Após a tentativa frustrada de suicídio, Pedro tornou-se outro homem: passou a valorizar a vida, a abraçar árvores, a sorrir para as flores e até mesmo a gostar de si mesmo. Apesar de ter ficado sem um pedaço da orelha e de ter que usar o velho par dAe óculos de uma perna (ou braço?!) só, não se sentia mais um injustiçado por Deus.
A partir de então, quando ia à cidade entregar lenha, seguia conversando, alegremente, com a mula recentemente adquirida e batizada de Serafina:
“Vamos ligeiro, minha amiga! Quem sabe não será hoje que conhecerei a mulher de minha vida.”
Passou a reparar nas pessoas, a ficar falante e a “tirar linha” com as mocinhas da cidade. Percebeu que algumas delas “davam corda” e isso fazia o jovem sentir-se como um Rodolpho Valentino ou um John Barrymore, galãs da cinematografia d’antão. Usava sempre o chapéu meio que do lado, um tanto para dar pinta de herói e mais para esconder a orelha mutilada.
Seu Joanicão, dono da casa de moagem e torrefação de farinhas, tinha uma filha chamada Helena. Filha única, já pela casa dos vinte e tantos mas ainda solteira. Pedro começou a cortejá-la de longe.
Não era muito novinha, devia até ser mais velha do que ele, mas era uma “mocetona”, de corpo grande e forte, bonita de se ver!
As noites do rapaz passaram a ser povoadas de sonhos inquietantes sendo que, muitas vezes, acordava no meio da noite com o “coração na boca”, peito palpitante e o corpo suado. Estava apaixonado...
Mais afoito ficou quando percebeu que sua paixão fulminante estava sendo correspondida, de leve a princípio e mais forte a medida em que os olhares iam perdendo o pundonor inicial. Fugidia que era, a moça foi-se deixando levar ao sabor daquele enlevo e toda a vez que ouvia o trotear compassado de Serafina, corria à janela, com as faces afogueadas e as pernas bambas.
Enquanto seu pai ajudava a descarregar a carroça, a embarcar sacos de farinha ou de fubá em troca da lenha, os dois jovens cruzavam olhares cúmplices e maliciosos.
Numa manhã, pela ausência do pai, Helena teve que atender ao enamorado. Pedro seguiu-a até ao moinho de fubá, meio anestesiado pela emoção, e enquanto ele segurava o saco de aniagem, ela, munida de uma concha grande, de alumínio batido, recolhia o fubá de um caixote baixo para o saco.
Vendo o abaixar-se e o levantar-se contínuo da moça, Pedro ficou extremamente excitado e num rompante de insensatez, grudou-se nos quadris da amada. Helena, tensa que estava, deu um berro assustado e numa reação automática, meteu a concha de ferro na cabeça do rapaz, cortando-lhe um pedaço da outra orelha, a que era perfeita...
Quando seu Joanicão chegou e viu a filha curando a orelha de Pedro, quis saber a razão e a explicação que ouviu foi que ao apertar a cinta “barrigueira” da mula, o rapaz levou um coice certeiro do animal. Pedro ainda acrescentou: “Pois é, seu Joanicão, essa mula é uma desgraça de brava e traiçoeira!”
“A Mula não é brava não _ replicou Helena, com toda a calma maliciosa _ Você é que pegou ela no susto...”
Anos mais tarde, sempre que alguém lhe questionava o porquê de usar sempre um gorro "atolado" na cabeça, ele dizia para a esposa: "Conta ai, Helena!"
A gorda senhora, em entremeios a sonoras gargalhadas, não se cansava de repetir a mesmas estórias, decisivas na vida do marido..
O receituário para o fubá é extenso, principalmente na cozinha mineira e escolhi para hoje uma receita, que aprendi quando morei em Poços de Caldas/MG, de broinhas mineiras que não é qualquer um que tem "saco" para fazer e lanço o desafio:
BROINHAS DE FUBÁ: (Usar como medida um copo grande) - 1 copo de leite; 1 copo de água; 1/2 copo de gordura vegetal; 1 copo de fubá; 1 copo de farinha de trigo; 1/2 copo de açúcar; 2 pitadas de sal; 1 colher (sopa) de erva-doce; 1 colher (sobremesa) de fermento em pó e 6 ovos inteiros. Levar ao fogo uma panela com o leite, a água e a gordura. Quando levantar fervura, acrescentar os demais ingredientes (menos os ovos). Mexer (colher de pau) vigorosamente, até desgrudar do fundo da panela. Tirar do fogo e deixar amornar. Juntar o fermento em pó e misturar bem. Por último, acrescentar os ovos, um a um, misturando com as mãos. Umedecer uma xícara (chá), de fundo arredondado, com água e polvilhá-la com fubá. Jogar porções de massa na xícara e agitá-la até formar pequenas bolas. Despejar cada bola em tabuleiros untados e enfarinhados. Assar em forno quente. Sirva com café preto da hora.
Gostei da história. Momentos deliciosos e com alguma malícia que dão uma cor agradável à escrita.
ResponderExcluirJoão - suas crônicas são saborosas ,como suas receitas.Parabéns!
ResponderExcluirDê uma olhadinha no meu blog,tem uma postagem muitoooo boaaa lá.
abraço!
Querido João...sentiu o cheiro da entrada? srsrs Tá queimada não..ssrsrs
ResponderExcluirEnfim, querido João que 2012 seja um ano com muitos sabores.
Um grande beijo e fica com DEUS!
Jão, o blog tá largadinho ,fio.Larga o face e vem postar, um mês sem nada, assim não avança.
ResponderExcluirAdorei essa historinha...rsrsrs Venho aqui depois se "Jão" prometer largar o face e vim postar novidades aqui. rsrsrs Um abraço. (só não me atrevo é a fazer os bolinhos, mas quem que eu aceitaria o convite para comer uns acompanhados de um cafezinho forte e docinho). Um abraço.
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