssima, mas a verdade é que meu pai é um dos homens mais inteligentes e cultos que conheço e criou suas três filhas enfatizando a importância dos estudos, da educação e do pensamento crítico. Eu o agradeço muito por isso! Recebemos dos meus pais lições de vida que não tem preço. Sabemos que o que conta mesmo é a forma como agimos na prática, é a maneira como tratamos nossos semelhantes no dia a dia. É assim que revelamos quem somos.
Hoje tenho o prazer de recebê-lo novamente nesse cantinho para compartilhar com vocês o texto que ele enviou aos amigos e familiares no fim de 2012.
Seja bem-vindo mais uma vez, “Beto”!
Caros amigos,
Aproxima-se o fim do calendário Maia, que alguns místicos entenderam que seria uma previsão de fim do mundo, mas que na verdade é simplesmente o fim do ciclo de longo prazo do calendário que foi concebido pelos Maias para poderem fazer previsões sobre os ciclos da natureza ajudando-os principalmente nas atividades agrícolas e religiosas.
Ao mesmo tempo chegamos a mais um fim de ano no nosso calendário que, ao contrário dos Maias, preferimos não ter um ciclo de longo prazo, onde a contagem volta ao zero. Esses momentos são propícios a reflexões e por isso na minha mensagem de Natal para os colegas e amigos mais íntimos, eu tomo a liberdade de impor um tempo maior de leitura para compartilhar algumas de minhas reflexões de fim de ano, fruto do que consegui de aprendizado em mais esse ano de caminhada.
Continuei nesse ano minhas leituras buscando um maior entendimento do funcionamento de nossa mente, procurando entender o porquê de algumas tomadas de decisão individuais ou coletivas se revelarem tão afastadas do que seria o mais racional, ou seja, o que logicamente seria o que traria mais benefícios tanto para o indivíduo como para um grupo de indivíduos.
Nesse sentido, li o segundo livro do Dan Ariely, o livro mais pesado do Antonio Damásio e finalizei com a leitura do livro do prêmio Nobel de economia Daniel Kahneman “Rápido e Devagar – duas formas de pensar”.
O que achei mais interessante nesse último que recomendo a todos é que de uma forma fácil de entender, ele sintetiza tudo o que os outros autores mostraram sobre o comportamento de nossa mente combinando os aspectos fisiológicos com os psicológicos, dividindo didaticamente o funcionamento de nossa mente nessas duas formas de pensar, uma rápida e intuitiva e outra lenta e racional.
O bom disso é que nos facilita o entendimento de algumas decisões humanas que impactam sobremaneira outras pessoas e que por uma análise racional nos parece tão injusta. Um exemplo forte disso é como entender a injustiça das turbas enfurecidas em Jerusalém que bradavam pedindo a crucificação de Jesus, que em sua passagem pela terra só pregara o bem a justiça e igualdade entre os homens.
Esse entendimento nos ajuda em determinadas situações a suportar melhor eventuais injustiças que entendemos estar nos afetando, livrando-nos de uma possível depressão mais ou menos na linha do que Jesus na Cruz disse com relação a seus algozes: “Pai perdoai-os, porque eles não sabem o que fazem”.
Uma das assertivas que encontrei no livro do Antônio Damásio, um médico estudioso da fisiologia do cérebro buscando entender o processo cognitivo e a definição do “EU”, é que o cérebro humano é uma máquina que busca sempre o mínimo consumo de energia para a realização de determinada tarefa, isso é o que torna tão forte a conhecida lei do menor esforço, que alguns acabam chamando de preguiça.
Com base nessa premissa torna-se mais fácil entender o porquê dos dois mecanismos de pensar apresentados com farta evidência experimental por Kahneman em seu livro.
Se para todas as tomadas de decisão nosso cérebro precisasse usar o modo devagar, mais racional e lógico, a energia gasta seria incomensuravelmente maior, pois muito mais sinapses precisariam ser utilizadas e mais neurônios precisariam ser ativados para buscar todas as informações necessárias para aquela tomada de decisão, e também muito mais tempo seria necessário para a tomada de decisão, prejudicando sobremaneira sua eficácia.
Por isso o HOMO SAPIENS em sua evolução criou um mecanismo mais eficiente de tomada de decisão a partir do aprendizado contínuo. É assim que um motorista experiente toma decisões ultrarrápidas para evitar uma colisão quando sua visão periférica percebe a aproximação perigosa de outro veículo, ou um piloto de caça supersônico foge de um míssil. Em nenhuma dessas tomadas de decisão o modo lento racional foi acionado, o modo rápido intuitivo é sempre muito mais eficaz para essas decisões.
O problema surge quando devido ao seu menor consumo energético, nossa mente prefere sempre esse modo rápido e intuitivo para as tomadas de decisão. Mesmo decisões onde o aprendizado repetitivo, que molda algoritmos decisórios baseados em experiências anteriores e muitas vezes em preconceitos na sua acepção (Conceitos Prévios), nos leva a tomada de decisões emocionais e as vezes completamente irracionais, que virão a causar malefícios para terceiros e muitas vezes para nós mesmos.
O efeito manada que motiva investidores no mercado financeiro a massivamente vender ativos na baixa e comprar também massivamente na alta, provocando perdas bilionárias é um exemplo de tomada de decisão coletiva baseada em PRÉ-CONCEITOS gravados geneticamente na nossa mente desde nossos ancestrais que viviam em cavernas, o MEDO da perda e a EUFORIA do prazer de ganhar. Esses elementos emocionais estão gravados em áreas diferentes do cérebro, e por isso os pesquisadores do pensamento cognitivo puderam observar através de equipamentos de ressonância magnética nuclear quais as áreas do cérebro foram acionadas quando esses elementos emocionais de “medo” e “euforia” foram importantes na tomada de uma decisão completamente irracional.
Desejo portanto a todos vocês, um natal pleno de alegria e felicidade junto aos seus e um ano novo cheio de realizações e tomadas de decisão que tragam mais felicidade, paz e harmonia para vocês e os que os cercam.
Procurem ficar atentos em suas decisões de quaisquer naturezas para verificar se estão usando o mecanismo correto em cada caso. Será que preconceitos culturais, religiosos e de experiências anteriores em situações apenas similares não estão levando-os a um processo decisório que no final farão a vocês e a outros mais infelizes, sem atingir a eficácia pretendida?
Com melhor qualidade no nosso processo de tomada de decisão, certamente estaremos construindo um mundo melhor.
Públio Roberto Bonfadini
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Adorei esse resumão de três livros escritos por autores renomados em suas áreas de atuação! Eu me reconheci na seguinte afirmação: “O problema surge quando devido ao seu menor consumo energético, nossa mente prefere sempre esse modo rápido e intuitivo para as tomadas de decisão”.
Como sou uma pessoa bastante ansiosa e tenho dificuldade de pensar em um assunto de cada vez, volta e meia me encontro tomando decisões apressadas ou impulsivas. O objetivo normalmente é: “Vou resolver isso logo porque é menos uma coisa pra me preocupar”. Em muitos casos, o resultado é positivo e eu tenho confiado cada vez mais na minha intuição. Porém, em algumas situações do passado, precisei rever as decisões que tomei por medo de desagradar ou porque me sentia intimidada e pressionada. Em uma fase bem difícil, fui obrigada a assumir a covardia que fez com que a vida me levasse para onde eu não queria ir. E o arrependimento foi gigantesco!
Entretanto, penso que a capacidade de se arrepender, de assumir as falhas e aprender com os próprios erros é algo bom que nos impulsiona em direção a nos tornarmos pessoas melhores. Fiz as pazes com meu passado e recuperei minha paz de espírito. É por isso que tenho lutado constantemente contra a minha natureza ansiosa e, ao invés de responder sempre “Sim, claro. OK, vamos lá. Tô dentro, conta comigo. Tudo o que você pedir, eu faço.”, penso duas vezes e não tenho mais o mesmo receio de dizer “NÃO”.
Mudar não é fácil e infelizmente não viemos ao mundo com um botão que liga ou desliga um certo comportamento ou forma de pensar. Leva tempo para nos livrarmos de certos preconceitos arraigados. É por isso que gosto de ler mensagens como essa do meu pai, na qual me reconheço em alguns exemplos e consigo extrair uma lição positiva para a vida!
Um grande beijo pra todos com votos de um final de semana de reflexões e boas atitudes!